95% das creches e infantários têm concentrações de bactérias acima do recomendado

Um projecto de investigação sobre o ambiente e saúde em creches e infantários concluiu que a deficiente renovação do ar está associada a problemas respiratórios nas crianças.

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O protocolo é assinado pela câmara municipal, as juntas de freguesia e as creches da rede privada. Miguel Manso

A investigação avaliou 125 salas de 19 creches e infantários em Lisboa e no Porto e encontrou uma qualidade do ar inadequada, com elevadas concentrações de bactérias e dióxido de carbono, que está associada a problemas respiratórios nas crianças.

No que se refere às bactérias – indicador de uma má renovação do ar e que não são necessariamente patogénicas (que causam doenças) – o máximo detectado foi superior a 26 mil UFC (unidades formadoras de colonias) por metro cúbico quando o valor de referência em Portugal é de 500 ufc/m3. No capítulo dos contaminantes químicos, o valor máximo de dióxido de carbono (CO2) – outro indicador da renovação do ar – o máximo detectado foi 5647 mg/m3 quando a referência se fica pelos 1800. Os resultados preliminares da segunda fase do projecto Ambiente e Saúde em Creches e Infantários (ENVIRH) foram apresentados nesta sexta-feira, em Lisboa.

 “Não há razão para alarmismo, não há nada de assustador nos resultados que temos. Há apenas coisas que percebemos que afectam a saúde e que podem ser melhoradas” , sublinha Nuno Neuparth, investigador principal do projecto ENVIRH. O professor da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa, sublinha, por exemplo, que o CO2 “não é um poluente e serve apenas como indicador da renovação do ar”. “Quando respiramos libertamos CO2”, acrescenta, notando ainda que, por isso, os níveis detectados dependem do número de crianças presentes na sala.

O investigador confirma, porém, que os dados obtidos mostram uma “relação estatística e evidente deste indicador com a presença de problemas respiratórios, como a sibilância, nas crianças”. Os resultados preliminares do ENVIRH revelam que em mais de 50% dos estabelecimentos analisados os limites de CO2 estavam acima do recomendado (1800 mg/m3). Entre as 73 salas avaliadas em Lisboa, a média de dióxido de carbono encontrada foi de 1850 mg/m3 e o valor máximo foi 5630. Nas 52 salas do Porto, o máximo foi 5647 mg/m3 e a média foi de 2541 mg/m3.

No caso dos dados sobre a concentração das bactérias, os especialistas também fazem questão de colocar um travão no alarmismo desnecessário. “Nem todas as bactérias são más e patogénicas. Neste caso, são apenas indicativas de uma má renovação do ar”, alerta Manuela Campos, outras das investigadoras envolvidas no ENVIRH. Ainda assim, este “indicador” está claramente muito acima do recomendado (500 UFC/m3) em Portugal nas regras sobre a qualidade do ar no interior dos edifícios.  Nas salas de Lisboa a média foi de 3115 UFC/m3 e o máximo de 26280 UFC/m3. No Porto o máximo registado foi de 18770, porém, a média foi de 4432.

Depois de uma primeira abordagem geral em 45 estabelecimentos de Lisboa e Porto, os investigadores recolheram dados mais pormenorizados com medições sobre a qualidade do ar e avaliações sobre a saúde das crianças em 19 creches e infantários das duas cidades.

Os resultados agora divulgados referem-se à avaliação feita durante a Primavera (os dados recolhidos no Inverno ainda não foram analisados). Entre muitas outras variáveis, foi analisada a influência que o tipo de janelas ou pavimentos podem ter na qualidade do ar das salas. Aparentemente, as janelas basculantes serão as mais recomendáveis e os pavimentos de madeira e cortiça os menos aconselháveis.

Numa terceira fase do projecto, será ainda usada a importante ferramenta de simuladores para obter conclusões mais sólidas sobre este tipo de influências e o seu efeito no ambiente e na saúde das crianças. Em Julho, a equipa do ENVIRH apresentará uma manual de recomendações que poderá (deverá) ser usado pelos estabelecimentos. Possivelmente, admite Nuno Neuparth, bastará algo tão simples como abrir uma janela, de vez em quando, para renovar o ar da sala da creche ou infantário e assim prevenir alguns problemas respiratórios das crianças.

Enquanto o projecto ENVIRH  avança para conclusões nas creches e infantários, a equipa de investigadores começou já a visitar alguns lares de idosos com o mesmo objectivo de avaliar a relação entre o ambiente e a saúde. As medições e questionários já avançaram em mais de 60 lares de idosos do Porto e Lisboa.

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