Reféns contam histórias de pesadelo

Sobreviventes do rapto e cerco ao campo de gás argelino contam histórias de terror.

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O campo de gás numa imagem do Google Earth Reuters/Google Earth/CNES
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Um francês passou um dia e duas noites em terror, debaixo da sua cama, imóvel, certo de que acabaria por ser encontrado e assassinado. Um operador de rádio argelino viu o seu supervisor, um francês, morto. Um engenheiro da Irlanda do Norte viu dois camiões cheios de outros reféns desfeitos em pedaços por um ataque militar argelino.

O cerco a um campo de gás natural numa zona remota do deserto do Sara não acabou, mas histórias de sobreviventes têm elementos de trauma que os peritos dizem que nunca irá sarar.

Centenas de argelinos e muitos estrangeiros foram encurralados dentro do complexo tomado por homens armados antes do amanhecer de quarta-feira. Os islamistas percorreram o complexo, que inclui grandes zonas residenciais e uma central de processamento de gás, à procura de estrangeiros, contou Abdelkader, 53 anos, trabalhador da cidade próxima de In Amenas. “Os terroristas disseram-nos desde logo que não iam fazer mal a muçulmanos e que só estavam interessados em cristãos e infiéis", contou com a voz a tremer. “Eu tive sorte”, diz, descrevendo como conseguiu escapar, junto com muitos argelinos que tinham sido inicialmente detidos. “Ainda estou ofegante, ainda estou stressado”, disse. Teme que muitos dos seus colegas estrangeiros estejam mortos. “Os terroristas conheciam bem a base. Sabiam o que estavam a fazer”, relatou.

O operador de rádio Azedine, 27 anos, disse que viu o corpo do seu supervisor francês. Um dos islamistas tinha tirado o seu cartão de identificação e estava a colocá-lo no peito. “O meu supervisor é um homem grande, aprendi imenso com ele. Ele foi atingido mas eu não vi a execução. Só vi o cadáver quando corri junto com uns colegas para sair da base”, contou, claramente ainda em choque.

Entre os estrangeiros capturados estava Alexandre Berceaus, que geria o catering. “Ouvi muitos tiros. Havia um alarme a dizer-nos para nos mantermos onde estávamos mas eu não sabia se era real ou uma simulação”, contou mais tarde à radio Europe 1. Sobreviveu ficando no quarto, escondido debaixo da cama. Colegas argelinos trouxeram, às escondidas, comida e bebida. “Estava completamente isolado. Tive medo, já me estava a ver a acabar numa caixa de madeira”, disse, já numa base para onde ele e outros reféns libertados tinham sido levados pelo exército argelino.

Os estrangeiros que foram capturados foram amarrados, obrigados a usar cintos com explosivos, enquanto do lado de fora os militares argelinos cercavam o campo e garantiam que não iam negociar.

No segundo dia, os raptores deixaram alguns reféns comunicar com os media, tentado que o exército argelino os deixasse sair. Nessa altura ainda prisioneiro, o engenheiro da Irlanda do Norte Stephen McFaul falou à estação de televisão Al-Jazira. “A situação está a deteriorar-se. Pedimos ao Exército para se retirar”, disse. “Estamos preocupados com a continuação dos disparos.” Pouco depois, ele e outros reféns foram colocados em cinco camiões pelos islamistas, que os queriam mover. De acordo com o irmão de McFaul, as forças argelinas dispararam sobre a coluna de veículos. “O camião em que o meu irmão ia teve um acidente e nessa altura Stephen conseguiu fugir. Todos os outros quatro camiões ficaram destruídos. Ele acha que toda a gente que ia neles morreu”. 

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