Gregos sem dinheiro para aquecer casas queimam lenha e poluem cidades

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Em certos dias, a poluição em Atenas chegou a ser três vezes maior que o nível de perigo definido pela União Europeia NéLSON GARRIDO

Gregos combatem frio com o que têm à mão e o fumo é o novo símbolo da crise. As árvores desaparecem dos parques e há escolas fechadas: "Não vamos deixar que as nossas crianças morram de frio"

Atenas era conhecida pela sua poluição no Verão: altas temperaturas, pouco vento, fumo de carros e motas. Agora, a capital e outras grandes cidades gregas estão a conhecer outra poluição: a da lenha queimada em muitas casas por quem não tem dinheiro para o aquecimento a óleo.

Muitos gregos usavam óleo de aquecimento das casas nos automóveis porque o gasóleo era mais caro. Esta é pelo menos a razão dada pelo Governo para aumentar, para quase o dobro, o preço do óleo. Agora, muitos gregos estão a usar tudo o que podem em lareiras e fogões a lenha para se aquecerem.

O resultado já foi medido por cientistas - em certos dias, a poluição em Atenas chegou a ser três vezes maior que o nível de perigo definido pela União Europeia, avisou o Ministério do Ambiente. Os valores mais altos foram registados entre as 22h e a meia-noite.

Mas muitos atenienses não precisariam de ouvir estes dados para o saber: a poluição vê-se, cheira-se, entranha-se, diz o diário Kathimerini. "A crise encontrou o seu símbolo." Quando não há vento, uma nuvem de fumo fica presa em Atenas, rodeada por montes.

A Grécia tem várias zonas climáticas, e em algumas há invernos gelados: no Norte, o clima é semelhante ao dos Balcãs, e em Atenas há por vezes neve (este ano já nevou).

Segundo um artigo do Wall Street Journal, desapareceram dezenas de milhares de árvores de parques e florestas gregas este Inverno. Já houve consequências trágicas: na localidade de Mesoropi, no Norte, três irmãos de 5, 7 e 15 anos morreram depois de um incêndio com origem no fogão a lenha com que estavam a aquecer a casa desde o aumento de 50% dos preços do combustível de aquecimento normal.

"Para se aquecer, o grego comum deitará na lareira qualquer coisa que se possa queimar. De mobília antiga lacada a livros velhos com tinta", notou Stefanos Sapatakis, do Centro de Prevenção e Controlo de Doenças da Grécia. Outro sinal de que não há nada que não vá parar aos fogões a lenha e lareiras: não havia pinheiros ao lado dos caixotes do lixo nas ruas depois de desfeitas as decorações de Natal. Mesmo que a madeira de um pequeno pinheiro não seja o melhor para queimar por estar ainda pouco seca.

As florestas e parques naturais foram tomados de assalto e o número de queixas por abate ilegal de árvores não pára de aumentar. Grigoris Gourdomichalis, um activista de defesa do ambiente, contou ao Wall Street Journal como encontrou recentemente um jovem a deitar abaixo uma árvore numa das montanhas de Atenas. O homem começou a chorar quando confrontado com a ilegalidade que cometeu. Estava desempregado e precisava da lenha para aquecer a sua casa, onde vivia com a mulher e três filhos. Gourdomichalis deixou-o levar a madeira. "Foi uma escolha difícil", lamenta.

No Norte da Grécia, várias escolas anunciaram que não recomeçariam as aulas. "Não vamos permitir que as nossas crianças morram de frio", disseram alguns presidentes de câmara.

O uso de lenha para aquecimento poderá sair caro ao Estado. Segundo um estudo da Universidade de Salónica, os custos para a saúde pública do aumento do uso de combustível sólido seriam de 40 milhões de euros extra em 2012 em comparação com o ano anterior, apenas na região de Salónica. A poluição causa problemas respiratórios e é mais perigosa para pessoas mais frágeis.

A crise tinha feito descer o nível de poluição em Atenas com a diminuição de carros a circular por muitas pessoas não terem dinheiro para o combustível. A poluição do Verão parece ter-se deslocado agora para o Inverno, com efeitos mais pesados.

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