Saúde: uma concepção simples e prática

Como é possível ignorar o facto que a saúde é um direito básico e indispensável? Como é possível dizer "se estás doente, desenrasca-te"? Incompreensível

Fotogaleria
DR
Fotogaleria
DR

Começo por dizer que sou fumador, não posso omitir este pequeno vício neste texto. Quero apresentar um argumento mas não posso esconder que sou parte interessada ao veicular esta posição. Tenho um interesse pessoal, o que à partida influencia a minha perspectiva sobre o que penso sobre a saúde.

Ponto 1: o acesso à saúde não é um privilégio, nada disso, é um direito. As pessoas precisam de ter saúde para trabalhar e serem funcionais, portanto nem sequer é um direito só da pessoa doente. É um direito da sua família e dos seus. É um direito do empregador (se a pessoa doente tiver trabalho ou emprego). É um direito de todos (há problemas de saúde que afectam toda a sociedade). O que quero dizer é que a saúde não é só um direito adstrito ao indivíduo, é um pouco mais abrangente que isso.

Ponto 2: o corolário do ponto 1 é que a saúde é um dever de uma sociedade perante a pessoa doente. Não quero com isto dizer que defendo algum modelo de prestação de cuidados de saúde em particular. Só acho que a saúde deve estar rapidamente acessível e com qualidade a todos os cidadãos. Vejam o caso alemão, a saúde está acessível a todos (não só aos residentes mas a todos) mas não é Saúde Pública tal como a conhecemos.

Dito isto, tenho ouvido alguns argumentos curiosos sobre a Saúde. O primeiro está relacionado com o plano de Obama. Muitos americanos não acreditam neste modelo, apesar de ele nem sequer ser vagamente semelhante ao nosso Serviço Nacional de Saúde. Não consigo compreender esta posição.

Como é possível ignorar o facto que a saúde é um direito básico e indispensável? Como é possível dizer "se estás doente, desenrasca-te"? Incompreensível.

O segundo ponto está relacionado com uma declaração que ouvi relacionada com o seguinte raciocínio de fundo: "Algumas doenças são causadas por maus hábitos. São problemas perfeitamente evitáveis e as pessoas têm perfeitamente a noção que certos hábitos são nocivos. Logo, devem ser estas pessoas a pagar estes cuidados de saúde." No que diz respeito a esta lógica eu poderia apresentar os argumento racionais: não é fácil distinguir até que ponto uma pessoa é responsável pelos seus hábitos nocivos.

Quantos cigarros é preciso inalar para ser fumador? Dez, cinco, dois? Um? Um único cigarro desqualifica uma pessoa de receber cuidados de saúde acessíveis com problemas relacionados com o tabagismo? Depois há os fumadores passivos.

E há aqueles casos especiais, como o de uma pessoa que pratica atletismo recorrentemente - um hábito saudável - e se lesiona. Deve esta ser responsabilizada pela lesão e ser obrigada a pagar o tratamento? Devo dizer, porém, que os argumentos racionais nem são precisos. Permitam-me colocar uma simples questão: não terei eu o direito de ser um pouco nocivo? Não teremos todos o direito de comer rojões? Ou chocolate? Ou preferir um sofá a uma pedalada saudável?

Enfim, não teremos todos o direito de tomar decisões erradas? De sermos seres imperfeitos e falíveis? É certo que moderação é felicidade, mas ser constantemente moderado não é de uma passividade que enlouquece?

Qualquer medida de coação é inerentemente malévola. Existem casos em que é preciso agir firmemente, existem excessos demolidores. Todavia, estes são casos particulares. A coação não pode ser norma, só pode ser excepção.

A saúde é cara, mas é uma das razões porque vivemos em sociedade. Não quero viver numa sociedade só com pessoas absolutamente virtuosas, tenho bons fundamentos para pensar assim, não é só porque é aborrecido. 

Sugerir correcção
Comentar