"Eu quero é ser feliz": A quem pertence esta imagem?

Há paredes, casas e t-shirts com a frase e um coração. Maria da Felicidade garante ser a autora da frase, que já foi utilizada noutras passerelles

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Maria da Felicidade afirma ter feito o stencil em diferentes zonas de Lisboa DR

"Eu quero é ser feliz" e um coração. Esta conjugação numa imagem está nas ruas de Lisboa, do Porto, no interior de casas e no mundo da moda. O P3 seguiu o rasto à imagem para tentar perceber a quem pertence.

Existe um post de Dezembro de 2011 no blogue "Eu Quero É Ser Feliz". Assina Maria da Felicidade.

A responsável, que prefere manter o nome fictício por receio de ser processada, assume a autoria da composição destes elementos num stencil. Como prova, apresenta os posts da imagem em algumas paredes de Lisboa publicados no blogue, onde hoje também se pode ler "Mãos ao ar, isto é um assalto".

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Modelos no desfile de Nuno Gama na Moda Lisboa DR

Este post foi criado depois de Maria da Felicidade ter conhecimento de que no desfile de Nuno Gama, na ModaLisboa, vários modelos subiram à passerelle usando uma t-shirt com a frase "Eu Quero É Ser Feliz” e o coração no final. "A frase pode ser usada por toda a gente, mas do meu ponto de vista, é mais comum dizer-se 'eu quero ser feliz' do que 'eu quero é ser feliz'", salienta Maria da Felicidade, referindo que a única diferença de uma imagem para a outra é o tipo de letra.

Para Nuno Gama, não existe nenhuma semelhança entre as imagens "a não ser a frase e o coração". "A frase é comum a dez milhões de portugueses, no mínimo. O uso do coração é recorrente", afirma, em declarações ao P3. O estilista, que defende não ter usado a mesma imagem da artista, explica que "em cada quadrante" na cruz associada à sua marca "cabe um coração" e refere, ainda, que "a ideia da frase tem a ver com formas pessoais de ver as coisas e com alguma preocupação de análise e de surpresa perante a reacção das pessoas aos dados do país."

O stencil em foto e vinil

Mas ainda antes da ModaLisboa, a imagem que Maria da Felicidade assegura ter criado foi usada por terceiros. O stencil na parede foi fotografado por Ana Nogueira, que adicionou a foto às muitas que já tinha na sua página do Facebook "Fotos de Rua". Mais tarde, Ana Nogueira juntou-se à Culto Decor, uma empresa de decoração, para criar vinis com alguns dos stencils que tinha fotografado em diferentes cidades. Um deles continha a frase "Eu Quero É Ser Feliz" e um coração. Ouvidos pelo P3, tanto Ana Nogueira como a Culto Decor admitem o uso da foto do stencil, contudo, garantem nunca terem usado imagens de street art cujos autores são conhecidos, sem autorização dos mesmos.

Apesar de Maria da Felicidade afirmar ter contactado a criadora da página do facebook e a empresa, Ana Nogueira e a Culto Decor asseguram não ter recebido nenhum contacto de alguém a reclamar a autoria desta imagem. "Tivemos comentários a chamar-nos de ladrões", conta André Ferreira, da Culto Decor, realçando que nunca soube que os comentários eram feitos por uma artista.

Ana Nogueira e a Culto Decor mostraram-se disponíveis para ouvir Maria da Felicidade e retirar o vinil do mercado. "Caso prove a sua autoria", realça a proprietária da página "Fotos de Rua". A responsável, que também é advogada, salienta que a maioria das imagens que utilizou não tinham identificação do autor, não tendo, por isso, pedido autorização e defende que também não seria obrigada a fazê-lo. "Quem faz o desenho numa rua pública, onde nem sequer deveria estar a fazer, e não assina, é porque quer que seja visto ou usado por todos. Se não, tinha o cuidado de o fazer dentro de portas ou de uma galeria, ou pelo menos de assinar o seu nome."

Para Ana Figueiredo, "a partir do momento em que há uma coisa que está escrita num lugar público que não deve ser utilizado, sem qualquer identificação, isso é do domínio público. É como tirar uma foto da Torre Eiffel", compara, "e depois fazer um poster e vender. E isso é uma coisa que está identificada!"

Maria da Felicidade nunca assinou o trabalho nem registou a imagem que terá desenhado nas paredes de Lisboa. A artista acredita que se tivesse a registado, teria evitado tudo o que hoje a deixa "revoltada". "Para registar a peça são 30 euros, para me inscrever na Sociedade Portuguesa de Autores são 150 euros. É dinheiro que não posso dispor para isto", justifica.

Afirmando que não pode fazer nada em termos legais e garantindo que não pretende receber qualquer pagamento ou recompensa pela imagem, a responsável gostaria de lhe ver reconhecida a sua autoria, confessando que se sente "roubada". "Uma pessoa nunca faz nada de especial ao longo da vida e a partir do momento que faz alguma coisa, quer é protegê-la".

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