Uma reforma necessária

A troika exigiu uma reforma nos portos que sabe que Bruxelas não conseguiu. Mas é necessária

OGoverno apresenta hoje a sua reforma laboral para os portos que, com alguma ousadia, pretende eliminar estranhíssimos e velhos privilégios. Nada disto é novo. Há anos que a própria União Europeia tenta mudar o estado das coisas - em vão. Sempre que o fez, os estivadores uniram-se e protestaram, por vezes com uma violência brutal. Em Bruxelas todos se lembram da onda de destruição de 2003, quando foi apresentada uma proposta para liberalizar o trabalho nos portos europeus: fim da obrigatoriedade de uma licença portuária para os trabalhadores dos portos - que vai das gruas às cantinas, incluindo operadores de empilhadoras ou administrativos; abertura ao self-handling (que permite aos armadores descarregarem os navios com o seu próprio pessoal, não tendo que contratar os estivadores locais) e abertura à contratação de trabalhadores não-sindicalizados para a função de estivadores temporários. Na altura, estivadores de toda a Europa foram a Bruxelas mostrar o seu descontentamento. Como o fizeram? Vandalizaram edifícios da União Europeia. A directriz foi rapidamente guardada na gaveta e, nos últimos dez anos, ninguém mais ouviu falar dela. Não deixa por isso de ser interessante que a troika, formada por três parceiros que conhecem muito bem esta história, imponha a Portugal uma reforma que sabe que não conseguiu fazer a nível europeu. Quando os críticos, do Bloco de Esquerda a Manuela Ferreira Leite, acusam a troika de fazer "experimentalismo" e usar Portugal como "cobaia" para testar "modelos económicos", têm na reforma dos portos um belíssimo exemplo. No essencial, no entanto, esta reforma de Passos Coelho vai no sentido certo e abre ao mercado de trabalho um sector que hoje é controlado pelos sindicatos de uma forma difícil de compreender, com base em complexos esquemas de privilégios de acesso ao trabalho, controlo de turnos e irreais horas extraordinárias.

Corrupção, crime sem barreiras

Denúncia não é uma palavra bonita. E denúncias não-provadas podem virar-se contra o denunciante. Com este estigma, os que denunciam indícios ou casos de corrupção não têm a vida facilitada pela sociedade e, conclui-se agora num relatório exaustivo, também pelo Estado, juízes ou polícias. Sucede que, por temerem represálias, os potenciais denunciantes de crimes de corrupção acabam por remeter-se ao silêncio. A ideia é que mais depressa se desculpa um corrupto do que se louva ou agradece a quem denuncia a corrupção. Por isso as denúncias são, na esmagadora maioria, anónimas, e muitas vezes (por omissão de dados, que podem revelar ou expor de imediato quem as fez) acabam por levar a becos sem saída. A associação Transparência e Integridade (TIAC) está a tentar que o Estado reconheça e proteja quem denuncia este tipo de crimes. Mas não será tarefa fácil. E a corrupção, sem freio, continuará impune no seu rumo.

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