Reforma da rede hospitalar só prevê fechos em Lisboa e Coimbra

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Manifestação em defesa da Maternidade Alfredo da Costa, uma das unidades a encerrar Miguel Manso

A medida mais complexa prevista no memorando de entendimento assinado com a troika no sector da saúde — a reorganização hospitalar — tem sido sucessivamente adiada, mas, no final deste mês, o Ministério da Saúde (MS) comprometeu-se a apresentar um plano com a metodologia e calendarização da reforma.

O plano, porém, vai incidir “sobretudo na oferta de Lisboa e de Coimbra, com especial destaque para o futuro Hospital de Lisboa Oriental”, esclarece o gabinete do ministro da Saúde em resposta enviada ao PÚBLICO. E estará longe de ser aquilo que muitos esperam: uma lista de hospitais ou de serviços a encerrar.

A reorganização “deverá ser feita faseadamente e com a tranquilidade desejada, para não perturbar o normal funcionamento das unidades hospitalares nem a assistência a doentes”, sublinha, em resposta escrita, o gabinete do ministro, sem adiantar mais detalhes. Esta semana, o jornal i avançava que uma das propostas a apresentar à troika passa pela fusão das duas maternidades de Coimbra, Bissaya Barreto e Daniel de Matos, uma decisão já esperada.

Será, pois, um plano parcial desta reforma anunciada que já deu origem a vários estudos e a muita controvérsia. A reorganização e racionalização da rede hospitalar deverá, pelas contas da troika, permitir cortar pelos menos 5% dos custos operacionais dos hospitais.

A este propósito, uma fonte do gabinete do MS faz questão de notar que várias medidas já têm avançado ao longo deste ano e que a reorganização hospitalar não passa apenas por encerramentos e concentrações. Em Lisboa, a urgência do Hospital Curry Cabral fechou e já está decidido o encerramento da Maternidade Alfredo da Costa (não no final deste ano, como se previa, mas no início de 2013), exemplifica.

Estas medidas eram propostas no primeiro estudo realizado sobre a matéria, o relatório do grupo técnico para a reforma hospitalar, coordenado por José Mendes Ribeiro, que recomendava também que se retomasse o projecto de construção do Hospital Oriental de Lisboa em regime de parceria público-privada (PPP) — que substituirá o São José, Capuchos, Santa Marta, Curry Cabral, Estefânia e Maternidade Alfredo da Costa. Ao contrário das outras PPP, esta vai avançar e já está prevista no Orçamento do Estado para 2013.

Anteontem, o ministro disse que as condições desta PPP vão ser revistas. Mas a construção deste hospital, que permitirá solucionar uma grande parte dos problemas da rede hospitalar de Lisboa, só deverá estar concluída em 2016.

Estudos na gaveta

Pelo meio e, para já, sem consequências ficou a apresentação de dois estudos sectoriais, um sobre a rede de serviços de urgência e outro, elaborado pela Entidade Reguladora da Saúde, que incidiu sobre seis das 42 especialidades hospitalares. Os dois estudos desencadearam polémica — o primeiro propunha o fecho de 12 urgências e a desclassificação de uma série de outras; o segundo sugeria o encerramento de serviços em 26 hospitais. Ambos foram desvalorizados pelo ministro da Saúde que, em 25 de Maio, aprovou um despacho em que mandava avançar com algumas das medidas propostas pelo grupo liderado por José Mendes Ribeiro.

Nessa altura, o ministério esclareceu que algumas mudanças “podem ocorrer de forma gradual, por iniciativa dos centros hospitalares — como já aconteceu em Coimbra, ou no Médio Tejo — ou das Administrações Regionais de Saúde”. Muito cauteloso, o ministro já disse que este tipo de reorganização “é algo que demora duas legislaturas [oito anos] a fazer”.

O processo tem sido coordenado a nível interno pelo vice-presidente da Administração Central do Sistema de Saúde, Rui Ivo, que lidera uma equipa de projecto nomeada logo em Fevereiro e que em Março entregou à tutela um documento com a priorização das medidas. Em Maio foi aprovado na generalidade o plano de implementação das medidas, algumas das quais já arrancaram e não têm nada a ver com fechos de unidades, mas sim com questões laterais — o lançamento da plataforma de dados de saúde, a prescrição electrónica, as facturas informativas que começaram a ser dadas aos doentes nalguns hospitais, a monitorização dos medicamentos e a optimização de pedidos de meios complementares de diagnóstico e terapêutica, explica a fonte do gabinete do ministro.

A mesma fonte defende que já não há margem de manobra para fazer muito mais, sobretudo numa altura de crise em que medidas deste tipo seriam mal recebidas. Fechar serviços não é tarefa fácil, como se viu em 2008, quando o ex-ministro socialista Correia de Campos abandonou o ministério depois de ter encerrado várias urgências e blocos de partos.

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