Penguin+Random House = o maior grupo editorial do mundo

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A Penguin entrou em força no Brasil no ano passado JOHN MACDOUGALL/AFP

O acordo da fusão da Penguin e da Random House e a criação da Penguin Random House é uma forma de resposta aos desafios do digital e uma tentativa de entrada nos mercados emergentes, como o Brasil

Os funcionários da Penguin, o selo editorial mais famoso no mundo, receberam ontem de madrugada um email de John Makinson, o CEO da empresa, confirmando a notícia do acordo entre o grupo britânico Pearson e o grupo alemão Bertelsmann para a fusão de dois dos mais importantes grupos editoriais em língua inglesa, a Penguin e a Random House. A possibilidade tinha sido avançada na semana passada pelo jornal Financial Times.

"A nova empresa vai chamar-se Penguin Random House e integra todos os interesses dos dois grupos, da Penguin e da Random House, nas línguas inglesa, espanhola e portuguesa", comunicava John Makinson, num email divulgado pela Publishers Weekly, uma revista especializada no sector editorial. A sede vai ser em Nova Iorque e o jornal New York Times dizia que a fusão dará origem à maior editora de livros de grande consumo do mundo.

Nesta joint-venture, a Bertelsmann terá 53% e a Pearson 47%. John Makinson será o presidente da administração da nova empresa e Markus Dohle, o actual CEO da Random House, vai ser o director-executivo. "O Markus e eu temos ideias claras sobre o papel de cada um e vamos começar a trabalhar no final desta semana na configuração desta nova empresa criativa", explicava Makinson aos funcionários.

O processo que se iniciou ontem com o anúncio do acordo, e que modificará o mercado editorial mundial, deverá estar terminado no segundo semestre do próximo ano. A fusão terá de ser analisada e aprovada pelos governos alemão e britânico, por causa das leis do monopólio e concorrência. Mas, ontem, o chefe financeiro da Pearson, em declarações à BBC, mostrou-se confiante na aprovação da fusão, já que as editoras continuarão a ter a sua independência. A Bertelsmann nomeará cinco directores para a administração da Penguin Random House e a Pearson quatro. Terão, diz a BBC, entre 25 a 30% do mercado editorial global.

Eduardo Boavida, director editorial da Bertrand (que já pertenceu ao grupo Bertelsmann quando a empresa alemã estava em Portugal através do Direct Group), vê nesta "enorme concentração editorial" uma tentativa de ambos os grupos editoriais de língua inglesa darem uma "resposta aos novos desafios tecnológicos que se colocam com o livro digital". Para o editor português esta é também uma forma de "conquistarem os novos mercados emergentes, como o Brasil, a Índia e a China" e de "serem imbatíveis em termos de conteúdos para terem um monopólio que lhes permita impor condições aos intermediários electrónicos (como a Amazon, a Google, a Apple) para chegarem aos clientes". Esta fusão "prenuncia que assumem como sério futuro o digital".

O director da Bertrand considera que o negócio "para os ingleses é péssimo", porque para todos os efeitos é uma empresa alemã a comprar uma empresa inglesa e numa lógica europeia há um reforço da Bertelsmann e da Random House.

O factor português

Por sua vez, Carlo Carrenho, consultor editorial e fundador do PublishNews no Brasil, considera que "esta fusão abre a porta para a Random House entrar no Brasil por meio da parceria Penguin/Companhia das Letras". O ano passado a empresa anglo-americana Penguin adquiriu 45% da mais prestigiada editora brasileira, a Companhia das Letras. Também o grupo Bertelsmann, proprietário da Random House, abriu recentemente um escritório em São Paulo. "Uma fusão entre a Penguin e a Random House, portanto, teoricamente traria também a maior editora do mundo ao Brasil, e de forma bastante rápida, transformando a Companhia das Letras em uma das empresas mais fortes do mercado brasileiro", acrescenta Carlo Carrenho.

As vendas mundiais da Random House, segundo a revista Publishers Weekly,atingem os 1,75 mil milhões de euros e as da Penguin os 1,28 mil milhões. A junção das duas cria uma empresa cujas vendas ascenderão a 3,1 mil milhões de euros. A Penguin Random House passará a ser o grupo editorial que dominará todos os segmentos e ficará também com a maior fatia de mercado nas edições em paperback.

A Random House, considerado o mais importante grupo editorial em língua inglesa, tem entre os seus autores E. L. James, a autora do best-sellerAs Cinquenta Sombras de Grey, mas também Dan Brown, John Grisham, Danielle Steel, Nigella Lawson e Ian McEwan. A Penguin publica Zadie Smith, Patrícia Cornwell, Tom Clancy, Antony Beevor e o best-seller Jamie Oliver. Se olharmos para os tops dos livros mais vendidos nos EUA em 2011, os livros de capa dura editados pela Random House e a Penguin representam 47% dos livros que aparecem nos tops do ano passado e 45% relativamente aos livros de capa mole.

John Makinson não tem dúvidas de que alguns autores, alguns agentes e alguns clientes vão mostrar preocupação por esta fusão e vão temer que ela reduza a escolha e a competição. "Eu acredito, tal como acontece com Markus, que vai acontecer o oposto", escreveu no mesmo email aos funcionários. Os selos editoriais dos dois grupos vão manter-se tal como são hoje, "competindo pelos melhores autores e os melhores livros, mas o nosso acesso às fontes de investimento vão permitir à Penguin Random House arriscar em novos autores e defender a nossa independência criativa e editorial".

Carlo Carrenho diz que a concretização da fusão não é surpreendente. O mercado editorial global tem vindo a concentrar-se e "as chamadas Big Six" do mercado norte-americano não poderiam ficar imunes a tal tendência. Na análise que faz do mercado, o brasileiro nota, paradoxalmente, uma tendência oposta a esta concentração: "Um movimento de pulverização da produção editorial graças aos avanços tecnológicos em áreas como self-publishing, em que o grande público vira editor, e a impressão a pedido."

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