Guimarães adaptou antiga escola primária para residências artísticas

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A abertura do CCC coincide com a chegada à Universidade do Minho dos primeiros alunos do curso de Teatro ADRIANO MIRANDA

O Centro de Criação de Candoso, CCC, é um espaço de trabalho para companhias de dança e de teatro. A coreógrafa Madalena Victorino prepara na antiga escola a sua próxima produção para a Capital da Cultura

Sapatos. Há muitos sapatos junto à sala de aula, como se nos convidassem a brincar. Mas do outro lado da porta, trabalha-se a sério. Até aqui nada de novo na antiga escola primária de S. Martinho de Candoso, em Guimarães. A mesma fachada branca, contornada a granito, a mesma divisão em duas alas (rapazes a uma lado, raparigas a outro). Mas lá dentro tudo é diferente: paredes negras, piso negro reforçado e o contraste das cores das roupas que os bailarinos usam para o ensaio.

Ali prepara-se A Lã e a Neve, o novo espetáculo da coreógrafa Madalena Victorino para a Guimarães 2012, que estreia no próximo mês. E estes artistas estão a estrear o Centro de Criação de Candoso (CCC), o mais recente equipamento cultural da cidade. O nome do espaço resume o que ele pretende ser: um local de trabalho para companhias de dança e teatro em residências criativas.

"Estamos muito contentes por podermos utilizar este espaço", confessa Madalena Vitorino, enquanto nos convida a tirar os sapatos para assistirmos ao ensaio. Está aqui há duas semanas e hoje vai mostrar o trabalho aos convidados da inauguração do CCC, marcada para o final da tarde. "Isto é a gota de água que faltava em Guimarães para isto transbordar e transformar-se numa cidade acolhedora para as artes", ilustra entusiasmado Marcos Barbosa, director da companhia local, o Teatro Oficina, e programador de artes performativas da Guimarães 2012.

Nas janelas da escola ainda se encontram enfeites coloridos do tempo em que aqui brincavam crianças. A obra de adaptação foi feita com custos mínimos (cerca de 140 mil euros), sem mexer na estrutura do edifício. Assim, ficam disponíveis oito salas de trabalho, das quais duas estão especialmente equipadas para receber bailarinos. Há ainda um escritório, camaratas com capacidade para 16 pessoas, balneários e uma cozinha, que aproveita o antigo refeitório do estabelecimento de ensino. As companhias ficam assim com condições para viverem ali durante a criação, afastados do ruído da cidade.

Marcos Barbosa olha agora para a escola como uma "espécie de utopia" em que uma companhia de dança e uma de teatro possam ali estar ao mesmo tempo em residência artística, fazendo os aquecimentos em conjunto e partilhando refeições. "Depois as pessoas conhecem-se e pensam noutros projectos de criação em conjunto", antecipa. "A abertura de um espaço como este é uma alegria muito maior do que qualquer estreia", garante Marcos Barbosa. Guimarães fica agora com as condições logísticas "ideais" para oferecer aos criadores portugueses e estrangeiros um sítio onde podem começar os seus trabalhos e onde podem "experimentar coisas com maior liberdade", resume o mesmo responsável.

O CCC fica em S. Martinho de Candoso, a cerca de quatro quilómetros da cidade, numa zona próxima da auto-estrada A7, mas em ambiente rural, isolando os criadores do contacto com a cidade. O espaço será, a partir do próximo ano, o local central do trabalho do Teatro Oficina, mas estará aberto para receber qualquer companhia que ali se queira instalar.

Agora a Universidade

Esta aposta de Guimarães começa a dar frutos e convenceu a companhia Útero Teatro, do actor e encenador Miguel Moreira, a transferir a estrutura de Lisboa para Guimarães (ver notícia no último Ípsilon). O director do Teatro Oficina acredita mesmo que exemplos como estes podem ser replicados nos próximos anos. "Eu acho que apenas não acontece porque somos imaturamente centralistas. Achamos que estar em Lisboa é melhor do que estar no Porto, e estar no Porto é melhor do que estar em Guimarães e estar em Guimarães é melhor do que estar em Vila Real", critica.

No final do mês passado, Guimarães recebeu os primeiros alunos da nova licenciatura em Teatro da Universidade do Minho. Semanas depois, abre o CCC, o que para Marcos Barbosa é uma "coincidência feliz". O director do Teatro Oficina será professor do curso da UM, com a qual a cooperativa municipal de cultura assinou um protocolo de colaboração. Em breve, esse primeiro documento pode dar origem a um acordo "mais elaborado", antecipa o responsável. "Neste momento temos um capital humano muito interessante que pode ser útil ao curso e vice-versa", nota. Por isso, acredita que o novo curso pode ser "um grande incentivo" para assegurar que a cidade fica com condições para formar e fixar criadores nesta área artística.

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