Barulho nas ruas e bares do Bairro Alto e Cais do Sodré vai ter rédea curta

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Câmara promete apertar a fiscalização Miguel Manso

Persistentes denúncias de atropelos ao descanso dos moradores conquistaram a promessa da Câmara de Lisboa de acções sem precedentes, através de coimas ou pelo fecho dos bares, e já este mês.

"Ó Costa, aqui mora gente", ouviu-se, ao cair da tarde de quarta-feira, no auditório da Escola Salesiana, em Campo de Ourique, onde o executivo da Câmara de Lisboa foi ouvir os munícipes. Ouviu-se e também se leu, em cartazes negros e nas T-shirt pretas envergadas pelas gentes que moram no Bairro Alto e no Cais do Sodré, que se disseram cansadas, maltratadas e ignoradas, anos a fio sem direito a descanso.

Dizem-se vítimas do ruído ilegal dos bairros da moda, da animação nocturna desregrada, da venda do álcool, dos horários, do desrespeito, da sujidade... O Costa é António Costa, presidente da câmara, que presidiu à assembleia e que os ouviu com fair play, mas que através dos seus vereadores lhes deu novidades. Em síntese, o município disse que a bagunça não pode continuar, não vai continuar, que a noite vai ser fiscalizada e isso vai começar já este mês, com rédea curta. E mais: quem prevaricar vai pagar, caro, ou inclusivamente com o fecho dos estabelecimentos.

Luís Paisana disse ao PÚBLICO que tão surpreendido ficou quanto animado pela recepção camarária ao rol de queixas. Ao fim e ao cabo, juntou, tem sido um "trabalho de persistência que tem feito alguma mossa na Câmara de Lisboa". Luís Paisana não tem motivações políticas, apenas mora no Bairro Alto e preside à associação de moradores locais. Foi ele que apresentou os pontos de vista que os levaram a comparecer na reunião. Filipa Serpa mora no Cais do Sodré e à mesa de vereadores fez ouvir o mesmo tipo de argumentos. Estava acompanhada de uma criança de colo que, disse, quando sai à rua pela manhã, em lado algum pode colocar as mãos, tal é a sujidade, o perigo das seringas, o vomitado no chão.

"Um dia tinham de nos ouvir e agora demonstrámos que até já temos alguma força e que não podem tratar-nos como nos têm tratado. Há seis meses que solicitámos uma audiência ao presidente da CML, mas fomos encaminhados para o vereador Sá Fernandes", diz Luís Paisana. E já foram recebidos? "Não, mas já houve uma conversa informal e sinais de receptividade."

Encerramento

Na quarta-feira, não só foram ouvidos como lhes foi prometida acção. Com luz verde de António Costa avançou o vice-presidente Manuel Salgado: "Os regulamentos devem ser cumpridos, e quem não cumprir receberá ordem de encerramento." Este subdelegou depois no vereador do espaço público, Sá Fernandes: "Vamos realizar acções imediatas e sistemáticas, contra o ruído, o cumprimento dos horários, os licenciamentos, a venda ambulante de bebidas alcoólicas, a sujidade. Vamos tomar medidas já este mês e em Novembro vamos avaliar os resultados das acções, que serão sistemáticas, não só nestes bairros, mas um pouco por toda a cidade. Temos que ter um regulamento eficiente para toda a cidade."

Na quinta-feira, já a frio, mas ainda com ecos das reacções da véspera à declaração-promessa - "Mas de que ano?", ouviu-se -, Luís Paisana diz que é chegado o tempo de "ver para crer", mas também que vão "estar em cima da CML para dizer se tais acções correram bem e se esses resultados são práticos".

António Costa colocou um chapéu sobre as questões e se aos argumentos dos moradores foi dizendo que os compreende, e a quem são devidas tais acções, também fez lembrar a importância de tais actividades económicas, pelo que será preciso saber conjugar interesses, pedindo a ajuda da PSP e da Polícia Municipal. E ainda foi lembrando que tem as mãos atadas para a resolução de alguns dos problemas apresentados, apontando conversas com o homólogo de Barcelona sobre a forma de evitar que as pessoas bebam e conversem na rua. "Não há lei neste país que o proíba." "Então encerrem os bares", ouviu-se da assistência.

Victor Gonçalves, vereador do PSD, manifestou as preocupações daquela bancada, que se diz "consciente das dificuldades e em defesa do bem-estar comum". Aquele vereador disse sentir-se tão responsável como os colegas da maioria, ao admitir que, "sozinha, a CML não consegue resolver o problema" e sugeriu que se encarasse a situação de forma global com o envolvimento de todas as partes, uma task force.

"São portas e janelas abertas, com amplificadores de som, e DJ ao vivo que projectam um barulho ensurdecedor para as ruas, sujeitando os residentes a intoleráveis níveis de ruído... e o mais insólito é que se encontram vazios no interior e com a maioria da clientela a ocupar a via pública para consumir bebidas alcoólicas", lê-se no documento entregue por Luís Paisana à vereação camarária.

Pelo lado do Cais do Sodré também há queixas escritas: "Os novos horários after hours - entre as 6h e as 13h - adoptados por diversos bares com a aquiescência da CML também não ajudam, uma vez que alargaram os períodos de ruído, caos e confusão para horas dificilmente concebíveis numa zona histórica da cidade com moradores."

Três anos depois, videovigilância no Bairro Alto ainda aguarda contrato

Aaquisição e instalação do sistema de videovigilância no Bairro Alto aguarda ainda procedimentos camarários relativamente à assinatura de contrato. Segundo o vereador da protecção civil, Manuel Brito, aquele acto poderá ocorrer ainda este mês, só após o qual se poderá proceder à montagem do sistema, num valor global aproximado de 300 mil euros e compreendendo 27 câmeras.

"Concorreram 17 empresas, mas o mesmo foi alvo de recursos hierárquicos por parte de alguns concorrentes. Em 28 de Setembro, os concorrentes foram notificados da decisão da rejeição dos recursos interpostos pelas firmas Alcatel e Novabase. Na mesma data, a firma Navserver enquanto adjudicatária do procedimento, foi notificada da minuta do contrato e aguardamos que esta se pronuncie sobre a mesma. Na eventualidade de não haver qualquer objecção proceder-se-á à celebração do contrato", precisou o vereador, sem adiantar a data de entrada em funcionamento do sistema. Autorizado pela Comissão Nacional de Protecção de Dados em Dezembro de 2009, mas apenas por um período experimental de seis meses, a monitorização e gestão do sistema ficará a cargo da PSP, que não captará som, mas apenas imagens entre as 22h e as 7h.

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