Tribunais estão a declarar 50 insolvências por dia em Portugal

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O comércio continua a ser o sector com mais insolvências entre as empresas Foto: Nelson Garrido

Após quatro meses com a nova lei, o porta-voz dos administradores judiciais diz que se "deveria ter ido mais longe". José Ribeiro Gonçalves acredita que se chegará às 17 mil insolvências este ano.

A evolução das insolvências em Portugal continua sem travão, tendo sido declaradas 50 falências por dia nos primeiros nove meses de 2012. No total, o país chegou a Setembro com 13.691 processos, o que significou uma subida de 70% face ao mesmo período do ano passado. Em relação a 2010, a escalada foi de 180%. Os particulares continuam a protagonizar os maiores aumentos, tendo dado entrada nos tribunais 8964 casos, mais 83% do que em 2011. Nas empresas, o acréscimo foi de 50% e o comércio continua a ser o sector mais afectado.

As insolvências têm vindo a crescer sucessivamente ao longo dos últimos anos, mas o fenómeno tornou-se mais intenso a partir do ano passado, muito à custa das falências de pessoas singulares. Neste momento, de acordo com dados cedidos ao PÚBLICO pelo Instituto Informador Comercial com base na publicação das falências em Diário da República, estes processos já representam 65% do total. Em 2010, representavam apenas 40%. José Ribeiro Gonçalves, presidente da Associação Portuguesa dos Administradores Judiciais (APAJ) explicou ao PÚBLICO que esta tendência está ligada ao agravamento do desemprego, mas também ao facto de haver muitos empresários que foram arrastados pelas dificuldades financeiras dos negócios que criaram, por terem sido fiadores nos financiamentos (ver entrevista).

As 8964 insolvências de particulares registadas nos primeiros nove meses do ano concentraram-se sobretudo na região Norte do país. O Porto foi o distrito a que mais casos assistiu neste período, num total de 2605. Tal como já acontece desde 2010, superou Lisboa, que surge em segundo lugar, com 1627 falências declaradas pelos tribunais. As posições seguintes são ocupadas por Braga (737) e Aveiro (716). No entanto, a maior subida foi protagonizada por Beja, com 69 insolvências, o que significou um acréscimo de 263%.

No lado das empresas, houve 4727 processos entre Janeiro e Setembro, mais 50% do que no ano passado. Em relação a 2010, o aumento foi de 61%. Este tipo de falências, que hoje representam apenas 35% do total, também teve maior expressão no Porto, onde se registou 1105 processos. Já em Lisboa, houve 998 casos, seguindo-se Braga, com 628. Foi também em Beja que se verificou a maior escalada, ao registar 27 falências deste tipo (mais 145% do que em 2011).

Mais falências no retalho

Os dados do Instituto Informador Comercial mostram que o comércio continua a ser o sector mais afectado pelas insolvências de pessoas colectivas, tendo sido declaradas 662 falências judiciais de comerciantes a retalho e outras 586 de grossistas, excluindo-se nestes valores os estabelecimentos que vendem automóveis e motociclos. A promoção imobiliária mantém-se no pódio, com 642 processos registados nos primeiros nove meses de 2012. A construção e a restauração surgem nos lugares seguintes, com 313 e 266 casos, respectivamente.

Porém, as actividades que maiores aumentos verificaram foram a da reparação, manutenção e instalação de máquinas, que sofreu uma subida de 367%, ao passar de três para 14 insolvências, e a do apoio social com alojamento, com um acréscimo de 350% para nove processos. Outros sectores tiveram um comportamento inverso, registando recuos no número de falências. Foi o caso, por exemplo, das empresas da área das telecomicações (que passaram de cinco para zero casos).

Este ano, face à escalada das insolvências em Portugal e aos compromissos assumidos com as autoridades externas, o Governo avançou com a revisão do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE), que criou um novo mecanismo judicial para promover a recuperação de empresas em dificuldades: o Processo Especial de Revitalização (PER). De acordo com os dados do IIC, já foram declarados 175 processos deste tipo nos tribunais portugueses, desde que o instrumento avançou, em Maio. Mais uma vez, uma parte significativa (cerca de 100) teve origem na região Norte.

Apesar de o objectivo ser aumentar o número de casos de viabilização financeira, o presidente da APAJ disse ao PÚBLICO que o PER "está a ser utilizado por empresas que deveriam antes apresentar-se à insolvência", por já estarem numa situação muito difícil.

Servem-se do mecanismo como "uma forma de ganhar tempo", já que as acções de execução são suspensas. José Ribeiro Gonçalves alertou ainda para o facto de a revisão do estatuto dos administradores judiciais, nas mãos do Ministério da Justiça, ainda não estar concluída, o que impede que se aumente o número de profissionais que acompanham estes processos. Neste momento, são apenas 300.

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