“Piquenique” (“Picnic”), de Joshua Logan (1955)

Pelas informações que vamos coleccionando tendo como fonte as várias personagens, sabemos que a acção do filme se passa no Dia do Trabalhador, mas nos EUA esse feriado não é observado no 1.º de Maio

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EUA, meados da década de 1950. Um comboio de mercadorias dá entrada numa pequena cidade do estado do Kansas e, bem ao contrário do que se passava na década de 1930, quando as companhias de caminho-de-ferro norte-americanas contratavam grupos de homens para revistar os vagões e expulsar os passageiros clandestinos (veja-se, por exemplo, “A Quimera do Riso”, de Preston Sturges), o maquinista do comboio vem avisar um viajante sem bilhete de que é ali que ele quer sair. O homem, Hal Carter (William Holden) é relativamente jovem, mas demasiado velho para não ter alcançado ainda uma situação profissional estável. Percebemos pelo curto diálogo entre os dois que foi isso que o levou ali: procura um ex-colega de faculdade cujo pai é um milionário no ramo dos cereais. Essa é a sua esperança de arranjar o emprego que lhe tem escapado (e um método que tem sobrevivido a épocas históricas, regimes políticos e conjunturas económicas).

Mais uma vez, pelo exercício da lei das coincidências de que a ficção muito depende, o “jovem mas não muito” consegue, logo na sua primeira incursão, um lugar para tomar o pequeno-almoço de graça, uma oferta para lhe lavarem a camisa e a possibilidade de conhecer Madge, a rapariga mais bonita da cidade (Kim Novak, que já vimos em “A Mulher que Viveu Duas Vezes”), a irmã intelectual, Millie (Susan Strasberg), a mãe delas (Betty Drake) e uma hóspede pagante, uma professora do liceu solteirona (Rosalind Russell). Logo a seguir, lá está ele no relvado da casa do ex-colega da faculdade Alan (Cliff Robertson, no seu primeiro papel), surpreendendo-o a ele e ao pai. E ainda é de manhã!...

Pelas informações que vamos coleccionando tendo como fonte as várias personagens, sabemos que a acção do filme se passa no Dia do Trabalhador, mas nos EUA esse feriado não é observado no 1.º de Maio, mas na primeira segunda-feira de Setembro e, marca, simbolicamente, o fim do Verão. Naquela cidadezinha (para nós, seria uma vila) é o dia do seu grande piquenique, cheio de diversões que culminam com a eleição da beldade do Neewollah (Halloween escrito ao contrário). E é para esse piquenique – que justamente dá o título ao filme – que convergem todas as personagens que conhecemos e é lá que vão explodir as suas paixões, após o fogo lento de mais ou menos anos, de acordo com a idade de cada uma delas, de maceração de sonhos e de contenção de frustrações.

Uma adaptação para cinema da peça de teatro de William Inge que o próprio Joshua Logan tinha encenado, é muito interessante notar que à sucessão rápida de acontecimentos iniciais se sucede um período em que o tempo quase pára, para deixar que as personagens se dispam, se revelem, traiam a sua resistência a deixarem-se ver na plenitude dos seus embaraços, das suas dores, das suas invejas, dos seus desejos abafados, das suas solidões. E de como tudo isto tanto se sofre como se exerce sobre outros, em sistemas cruzados de expectativa, atracção, despeito: Hal, Madge, as colegas do liceu, o rapaz que entrega os jornais, o namorado de Madge e amigo de Hal, a mãe de Madge, a professora solteirona, o merceeiro Bevans.

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Bastou aparecer Hal Carter para tudo estourar. Por que raio não foi Hal para outro sítio?... Mas, para onde, se em todo o lado as pessoas vivem assim?...

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