Músicos portugueses solidários com as Pussy Riot mas pouco activos

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Por todo o mundo têm surgido várias manifestações de apoio às russas AFP

Os músicos portugueses estão solidários com as russas Pussy Riot, mas até agora, ao contrário do que aconteceu um pouco por todo o mundo, não se registam manifestações visíveis de apoio.

O julgamento e a condenação do grupo punk Pussy Riot a dois anos de cadeia na Rússia, por uma performance no interior de uma igreja, suscitaram manifestações de solidariedade de artistas como a Madonna, Bjork ou Peaches, que compôs mesmo uma música intitulada “Free Pussy Riot”, mas em Portugal tem prevalecido o silêncio da comunidade artística.

Alguns músicos, interrogados pela agência Lusa, consideram a condenação “descabida”, como a ‘rapper’ Capicua, Ana Fernandes, que acha “incrível em pleno século XXI, na Europa, assistir a um caso destes de repressão e de falta de liberdade artística e de expressão”. A portuense, que editou este ano o primeiro álbum, acha que o assunto “merece a visibilidade que tem tido e a preocupação de toda a gente que tenha alguma consciência política.”

Paulo Furtado, o Legendary Tiger Man e vocalista dos Wraygunn, considera que na Rússia se “está a ir longe demais e que a pena é absolutamente descabida”, embora admita que elas pudessem ser multadas “por se tratar de uma intervenção provocatória numa cerimónia religiosa”.

Já o vocalista dos Mão Morta, Adolfo Luxúria Canibal, reconhece não ter acompanhado o processo que levou à sentença aos três elementos da banda russa, mas classifica a situação como “completamente desproporcionada e disparatada”, remetendo para o tempo do fascismo em Portugal.

A invisibilidade dessa solidariedade em Portugal pode estar, segundo Capicua, no facto de a sua geração, apesar de ser “de filhos de pessoas que viveram o PREC e passaram por toda essa história, acabar por ser pouco politizada” havendo “pouca cultura de discussão política e de manifestação”.

Já Frágil, vocalista da banda punk Motornoise, acha que Portugal é “um país de manifestações no Facebook”. Lembra-se de “ver os milhares de pessoas que se juntaram para uma manifestação [‘Geração à rasca’], toda a gente ficou muito encantada com aquilo e a seguir mais nada”. “As pessoas não saem, não protestam, o Facebook para o português não podia calhar melhor”, conclui

Para Frágil, as Pussy Riot, com quem está solidário, ultrapassam o punk e ligam-se a lutas como as dos movimentos LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transgéneros) de quem tem recebido informação. Desconfia, no entanto, de alguns aproveitamentos “solidários” (“até já mete a Madona!”) e que o ruído em torno delas faça esquecer outros casos graves na Rússia, como a emergência de movimentos neonazis: “já morreram um ou dois punks em protestos e ninguém fala”.

E se fosse em Portugal? Quando questionado sobre um hipotético cenário paralelo, o vocalista dos Mão Morta recorda um episódio “insignificante” comparado com o caso russo, passado em 2009, por altura do Barco Rock Fest, em Guimarães, num evento onde a Guarda Nacional Republicana (GNR) local “aproveita a ocasião do festival para preencher as suas obrigações anuais”.

A banda de Braga Smix Smox Smux insurgiu-se “contra o excesso de policiamento e o excesso de presença e prepotência da própria GNR, incluindo [revistas aos] camarins de músicos. No fim da actuação, o vocalista foi detido para identificação e passados uns meses apresentado a tribunal”, onde foi condenado a trabalho comunitário, algo que Adolfo Luxúria Canibal considera “significativo do que poderia ser em Portugal”.

Capicua não sabe “qual seria a reacção”, mas recorda “quando Herman José fez uma rábula da Última Ceia ou quando o Saramago foi impedido de participar num concurso internacional pelo seu ‘Evangelho segundo Jesus Cristo’” para afirmar que “Portugal é um pais conservador” mas, “apesar de tudo, uma democracia mais saudável do que a russa”.

Paulo Furtado admite “que muito provavelmente haveria pessoas indignadas, e essa indignação é legítima, mas nem haveria uma pena de prisão, e nem provavelmente haveria tanto alarido”.

João Pimenta, dos barcelenses Alto!, afirmou não ter ficado “muito chocado” com o sucedido em Moscovo, uma vez que “a Rússia sempre foi um país dominado e governado por ditadores, desde os czares até Estaline”, onde nunca se pôde falar livremente.

O vocalista dos Alto! considera a actuação das Pussy Riot “um bocado infantil”, sendo que “se calhar tudo o que vem a seguir também é um bocado parvo”, culminando com o julgamento.

Para João Pimenta, que não encontra nomes significativos no panorama actual a introduzirem activismo no seu trabalho, a “música é mais forte do que a política”, o que significa que não é necessário ligar as duas.

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