Vinhos rosados

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Durante anos os vinhos rosados, habitualmente conhecidos como vinhos rosé, foram escorraçados e desacreditados pela maioria dos enófilos e consumidores ocasionais, permanentemente olhados de soslaio e entendidos como representantes pouco dignos do mundo dos vinhos, como um estilo de vinho pouco estimulante e de que a maioria fugia a sete pés. Poucos seriam os que teriam coragem de admitir gostar de um vinho rosado, poucos seriam os que teriam coragem de pedir uma garrafa de um vinho rosado num restaurante ou em qualquer outro lugar público. Admitir sentir simpatia por vinhos rosados seria quase como uma admissão pública de pouco conhecimento do vinho e dos seus mistérios.

E de repente, numa mudança pouco habitual num mundo dos vinhos tão conservador, os vinhos rosados transformaram-se na grande sensação e sobressalto dos últimos anos inundando prateleiras de garrafeiras e supermercados numa torrente cor-de-rosa surpreendente e absolutamente inesperada. Nunca se vira algo em tal escala, nunca um estilo de vinho tinha despertado de um longo torpor de forma tão intempestiva e inadvertida. Nunca o establishment tão tradicional do vinho tinha sido colocado em causa de forma tão marcada e tão repentina.

Os anos de aparente sucesso dos vinhos rosados têm-se sucedido de forma vertiginosa, notando-se ainda hoje uma ebulição pouco comum neste mundo recatado, uma excitação visível na profusão de rótulos que continuam a estrear-se por cada nova vindima, assumindo-se como muito mais que uma mera excentricidade casuística. Este ano, tal como nos seis ou sete anos anteriores, assiste-se a uma consolidação de posturas dos vários produtores e das regiões envolvidas elevando o vinho rosado a um estilo de vinho que deixou de fazer parte de um pequeno gueto para se transformar num mundo reconhecido e admirado por direito próprio.

Depois de anos em que foram vítimas de terríveis preconceitos, sinónimos de algum embaraço por parte dos consumidores, depois de anos em que os vinhos rosados foram consumidos quase às escondidas, com receio dos juízo de valor que poderiam ser alvo, os vinhos rosados despontaram de vez. Espartilhados pelo rótulo pejorativo e sexista de "vinhos de senhora", de vinhos menores, os vinhos rosados foram por vezes confundidos como mistelas, como uma eventual mistura entre vinhos tintos e vinhos brancos, longe de serem levados a sério ou de ser sequer encarados como alternativas válidas no acompanhamento de refeições.

O que não deixa de ser curioso porque para o sucesso dos vinhos rosados contribui a ideia de hoje serem encarados sobretudo como um vinho de refeição, uma variação saudável da ditadura de escolha entre os vinhos brancos e tintos. No fundo, os vinhos rosados conjugam a estrutura e definição dos vinhos tintos com a frescura, leveza e capacidade refrescante dos vinhos brancos. São extremamente versáteis à mesa prestando-se a contracenar de forma feliz e eficaz com pratos onde figurem os peixes frescos, sejam eles gordos ou mais secos, peixe fumado, carne branca ou em algumas circunstâncias, carne vermelha.

São além disso parceiros ideais para os dias de calor, dias em que os vinhos tintos assomam como uma proposta menos aliciante, sendo perfeitos para os dias de Verão passados na esplanada, junto à piscina ou ao mar, adequados para os picnics de Verão. São tão versáteis que os estilos podem variar entre um estilo mais sério ou um estilo que privilegie uma aproximação mais simples, apresentando-se como vinhos austeros ou exuberantes, vinhos pesados ou leves e frescos, capazes de alegrar uma noite de Verão.

Como nascem os vinhos rosados e quais os motivos para tão estranha coloração? Na verdade, existem duas técnicas fundamentais na elaboração de vinhos rosados, o método de sangria e o método chamado "natural". O método de sangria, o mais comum na enologia contemporânea, resulta do sangramento forçado do mosto numa fase inicial do contacto com as peles da uva, aumentando através deste expediente artificial o rácio entre as peles da uva e o mosto. Este método de "sangramento" dá origem a vinhos rosé mais concentrados na cor e nos aromas, vinhos que poderão aproximar-se facilmente do estereótipo do vinho tinto, afastando-se eventualmente do estilo pretendido de vinho suave e refrescante.

O segundo método, conhecido como "natural", representa uma vontade deliberada de produzir um vinho rosado desde o berço em detrimento de uma prática enológica para aperfeiçoar outro vinho. As peles das uvas têm um contacto muito curto com o mosto sendo descartadas logo de seguida, seguindo a filosofia empregue na elaboração dos vinhos brancos. Por regra os vinhos produzidos segundo este método resultam em rosados mais vibrantes, com uma acidez mais incisiva e aromas mais sedutores.

Os vinhos rosados devem ser consumidos jovens, necessitam ser tomados frescos, a temperaturas semelhantes às temperaturas de serviço dos vinhos brancos. Os estilos poderão variar entre a secura extremada e a doçura despropositada, entre a exuberância da fruta e a impavidez da austeridade aromática. Os rosés secos são os mais adequados para serem desfrutados na mesa, os que mais e melhor se adaptam nas harmonizações entre vinho e comida. Os rosés mais adocicados prestam-se melhor ao convívio na esplanada, manifestando tendência para se apresentarem ligeiramente enjoativos à mesa, incapazes de gerar o prazer e consistência dos seus pares mais secos.

Este Verão não se sinta tolhido em experimentar estes vinho cor-de-rosa, não se sinta preso a clichés do passado. Certamente ficará fascinado com a experiência.

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