Hollande, um "Presidente normal" abaixo das expectativas

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Um "Presidente normal", e depois, o que tem mais para oferecer? Martin Bureau/AFP (arquivo)

Após cem dias e eleito com uma promessa de mudança, os franceses estão satisfeitos com o Presidente François Hollande? Confiando nos números de uma sondagem publicada no Le Figaro, jornal de direita, apenas 46% estão contentes com o desempenho do "Presidente normal", quando em 2007 Nicolas Sarkozy tinha a aprovação de 65%. Mas, nessa altura, o "hiperpresidente" não tinha de enfrentar uma economia ameaçada de recessão, que pelo terceiro trimestre sucessivo se mantém estagnada.

Se "a mudança, agora", era o lema da campanha do socialista Hollande, o Figaro sublinha que 51% das pessoas ouvidas no estudo de opinião IFOP pensam que as coisas em França estão a mudar sobretudo para pior - só 17% acham que estão a melhorar. "Neste clima muito pessimista, e com pouco espaço de manobra, os níveis de confiança em Hollande ficam abaixo dos 50%", comentou Jerome Fourquet, do IFOP.

Já Christophe Piar, do instituto de sondagens CSA, sublinha à revista L"Express que não há nada de surpreendente nas diferenças de popularidade entre Hollande e Sarkozy no mesmo ponto dos seus mandatos: "O período de estado de graça dos presidentes é cada vez mais curto. Os eleitores tornaram-se mais cépticos. Sarkozy tinha uma popularidade próxima dos 60%, mas já era menor do que a que Jacques Chirac tinha quando chegou ao poder."

Os últimos dados da CSA sobre a popularidade de Hollande são relativos ao fim de Julho e mostram que o Presidente tinha uma aprovação de 54% do eleitorado - mais do que em Junho, quando tinha 51%.

Não é que os franceses achem que Hollande e o seu Governo, liderado pelo discreto primeiro-ministro Jean-Marc Ayrault, não tenham feito nada: 57% dizem que o Presidente está a cumprir as suas promessas eleitorais. E a grande maioria concorda com as mais simbólicas, como a retirada das tropas de combate francesas do Afeganistão até ao fim de 2012 (75%), ou o regresso da reforma aos 60 anos para os trabalhadores que tenham completado 41 anos de descontos (71%).

Quanto ao aumento de 2% do ordenado mínimo nacional, outra promessa eleitoral, tem um apoio bastante alargado - 59%. Curiosamente - ou talvez não -, o gesto é mais apreciado entre os quadros superiores e diplomados (68%) do que entre os trabalhadores que mais beneficiarão do aumento (48%)...

O fim da taxação das horas extraordinárias - uma medida-estandarte do mandato de Sarkozy - é que não foi bem recebida: 61% estão contra esta decisão de Hollande, que faz 75% de insatisfeitos entre os trabalhadores que ganham menos.

Para além do estilo

O que está a falhar então na acção do "Presidente normal"? Um editorial do Libération, jornal de esquerda, tem um título sugestivo: "Torpor." O problema, diz, é que os franceses não conseguiram ainda vislumbrar para onde é que François Hollande e os seus querem levá-los. "Tal como o anti-sarkozismo não é um programa, uma mudança - ainda que radical - de estilo não basta para impor uma visão, um desenho, uma dinâmica. Sem isso, não haverá um arranque para o sucesso."

Para a direita, na oposição, habituada ao doping da velocidade de um Presidente que parecia estar em todo o lado ao mesmo tempo, este vagar pelo menos aparente da equipa de Hollande é um alvo perfeito.

Por exemplo, a actuação da diplomacia francesa na Síria tem sido alvo de grandes críticas - deu até azo ao reaparecimento na arena política de Sarkozy, a assinar um comunicado conjunto com o líder do Conselho Nacional Sírio, Abdelbasset Sayda, reclamando "uma acção rápida da comunidade internacional para evitar massacres". Após uma conversa telefónica, o ex-Presidente francês e o líder sírio viam grandes semelhanças entre a luta actual contra Assad "e a crise líbia".

Hollande alinha pela posição dos restantes países ocidentais que têm mantido afastada a possibilidade de uma intervenção na Síria, ou de prestar um auxílio militar aos rebeldes como a NATO fez na Líbia - os EUA nunca se mostraram dispostos a tal. Isto embora o Presidente francês já tenha dito que uma intervenção armada na Síria não "seria de excluir", mas apenas se existisse uma resolução da ONU nesse sentido.

Mas no meio de uma chuva de críticas à fraca prestação da diplomacia francesa, o ex-primeiro-ministro François Fillon veio a campo dar uma lição de governação a Hollande, incentivando-o ir à Rússia para desbloquear a situação da Síria: "Se eu fosse François Hollande, apanharia um avião para Moscovo, se possível com Angela Merkel, para convencer Vladimir Putin a fazer Assad dobrar", escreveu esta semana no Le Figaro.

Com tantos conselhos mais ou menos - talvez menos - bem intencionados, críticas e avaliações, o caminho de Hollande é cheio de armadilhas. Para a rentrée, além da Síria, tem outra prova de fogo: a aprovação do orçamento rectificativo.

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