Bolsas sobem em flecha e juros acalmam após compromisso do BCE sobre o euro

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A bolsa de Madrid disparou depois de Draghi admitir uma intervenção do BCE nos mercados Foto: Fredrik Von Erichsen/AFP

Quanto vale uma promessa sobre o futuro da zona euro para acalmar os mercados? O sinal de abertura demonstrado hoje pelo BCE para travar o contágio da crise levou a uma onda de euforia nas bolsas e conduziu a uma descida imediata das taxas de juro da dívida espanhola. Um alívio que pode ser temporário e que arrisca quebrar-se logo que os mercados voltem a testar a capacidade da zona euro em resolver a crise.

Depois de Mario Draghi sinalizar uma nova intervenção do Banco Central Europeu (BCE) nos mercados, cada vez mais voláteis, o risco da dívida de Espanha no mercado secundário baixou da barreira dos 600 pontos-base em relação aos títulos de dívida alemães, que são a referência nos mercados de dívida na zona euro.

As taxas de juro pedidas pelos investidores para comprar dívida espanhola a dez anos no mercado secundário recuaram pela primeira vez da barreira dos 7% em cinco sessões, de acordo com os dados da Reuters. Também os títulos italianos e portugueses seguem uma tendência descendente.

Numa conferência em Londres, o presidente do BCE reconheceu que a autoridade monetária tem de agir. “Uma vez que os prémios de risco exigidos aos países periféricos afectam o funcionamento dos canais de transmissão da política monetária, faz parte do nosso mandato” resolver o problema, afirmou.

As bolsas europeias ganharam fôlego no fecho da sessão. Madrid subiu 6% (a maior valorização em dois anos, depois de dias de fortes recuos), Milão ficou próxima desse patamar e Paris valorizou mais de 4%. Ao crescer 2,67%, a bolsa de Lisboa acompanhou este optimismo, também visível na praça de Bruxelas (3%) e em Frankfurt (2,75%). Já Atenas fechou em queda, recuando 0,83%.

Depois de dias de forte tensão nos mercados, é possível ligar de forma tão explícita esse movimento positivo nas bolsas e no mercado de dívida às palavras de Draghi? “Tem tudo a ver com isso”, diz ao PÚBLICO Rui Bárbara, gestor de activos do Banco Carregosa, notando em particular uma correcção significativa nas taxas de juro da dívida espanhola a dez anos neste contexto.

“Para além do compromisso de que ia utilizar todo o arsenal à disposição, Draghi disse uma coisa muito interessante: o mecanismo de transmissão [de política monetária do BCE] não está a funcionar e faz parte da sua função assegurar essa transmissão”, observou.

Na quinta-feira, Ewald Nowotny, membro do conselho de governadores do BCE, admitiu a concessão de uma licença bancária ao fundo permanente de socorro do euro, o que aumentaria a capacidade para acudir aos países em dificuldades da zona euro. Hoje, foi a vez de o presidente da autoridade monetária abrir a porta a uma intervenção maior do BCE.

Para Rui Bárbara, “são várias as indicações de que o BCE poderá retomar medidas não convencionais”. Uma terceira operação de cedência de liquidez extraordinária aos bancos da zona euro não foi abordada hoje por Mario Draghi no seu discurso em Londres. Mas a expectativa dos mercados assentará nessa mensagem implícita.

“É indicador de que poderemos ter para breve uma medida no sentido do que aconteceu no final do ano passado e início deste ano”, diz o gestor de activos português, referindo-se a duas injecções extraordinárias de liquidez (cerca de um milhão de milhões de euros) a centenas de bancos em Dezembro de 2011 e Fevereiro último.

Os mercados esperam justamente que o BCE aja e Draghi abriu a porta a essa possibilidade, acentuou à AFP Alexandre Baradez, analista da filial francesa do banco dinamarquês Saxo Bank.

Rui Bárbara diz ser possível que, nos próximos dias, as taxas de juro da dívida espanhola mantenham a tendência de melhoria de hoje, mas alerta: “Se nada houver em concreto nas próximas duas a três semanas [uma intervenção do BCE nos mercados para comprar dívida espanhola e italiana], é possível que o mercado volte a testar a vontade da zona euro” em resolver a crise, regressando-se a uma nova tendência de subida dos juros.

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