As empresas ajustaram mais do que o previsto

Foto
Pedro Martins quer evitar que as empresas tenham encargos salariais que não podem suportar. Nuno Ferreira Santos

O secretário de Estado do Emprego reconhece que em resposta à crise as empresas optaram por fazer mais despedimento do que em recessões anteriores, o que ajuda a explicar o elevado desemprego.

Pedro Martins acredita que as mudanças na legislação laboral vão incentivar as empresas a investir em vínculos laborais mais duradouros, logo que a pior fase da crise seja ultrapassada. A moderação salarial é uma das principais preocupações do Governo, por isso o aumento do salário mínimo está para já afastado.

Também a publicação das portarias de extensão, uma forma de alargar os efeitos dos contratos colectivos aos trabalhadores não sindicalizados de um determinado sector, continuará suspensa, até haver critérios que assegurem que elas "servem o seu propósito de criar condições equilibradas, sem dificultarem a continuidade de empresas e sem gerarem mais desemprego". Este é um ponto sensível do acordo tripartido assinado em Maio e tanto a UGT como a Confederação do Comércio já ameaçaram romper o entendimento com o Governo se as portarias não forem publicadas.

Acredita que as alterações ao Código do Trabalho (CT) vão mesmo favorecer o emprego e vínculos mais estáveis?

Acredito. Portugal está confrontado com um problema sério de segmentação do mercado de trabalho e de precariedade. Há muitas empresas que criam postos de trabalho de natureza permanente, no entanto optam por vínculos laborais mais flexíveis - nove em cada dez contratações são feitas a termo - e isso é extremamente negativo. Se houvesse um contexto diferente para os contratos sem termo, tenho a certeza de que as empresas teriam maior propensão para os usarem.


Mas a criação de emprego passa sobretudo pela confiança das empresas e pelo crescimento económico.

Com certeza. O combate ao desemprego e a promoção das contratações passam sobretudo pelo crescimento económico. Mas se, numa altura em que se tiver ultrapassado a pior fase desta crise, houver um contexto mais favorável a vínculos laborais mais duradouros, haverá uma maior propensão das empresas para mudarem as suas abordagens.


Como? Se as alterações aliviam as regras de despedimento por inadaptação e por extinção de posto de trabalho e reduzem as indemnizações?

[Com o novo CT], uma empresa pode apostar com mais confiança nos contratos de trabalho sem termo. Caso se verifiquem problemas no futuro, que forcem o ajustamento da força de trabalho, a empresa poderá efectivamente proceder a esses ajustamentos, ao contrário de toda a incerteza que actualmente se verifica nos contratos de trabalho sem termo.


A mantém que é urgente melhorar o funcionamento do mercado de trabalho em Portugal. O que falta fazer?

A segmentação [do mercado de trabalho] continua a ser um problema e há a questão do aumento significativo do desemprego. É importante assegurar que há flexibilidade suficiente na economia para que as empresas não se vejam forçadas a promover despedimentos.


Vários economistas alertaram para o risco da subida do desemprego. Em que é que a realidade vos surpreendeu?

Terá havido uma maior propensão, face ao que se verificou nas crises anteriores, para as empresas fazerem um ajustamento mais forte, envolvendo mais despedimentos. De acordo com os modelos estatísticos, para uma determinada evolução do Produto Interno Bruto (PIB), verifica-se uma determinada evolução da taxa de desemprego. Utilizando essa informação, esperava-se uma evolução do desemprego inferior à que se verificou.


O Governo desprezou o impacto das medidas previstas no memorando?

A análise mais rigorosa é a que tem em conta o que aconteceu no passado e extrapolar a partir daí. Se o ajustamento vai ser mais ou menos pronunciado é uma matéria mais subjectiva e um estudo mais rigoroso deverá abster-se de fazer essas considerações adicionais. No estudo [divulgado esta semana] concluiu-se que há factores de cariz qualitativo que podem ajudar a explicar o desfasamento entre PIB e desemprego.


Está fora de questão aumentar o salário mínimo nacional (SMN) em 2012 e em 2013?

Havendo tantas dificuldades por parte de tantos portugueses em conseguir um emprego, aumentar o SMN nesta altura poderia tornar essas dificuldades ainda maiores. É com certeza um aspecto incontornável, mas é necessário acompanhar a evolução do mercado de trabalho.


Nas reuniões com a troika, as confederações patronais deixaram claro que chega de moderação salarial e que é preciso actuar ao nível do financiamento e dos custos de contexto das empresas. Chega de moderação salarial?

O SMN é uma dimensão importante dessa moderação salarial. Mas não há qualquer impedimento que as empresas em negociação com os trabalhadores decidam os aumentos que entenderem apropriados. Outra questão é o Estado determinar que as empresas são obrigadas a pagar remunerações mais elevadas e essa decisão pode ter efeitos muito negativos ao nível da manutenção de postos de trabalho.


Ser secretário de Estado do Emprego numa altura em que o desemprego bate recordes sucessivos não é frustrante?

A economia acumulou desequilíbrios fortíssimos ao longo dos últimos anos e as soluções apresentadas foram sobretudo de curto prazo. Agora, se por um lado há uma preocupação muito grande com o nível elevadíssimo do desemprego, há a consciência de que foram desenvolvidas reformas estruturais que podem perspectivar que o ciclo de recessão que caracterizou a economia portuguesa nos últimos anos não se volte a verificar.


Extensão dos contratos colectivos continuará suspensaAs portarias de extensão são um ponto polémico e uma ameaça ao acordo tripartido. O que é que o Governo tem contra as portarias de extensão e como vai resolver o problema?

A


troika

mostrou sempre uma preocupação com a moderação salarial. Se se verifica um aumento dos salários desproporcionados da situação económica de um determinado sector, isso vai redundar em mais desemprego. As portarias de extensão, se forem emitidas de forma muito alargada, podem ter implicações negativas ao obrigar determinadas empresas a pagar salários que encaram como incomportáveis e proporcionar o aumento do desemprego.

Mas quando se decide não estender os aumentos salariais aos trabalhadores não sindicalizados e às empresas que não fazem parte das associações que assinaram o contrato colectivo não se está a fomentar a concorrência desleal?

O objectivo passa por encontrar uma formulação apropriada: procurar garantir um certo equilíbrio nas evoluções salariais de um determinado sector, sem fazer com que essa portaria possa ter efeitos perversos ao nível do emprego.


Como vão resolver o problema?

Foram publicadas 12 portarias. Para o futuro, é importante encontrar uma formulação. É importante estabelecer critérios, para se tomarem as melhores decisões e assegurar que [as portarias] servem o seu propósito de criar condições equilibradas, sem dificultarem a continuidade de empresas e sem gerarem mais desemprego.


Quando haverá decisão?

Estamos a discutir. Nos próximos meses haverá desenvolvimentos.


Além das que foram publicadas não serão publicadas outras, até os critérios estarem definidos?

É importante assegurar a definição de critérios apropriados para que as portarias possam ser publicadas da melhor maneira.


Porque publicaram as 12? Para sossegar a UGT, que ameaçou romper o acordo?

Vêm do governo anterior e criou-se expectativa de que viriam a ser publicadas.


Sugerir correcção
Comentar