Antiga lota de Aveiro desespera por investidores após falhanço do Polis

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Câmara não intervém porque o terreno pertence à APA e a APA diz que o terreno está fora da sua jurisdição adriano miranda

Os jardins e equipamentos culturais e desportivos projectados nunca passaram do papel. Em vez da prometida requalificação, o que aconteceu na zona foi o acentuar da degradação

Por esta altura, a antiga lota de Aveiro já deveria ser um dos locais mais nobres e procurados da cidade, tirando partido da sua frente de ria e centralidade. Mas a requalificação da zona, que chegou a ser a principal bandeira do programa Polis de Aveiro - entretanto concluído e extinto -, não só não ocorreu, como o local está cada vez mais sujeito ao abandono e degradação.

A propalada recuperação da zona da antiga lota é cada vez mais uma miragem, para desgosto daqueles que sonharam ver ali nascer uma área com jardins temáticos, hotel, estação fluvial, equipamentos desportivos e culturais, além de uma zona de habitação. Foi também em nome desse objectivo que o Polis Aveiro foi criado em 2000 e se propôs ligar os canais da ria ao dia- a-dia dos aveirenses. Mas os anos foram passando, o programa foi avançando com intervenções noutras frentes e a antiga lota foi ficando para trás. Foi bandeira do programa, mas não chegou a ser desfraldada.

O sucessivo adiamento da intervenção decorreu da falta de entendimento entre a Câmara de Aveiro e a entidade proprietária dos terrenos em questão, a Administração do Porto de Aveiro (APA). Em 2007, quando foi dado por concluído o Polis Aveiro, o responsável técnico pelo projecto, Matos Rodrigues, confessou que a sua equipa estava "desanimada" por não ter conseguido concretizar aquela que era a sua obra emblemática. O Polis Aveiro despediu-se, assim, deixando apenas o desenho daquilo que idealizara para a zona (Plano de Urbanização), deixando à APA a responsabilidade de dar seguimento ao projecto.

A administração portuária ainda tentou vender os terrenos (118 mil metros quadrados), por duas vezes, em hasta pública, mas não apareceram interessados. A ideia era que a requalificação, e consequente rentabilização da zona, fosse assumida por investidores privados. Da primeira para a segunda hasta pública, a APA até baixou o valor base (de 12 milhões para 10,5 milhões de euros), mas o negócio - mesmo com o país ainda longe de imaginar a crise financeira que vinha por aí - não entusiasmou os investidores.

Terra de ninguém com dono

Mais do que um lugar votado ao abandono, a zona da antiga lota parece ser terra de ninguém. Pelo menos, no que toca ao assumir de responsabilidades pela necessidade de travar rapidamente a degradação da zona. A Câmara de Aveiro sublinha que não pode intervir naquele espaço por se tratar de "um terreno privado".

"A câmara não pode intervir. O que temos feito é alertar o proprietário para a situação e tentar ajudar para que a imagem do espaço não se degrade", escreveu Élio Maia, o presidente do executivo camarário, em resposta a um pedido de esclarecimentos do PÚBLICO.

Da parte da APA, a resposta não é muito diferente. "Não podemos fazer nada. Aquela área não está na nossa jurisdição", argumenta José Luís Cacho, presidente do conselho de administração da infra-estrutura portuária. A pergunta impõe-se: quem deve, então, intervir na zona da antiga lota? "O concurso para a venda dos terrenos mantém-se aberto. Temos expectativas de que apareça alguém para investir ali", responde José Luís Cacho.

Questionado sobre a solução para aquele espaço, o presidente da Câmara de Aveiro refere apenas que ela "está consagrada, nos instrumentos de planeamento, neste caso concreto no Plano de Urbanização do Polis". "A solução está lá", enfatiza, acrescentando que, "entretanto, decorre um período de alteração desse plano e a câmara está a equacionar, dentro dessa alteração e em acordo com o proprietário (a APA), encontrar a melhor solução. Mas tem sempre de se respeitar o que estiver previsto em termos de instrumentos de planeamento".

Má imagem da cidade

Promessas à parte, a imagem da zona da antiga lota continua a ser um triste postal da cidade de Aveiro. O único acesso ao local é uma estrada esburacada e os velhos edifícios que restam da antiga estrutura de apoio à pesca costeira só não estão em piores condições porque há algumas colectividades que ainda se mantêm no local.

É o caso do Clube dos Galitos, que ali tem instalada a sua secção náutica, usada por cerca de 60 atletas do remo, e que já foi alvo de vários actos de vandalismo. "São prejuízos que o clube vai tendo de enfrentar", lamenta António Granjeia, o presidente do clube.

Outra entidade que ali permanece sedeada é a Àvela (Associação Aveirense de Vela de Cruzeiro), proprietária do cais de atracagem, onde estão dezenas de veleiros, que ainda vai dando alguma dignidade à zona. Curiosamente, esta é a única marina da região de Aveiro que permite receber barcos de maior calado - o problema de assoreamento da ria leva a que os outros cais não sejam opção para embarcações de maiores dimensões -, mas o cenário que a envolve em terra está longe de ser o mais desejável. Especialmente se for tido em conta o facto de uma boa parte destes veleiros ser oriunda de portos estrangeiros e transportar turistas, que não descobrirão por aqui nada que os deixe muito bem impressionados em relação a Aveiro.

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