Hélder Postiga, o bom discípulo do checo Antonín Panenka

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Foi necessária uma certa dose de coragem para fazer o que Panenka fez a Sepp Maier Foto: DR

Hélder Postiga nunca viu jogar Antonín Panenka. Em 1982, quando nasceu, o checo estava a chegar ao fim da sua carreira de nove anos na selecção, 59 internacionalizações e 17 golos marcados. Um desses golos foi suficiente para entrar na história, embora ainda tivesse marcado muitos mais de forma semelhante e jogado até aos 44 anos. Postiga deve-o ter estudado no vídeo vezes sem conta e, se por acaso, se tivesse cruzado com Panenka durante o Europeu de 2004, reconhecia-o facilmente pelo farto bigode e o cabelo bem penteado. Não podia ter escolhido melhor forma de o homenagear quando surpreendeu o inglês David James, com o incrível toque “à Panenka”, na decisiva série de penáltis que eliminaram a Inglaterra do Campeonato da Europa, já depois de Beckham e Rui Costa os terem falhado. Sempre que muda de clube, os novos colegas ainda lhe falam nesse golo e há mesmo adversários que lhe lembram a proeza.

Antonín Panenka entrou na órbita da selecção da antiga Checoslováquia em 1973. Não defrontou Portugal nos dois jogos de apuramento para o Campeonato da Europa de 1976 porque não tinha um estatuto de titular garantido. O seleccionador de então, Vaclav Jezek, era um adepto das rotações e alterava frequentemente a base da equipa, mas não o deixou de fora na final do Estádio do Marakaná, do Estrela Vermelha, a 20 de Junho de 1976.

Foi necessária uma certa dose de coragem para fazer o que Panenka fez a Sepp Maier, o famoso guarda-redes da selecção alemã que se apresentou em Belgrado para a final do Campeonato da Europa com os galões de melhor do mundo. Uli Hoeness, esse mesmo que é o actual presidente do Bayern de Munique, tinha falhado o quinto penálti de desempate, atirando para as nuvens, e Panenka assumiu a responsabilidade de sentenciar a final a favor da Checoslováquia, após uma igualdade a dois golos. Executou então o tal toque em jeito para o meio da baliza, depois de esperar que o guarda-redes se atirasse para um dos lados. Gesto muito treinado e estimulado por apostas nos treinos, que vários jogadores imitaram bem, como Zidane, Totti, Pirlo ou Postiga, e outros nem sempre com a habilidade requerida.

Chamaram-lhe, então, “poeta” e até monumento do futebol europeu, mas Pelé disse na altura que só um génio ou um louco é que podia arriscar uma coisa daquelas numa final. Alguns anos mais tarde o checo confessava ao PÚBLICO que os seus colegas lhe pediam para não repetir a graça nos jogos a doer e até o ameaçavam de o mandarem dormir no corredor do hotel.

A Checoslováquia ficou-lhe grata por aquele golo que significou uma vitória importante em plena guerra-fria, mas só aos 31 anos é que o libertou para que pudesse aceitar um bom contrato com o Rapid de Viena. Na Áustria, jogou ao lado de Hans Krankl e, em 1984-85, ainda conseguiu ser o melhor marcador da Taça UEFA, com cinco golos. Os austríacos foram à final com o Everton e perderam por 3-1, mas o checo já não era indiscutível, entrando só no segundo tempo a substituir Weinhofer. Andava, então, pelos 37 anos e as pernas começavam a fraquejar um pouco, muito embora ainda conservasse uma boa técnica e uma certa magia nos pés, que se expressava na marcação dos penáltis e dos livres. Ainda passou mais alguns anos na Áustria, arrumando as botas num modesto clube chamado Kleinwiesendorf.

Antonín Panenka regressou a Praga já com nova designação de capital da República Checa, e verificou que os adeptos dos “cangurus” nunca se tinham esquecido dele. Convidaram-no para presidente do Bohemians, o seu clube de sempre que, por azar seu, acaba de descer à II divisão.

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