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A embrulhada em que Miguel Relvas se enfiou no episódio das secretas e de Silva Carvalho, que entretanto atingiu também pressões sobre uma jornalista deste jornal em termos por esclarecer, mostra mais uma vez uma das debilidades deste governo. Não é, para já, a relação obcecada com a imprensa, embora como se viu na era Sócrates os caminhos tortuosos comecem assim. É um problema mais vasto de faltar ao governo genuíno peso político para além de... Miguel Relvas. Isso não augura nada de bom.

Desde o início que a presença de Relvas no governo gerou controvérsia e surpresa. Marcelo Rebelo de Sousa chamou-lhe "erro de casting". Outras vozes afirmaram que era uma questão de tempo até as consequências sobrarem para Passos Coelho. Mas verdade é que Relvas, tido como o "operacional" de Passos Coelho, entrou mesmo. Mais ainda: foi alçado a ministro de pastas sensíveis. Recebeu os assuntos parlamentares para lidar com a oposição e disciplinar o partido; as autarquias e o poder local para manter o pessoal das câmaras e das freguesias açaimado; a RTP para controlar a informação e acabar com o despesismo; e o futebol, sempre uma zona cinzenta de poder e interesses.

No fundo, quando se pensava que Relvas iria exercer a sua influência de fora - porque os seus "conflitos de interesses" poderiam causar estragos -, aconteceu precisamente o contrário: tornou-se ele o ministro mais político deste governo e, com excepção de Vítor Gaspar, é certamente ele o ministro mais poderoso. De resto, os ministros políticos incluem Gaspar (sempre limitado pelas más notícias que traz), o próprio primeiro-ministro e Paulo Portas que, apesar de tudo, defende a posição do CDS na coligação. Não há mais. O que torna o governo sobretudo dependente de Relvas e do seu destino.

É verdade que Relvas abanou a RTP, embora ainda sem resultados práticos. E o mérito da reforma autárquica que afronta interesses difíceis e já começou a provocar rebeliões no país também lhe pertence. Só que nada disso elimina o facto de que ele é um político demasiado "subterrâneo" para dar ao governo o peso e a autoridade política que este precisa.

Ninguém pode ficar tranquilo por saber que Relvas recebia mensagens abusivas de Silva Carvalho com listas de nomes para as secretas, as quais diz ele que apagava de imediato sem apurar por que obscuro motivo estaria na lista de destinatários. (O regime tem esta faceta sinistra, que por sinal pede uma "vassourada"). E ficamos ainda menos tranquilos por saber que um ministro considera aceitável usar a vida pessoal - se é da vida pessoal que estamos a falar - como retaliação contra um jornalista. (E se não foi por isso que no dia seguinte apresentou desculpas, por que motivo se desculpou?) As contradições de Relvas nesta saga são patentes. A gravidade de tudo exige um pronto esclarecimento.

E, a breve trecho, ou Passos Coelho reforça o governo com quem tenha a experiência e o perfil político necessário, não apenas para suprir o material radioactivo que vem de Miguel Relvas, mas para ultrapassar uma imagem de delegação temporária e tecnocrática de Bruxelas, ou receio que seja este o princípio dos seus problemas.

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