Gomorra foi filmado com autorização da máfia, mas realizador nega subornos

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Matteo Garrone (à esquerda) encontrou-se com chefe da máfia enquanto este se encontrava em prisão domiciliária Fred Dufouri/AFP

Um magistrado deve acreditar num criminoso arrependido, que após anos na máfia passou a colaborar com a lei, ou num prestigiado realizador? É nesse impasse que se encontram os juízes italianos Giovanni Conzo e Cesare Sirignano, num processo que envolve Matteo Garrone. O cineasta é acusado de ter pago a um chefe da máfia para filmar Gomorra.

Oreste Spagnuolo é o mafioso arrependido que agora acusa Matteo Garrone de ter pago 20 mil euros a Alessandro Cirillo, um dos chefes do clã Casalesi e figura de topo da Camorra. O dinheiro pago à máfia napolitana serviu, segundo o testemunho privilegiado de Spagnuolo, para que o realizador pudesse rodar o filme em Nápoles – como o fez –, sem imprevistos.

Garrone admite ter-se encontrado com Cirillo, a pedido de um dos actores – Bernardino Terraciano –, mas nega ter pago qualquer quantia àquele chefe da máfia. O encontro aconteceu em casa de Cirillo, que estava em prisão domiciliária. Garrone diz que não sabia: “Sim, estive na casa de Alessandro Cirillo, mas não sabia que estava em prisão domiciliária. É verdade que tinha uma atitude estranha, parecia da Camorra”.

Cirillo tinha sido detido pouco antes, com outros dois “importantes estrategas” da Camorra – John Letizia e o agora colaboracionista Oreste Spagnuolo. Este último foi quem nomeou o cineasta no processo que está a ser investigado pela Direcção Nacional Antimáfia de Nápoles. Aliás, Spagnuolo diz mesmo que Gomorra não foi o primeiro filme em que Matteo Garrone pagou a Cirillo. O realizador terá ainda pago oito mil euros para rodar L’imbalsamatore, filmado seis anos antes na mesma cidade do sul de Itália.

“Foi a casa de Cirillo, para chegarem a acordo. Mandou-lhe 20 mil euros, um bom presente, e as filmagens correram sobre rodas”, denunciou Spagnuolo. Na resposta, Garrone disse ter visitado Cirillo, que “não estava sozinho e ninguém falou de dinheiro”. O realizador garantiu ainda que todo dinheiro gasto na produção de Gomorra está registado e justificado.

O filme

, premiado em Cannes e vencedor de cinco prémios do Cinema Europeu e mais sete prémios Donatello, debruça-se sobre o crime organizado em Nápoles. É baseado num livro de Roberto Savian, que passou a viver escoltado após a sua publicação, devido às ameaças da máfia. O que pode pôr em causa a versão da história que incrimina Matteo Garrone: afinal, a Camorra ameaça o autor da narrativa e colabora com a adaptação ao cinema?

Notícia corrigida às 22h58

Substituída a fotografia. A anterior era do escritor Roberto Saviano, cujo livro deu origem ao filme


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