Corrupção: médicos ilibados por viagem na Malásia a meio de congresso

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Alguns dos médicos portugueses numa festa a meio do congresso Foto: DR

O Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP) de Lisboa arquivou o inquérito sobre a viagem de 27 médicos portugueses à Malásia para participarem num congresso de ginecologia que incluiu a visita a uma ilha a 700 quilómetros de distância durante os três últimos dias do encontro.

O procurador do DIAP considerou que não estavam “preenchidos todos os elementos típicos” do crime de corrupção passiva, apesar de ter mandado extrair uma certidão para eventuais “efeitos disciplinares”. A visita à ilha a meio do congresso revela-se “eticamente censurável”, comenta.

A história foi divulgada pela estação televisiva TVI em Maio de 2009, depois de um ex-delegado de informação médica do laboratório J. Neves (empresa que patrocinou a ida ao congresso) ter decidido divulgar várias informações sobre a polémica viagem a Kuala Lumpur, onde decorreu o XVIII Congresso de Ginecologia e Obstetrícia, entre 5 e 10 de Novembro de 2006.

Segundo a reportagem, fora o laboratório J. Neves a patrocinar a deslocação ao congresso de um grupo de médicos de família, que teria incluído, além de vistas à capital da Malásia, espectáculos e uma viagem de cinco dias a LangKawi, ilha paradisíaca a cerca de 700 quilómetros. Os médicos foram de avião para a ilha no dia 8 de Novembro, quando ainda faltavam três dias para o congresso terminar. Em LangKawi, vestiram-se de piratas e as imagens do DVD que o laboratório distribuiu como recordação foram exibidas na peça da TVI, para consternação do então bastonário da Ordem dos Médicos (OM), Pedro Nunes, que pediu a abertura de um inquérito à Procuradoria-Geral da República.

Três anos depois, o DIAP decidiu arquivar o inquérito, depois de concluir que “não resulta suficientemente indiciado que os médicos que a aceitaram actuaram com a consciência indevida da vantagem”. O preenchimento do crime de corrupção passiva pressupõe, por outro lado, uma actuação dolosa e isso não ficou provado, porque a análise às prescrições dos médicos não permitiu estabelecer uma relação entre a quantidade de medicamentos do J. Neves receitados após a viagem.

Foi por não haver aparente contrapartida que a Inspecção-Geral das Actividades em Saúde decidiu também arquivar o caso. Resta saber qual vai ser a decisão da Ordem dos Médicos — em 2009 o então bastonário Pedro Nunes afirmou que, se se confirmasse que os médicos tinham ido à ilha pagos pelo J.Neves, iriam ser alvo de processos disciplinares.

Apesar de os responsáveis do laboratório terem voltado a garantir que foram os médicos a custear este programa suplementar, o procurador considera que há indícios de que a parte da viagem e estadia a Langkawi terá sido paga pelo J.Neves, o que “pode traduzir objectivamente a aceitação de uma vantagem que não era devida”.

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