Facilitar entrega da casa ao banco pode criar mais problemas às famílias

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A banca é chamada a ter uma actuação mais preventiva PAULO RICCA

Presidente da APEMIP defende a renegociação dos empréstimos com a banca, porque muitas famílias podem não conseguir arrendar casa a valores razoáveis face à sua condição económica actual

Alterar a legislação para entregar a casa ao banco, anulando a dívida existente, pode criar uma situação explosiva para as famílias e para a economia nacional. Esta é a opinião de Luís Lima, presidente da Associação dos Profissionais e Empresas de Mediação Imobiliária de Portugal (APEMIP), mas também de um alto quadro bancário, com conhecimento profundo do mercado de crédito imobiliário. Ambos defendem outro caminho, o da renegociação dos contratos à habitação no caso das famílias que entraram em situação de dificuldade.

Neste momento, há já duas propostas de lei, do PS e do Bloco de Esquerda, que visam permitir a entrega da casa em dação de pagamento da dívida (entrega do imóvel que anula integralmente o crédito ao banco independentemente do seu valor). O PSD e o CDS estão também a trabalhar sobre esta matéria e o PCP admitiu que também vai avançar com uma proposta no mesmo sentido.

Mas para Luís Lima, a estratégia do Governo no pacote de medidas que está a preparar com o Banco de Portugal deveria ser o de criar condições para que as famílias em dificuldades económicas possam reduzir as prestações do empréstimo.

Luís Lima admite que a divulgação, pela APEMIP, do crescente número de casas entregues aos bancos este ano alertou para a dimensão do problema, assunto que ganhou ainda maior actualidade com sentença inédita de Portalegre (ver caixa).

No primeiro trimestre, foram entregues 2300 imóveis, o que corresponde a 25 casas por dia, um crescimento de 70% face a igual período do ano anterior. Boa parte do aumento ficou a dever-se a entregas feitas por promotores imobiliários, que não conseguem vender os imóveis e suprir as dívidas aos bancos.

Luís Lima defende que, apesar de a banca estar a revelar maior sensibilidade para com as dificuldades das famílias para continuarem a pagar os empréstimos, há medidas que o Governo pode adoptar, nomeadamente "no sentido de responsabilizar os bancos pela identificação atempada das situações críticas". Muitas famílias, para não deixarem de pagar a casa, começam a pedir empréstimos paralelos, até que chegam a uma altura em que a situação já é de falência total. "É preciso prevenir essas situações e a banca tem de ter essa preocupação", refere Luís Lima, que critica a demora no avanço do pacote de medidas que o Governo está a preparar, bem como no atraso da lei do arrendamento.

Luís Lima, que diz estar a receber diariamente dezenas de mensagens por correio electrónico de famílias sobreendividadas, ou em situação de desemprego, a dizerem que vão entregar a casa ao banco, alerta para as dificuldades que muitas vão ter para encontrar habitação para arrendar a preços razoáveis, se optarem por se desfazer do imóvel.

"Estamos a incentivar o que pode ser um problema social e económico grave", porque as pessoas ficam sem casa para viver e os bancos cheios de casas, que vão vender com descontos muito elevados, gerando uma forte desvalorização dos imóveis e arrastando muitos promotores imobiliários para a falência.

Uma fonte da banca, que pediu anonimato, também defendeu que a solução para as famílias sobreendividas deve passar pela renegociação dos contratos, porque garante a permanência na habitação. Este gestor defende que a aprovação de uma lei que permita a dação em larga escala criará um problema para os bancos, mas também para as famílias, pela falta de casa para viver. Uma lei que vá no sentido da solução encontrada em Espanha até pode ser aceite pela banca portuguesa, mas é tão restritiva que abarcará um número ínfimo de famílias.

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