Documentos secretos mostram que Assad coordena repressão dos protestos

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Assad dá o aval final aos planos elaborados por uma célula de gestão da crise Natalia Kolesnikova/AFP

Depois das trocas de emails entre Bashar al-Assad e a mulher, divulgadas na semana passada pelo jornal Guardian, documentos obtidos pela Al-Jazira levantam um pouco mais o véu sobre o envolvimento pessoal do Presidente sírio nos planos para reprimir a contestação e evitar que os protestos alastrem a Damasco e Aleppo, as duas maiores cidades do país.

São centenas de páginas de documentos marcados como confidenciais que a televisão sediada no Qatar diz ter recebido das mãos de Abdel-Majid Barakat, um desertor que até há poucas semanas era responsável pela recolha de informações para uma célula de gestão de crise que trabalha na dependência do Presidente – informações que depois passava a membros da oposição, “dentro e fora da Síria”.

“Todas as semanas, às sete horas da tarde, os chefes de todas as agências de informação e serviços de segurança reúnem-se para analisar o que aconteceu no país durante o dia, para fazer planos e dar ordens para o dia seguinte. Estes planos seguem para o gabinete do Presidente na manhã seguinte e é ele quem assina todas as ordens e dá o aval final”, explicou o correspondente da Al-Jazira na Turquia, para onde Barakat fugiu ao aperceber-se de que a sua ligação à oposição teria sido descoberta.

Com ele levou 1400 documentos – cuja autenticidade a estação árabe diz ter verificado – que revelam dados até agora desconhecidos sobre a estratégia do regime para suprimir os protestos, incluindo o envio de milhares de membros das milícias pró-regime – as temidas “shabiha” – para as ruas de Damasco, Aleppo ou Idlib.

Às sextas-feiras, dia em que as orações semanais dão lugar a grandes protestos contra o regime, o esquema de segurança é ainda mais apertado. Só na capital, adianta um dos documentos, são montados 35 postos de controlo e as estradas que conduzem ao centro são cortadas com frequência para limitar o acesso a locais emblemáticos como a mesquita Omíada, para cujas imediações são destacados cerca de mil membros das forças do regime.

Num briefing em que é visível a assinatura do Presidente, são dadas ordens expressas para condenar a penas de prisão quem participe em manifestações ilegais e noutro relatório há informações sugerindo que o regime espiou a missão de observação enviada pela Liga Árabe ao país.

Ironicamente, os documentos fornecem também dados muito detalhados, recolhidos por membros dos serviços de informação, sobre os protestos que, há mais de um ano, se estendem a grande parte das cidades sírias. Num deles é possível verificar que as manifestações mais numerosas ocorreram na província de Idlib, no Noroeste do país, para onde as tropas de Assad avançaram nos últimos dias com o objectivo de tomar as zonas que tinham sido reclamadas pelos dissidentes do Exército Livre.

“Quem quer que leia estes relatórios ficará chocado, perceberá que a Síria está a viver uma verdadeira crise: assassinatos, criminalidade e supressão dos protestos”, disse Barakat à Al-Jazira, sublinhando, porém, que nem sempre os generais transmitem a Assad a imagem mais fidedigna do que se passa no país. “Eles omitem factos importantes no terreno, apenas para manter elevada a moral do Presidente”.

Os emails divulgados na semana passada pelo Guardian – obtidos por piratas informáticos próximos da oposição que terão conseguido aceder às contas particulares de Bashar al-Assad e da mulher, Asma – revelavam que o casal mantém o seu estilo de vida, aparentemente indiferente à violência que no último ano provocou já mais de oito mil mortos, de acordo com números da ONU. As mensagens mostram ainda que o Presidente e a mulher recebem conselhos e dicas de relações públicas de amigos e consultores no estrangeiro.

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