Martins Sarmento, o fotógrafo que interrogava as pedras

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Estão patentes 70 imagens seleccionadas do espólio de 543 negativos em colódio sobre placa de vidro dr

O arqueólogo foi também um pioneiro da fotografia científica. Uma faceta pouco conhecida agora revelada na Capital Europeia da Cultura

Que um pioneiro da arqueologia em Portugal tenha usado a fotografia nesses anos pioneiros da nova técnica de fixação do real em benefício da sua investigação científica não causará surpresa. Surpresa estará em que um espólio fotográfico com essas características e esse valor histórico permanecesse praticamente escondido, e desconhecido, mais de um século depois.

Foi para alterar essa situação que Eduardo Brito, coordenador do projecto Reimaginar Guimarães, organizou a exposição O Fotógrafo Martins Sarmento, a segunda da série de cinco com que está a desvendar património de grande relevância histórica e cultural, tanto para a cidade este ano Capital Europeia da Cultura como para o país.

Depois de A Cidade da Muralha, a nova exposição é hoje inaugurada no edifício da Sociedade Martins Sarmento (SMS), precisamente a instituição que salvaguarda e divulga a acção daquele que foi a grande referência da arqueologia no Norte de Portugal, e que revelou a verdadeira importância da Citânia de Briteiros, em Guimarães.

A exposição mostra 70 imagens tratadas a partir do espólio de 543 negativos em colódio sobre placa de vidro que estão nos fundos da Sociedade Martins Sarmento. Está organizada em três núcleos temáticos: rostos, suspensões e coisas, mostrando os principais focos de atenção de Francisco Martins Sarmento (1833-1899), que via na fotografia um instrumento de apoio à sua pesquisa arqueológica.

"Estas são imagens muito perguntadoras", diz Eduardo Brito, explicando que o arqueólogo retratava as pedras - as "coisas" -, muitas vezes "em suspensão", ou seja, descontextualizadas do seu lugar, para poder elaborar e documentar as suas teses científicas. "Nota-se nele uma pressa de fotografar, sem qualquer preocupação com a harmonia ou o enquadramento da imagem", diz o comissário, acrescentando que "a grande estratégia de Martins Sarmento é documentar o objecto da sua pesquisa", característica que faz dele, de certo modo, "um pioneiro da fotografia científica em Portugal".

Eduardo Brito lembra, a propósito, a importância das fotografias que Martins Sarmento fez na Citânia de Briteiros para convencer a organização e os participantes no Congresso de Antropologia e Arqueologia Pré-Históricas realizado em Lisboa em 1880 a deslocarem-se ao Norte para observar in loco os testemunhos do povoamento pré-romano do país.

O Fotógrafo Martins Sarmento, que vai ficar em exposição até 8 de Abril, é acompanhada por um livro-catálogo que inclui os Cadernos de Fotografia escritos pelo arqueólogo, além de textos do comissário, do presidente da SMS, António Amaro das Neves, de João Serra, presidente da Fundação Guimarães 2012, e ainda do coordenador da área de Cinema e Audiovisual, João Lopes.

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