Será uma vitória de Pirro?

A avaliação da troika foi positiva, mas cuidado com a festa: meses depois o país está pior do que se previra

O ministro Vítor Gaspar tem uma óbvia legitimidade para se congratular com o sucesso de Portugal na execução do memorando de entendimento da troika: ele acredita piamente na receita da austeridade. Até os que têm dúvidas, seja na oposição ou entre economistas de várias latitudes ideológicas, hão-de ao menos reconhecer a evidência de que é melhor para Portugal ser bem sucedido na aplicação do programa do que estar hoje com os olhos do mundo a reflectirem o seu fracasso. Mas constatar este pequeno sucesso não significa que se acredite na visão de Vítor Gaspar ou na receita da austeridade extrema. Portugal vai registar este ano uma queda mais grave do produto do que se esperava, uma subida mais acentuada do desemprego e, pior ainda, tem pela frente uma árdua tarefa para ganhar competitividade externa. Bem se sabe que o ajustamento que se impõe seria sempre doloroso (Mario Monti diz-nos hoje que não há receitas imediatas para o crescimento), mas também há razões para se suspeitar que as exigências punitivas da troika, em termos de metas e de meios, podem levar Portugal ao beco sem saída. O Governo tem feito neste processo o papel do aluno diligente que nunca falha um TPC e os resultados positivos dessa perseverança, ou dessa humilde obediência, são uma vitória. Mas uma vitória que pode ser uma vitória de Pirro. Ao fim de quase um ano de troika o país está pior do que o previsto e, mais grave ainda, não se vislumbram ao fundo do túnel nem expectativas de crescimento, nem sequer o regresso aos mercados financeiros. Quando se faz bem uma coisa má, não se está a fazer bem. O infortúnio do Governo, o nosso infortúnio, está na singeleza desta verdade.

Além do horror, nada de novo na Síria

Na frente síria nada de novo: a comunidade internacional continua impotente para travar Assad e este, a salvo pela protecção (ou será cumplicidade passiva?) da Rússia e da China, continua a massacrar o seu povo. O embaixador sírio em Genebra abandonou ontem uma reunião onde se discutia a escalada de violações dos direitos humanos dizendo que "a única forma" de ajudar a Síria é abandonarem as "manobras que põem os sírios uns contra os outros". Queria dizer, sem rodeios, que esse direito cabe apenas a um dos lados: o das forças "legítimas" de Assad. As mesmas que têm destruído a cidade de Homs com vagas sucessivas de morteiros, bombas e rockets e que, não contentes com o sucesso de tal campanha, enviaram agora para lá a mais mortífera unidade de elite do Exército sírio, a 4ª divisão blindada. É uma guerra civil, aquela que se trava na Síria, e serão dela vítimas milhares de cidadãos indefesos, enquanto Assad não for travado com medidas mais eficazes. O cenário de Homs é já dantesco. E o que dela sobrar para a história, depois do massacre, pode servir de dedo acusador aos que nada fizeram, mas pouco mais. A França prepara uma resolução sobre Homs, num imenso marasmo diplomático. Mas, para lá do crescente horror quotidiano, não há nada de novo na frente síria.

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