Sócrates terá "contratado" com o ex-director da Lusa cobertura noticiosa para o Governo, acusa José Manuel Fernandes

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José Manuel Fernandes integrou a comissão para o serviço público de televisão

O ex-director do PÚBLICO, José Manuel Fernandes, contou hoje no Parlamento que foi denunciado ao grupo de trabalho sobre serviço público que José Sócrates terá "contratado com o ex-director da Lusa" a alocação de "meios da agência para garantir a cobertura noticiosa das actividades do Governo".

"O ex-primeiro-ministro contratava com o então director da agência de notícias Lusa a cobertura da actividade governativa", afirmou José Manuel Fernandes durante a audição do grupo de trabalho na Comissão de Ética, esta tarde. "E a ERC, na anterior legislatura, encarregou-se de branquear muitas destas coisas", acusou.

"Em audições que realizámos no âmbito do grupo de trabalho ficámos a saber que havia uma relação directa entre o primeiro-ministro e o então director da Lusa [Luís Miguel Viana], e que se traduziu numa estratégia de contratação de meios da agência para acompanhar e garantir a cobertura noticiosa sobre as actividades do Governo no período antes da eleições", afirmou, à saída da audição, quando questionado pelos jornalistas.

Neste assunto, José Sócrates passaria mesmo por cima do ministro da tutela, Augusto Santos Silva, que não desconhecia esta combinação.

Terá havido mesmo uma "estratégia de investimento e recursos no território nacional que, inclusivamente, prejudicou investimentos [da agência] fora do país", acrescentou José Manuel Fernandes que não conseguiu precisar os meios a que se referia. "Não me lembro que meios, se jornalistas ou não; teria que consultar as minhas notas dessas reuniões", justificou. Esta cobertura terá acontecido por altura das eleições de 2009 e nos últimos meses da primeira legislatura socialista, especificou.

Contactado pelo PÚBLICO, o antigo director da Lusa diz que são "afirmações mentirosas, caluniosas e difamatórias". A confirmarem-se, acrescentou, irá "proceder judicialmente" contra José Manuel Fernandes. Luís Miguel Viana disse ainda que o editor de política que contratou "e que editou a campanha eleitoral de 2009" é o actual assessor de Pedro Passos Coelho.

O PÚBLICO contactou o ex-primeiro-ministro, mas José Sócrates não quis fazer comentários.

Na audição perante os deputados, José Manuel Fernandes apontou o programa emitido pela RTP1 na segunda-feira à noite, em directo de Luanda, chamado Angola: o Reencontro, como o "exemplo que comprova a forma como todos os governos acabam por ceder à tentação de meter a sua mãozinha na RTP. E este tipo de situação aconteceu muitas vezes no passado."

O ex-director do PÚBLICO e o crítico de televisão Eduardo Cintra Torres insurgiram-se contra o programa por ser a prova da "ingerência governamental", classificando-o mesmo como uma "vergonha". No programa, emitido no lugar do Prós e Contras, mas igualmente apresentado por Fátima Campos Ferreira, participaram diversas personalidade portuguesas, como os presidentes da PT, Zeinal Bava, da Central de Cervejas, Alberto da Ponte, e da Federação Portuguesa de Futebol, Fernando Gomes, a atleta Rosa Mota e o músico Rui Veloso.

"Gostaria de saber de quem é responsabilidade daquele programa: se da direcção de informação ou de programas. Porque se não é da informação, então em que condições é moderado por uma jornalista, qual é o papel dela no programa, como é que foram garantidos os pressupostos da imparcialidade", questionou José Manuel Fernandes. "Acompanhei o programa na televisão e o debate que se gerou nas redes sociais. Houve momentos em que me senti envergonhado", afirmou.

"Toda a relação com Angola levanta muitas questões que não podem ser branqueadas com um programa de televisão, onde se notou o cuidado para não desagradar ao poder de Luanda", considerou José Manuel Fernandes. "Aquilo ajudou a perceber por que é que nenhum Governo abdica de uma televisão pública. Como nós precisamos de dinheiro - e lá que ele está -, vale tudo. Eu acho que não vale tudo", rematou.

Notícia actualizada às 20h37 e às 23h40

Acrescentadas declarações de Luís Miguel Viana e subtítulo referente ao programa da RTP.


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