O renascimento das formigas super-soldado

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Formiga soldado e super soldado Alex Wild

Os soldados são uma casta comum às formigas, mas super-soldados só existem em algumas espécies do grupo das Pheidole. São exemplares ainda maiores com uma cabeça enorme que tapam os buracos de entrada do formigueiro quando está sob ataque. Os cientistas conseguiram agora, em laboratório, reprogramar super-soldados, através de um tratamento hormonal, em espécies de formigas que já não costumam criar esta casta gigante. Os resultados foram publicados na revista da Science desta sexta-feira.

A descoberta foi fruto do acaso. Ehab Abouheif, biólogo da Universidade McGill, no Canadá, olhou para o chão, no estado de Nova Iorque, e viu soldados anormalmente grandes da espécie Pheidole morrisi. “Ando a recolher estes indivíduos há 15 anos. Um dia, olhei para uma colónia selvagem e vi que havia soldados monstruosos”, disse o biólogo líder do estudo, citado num artigo noticioso da Nature. “Têm mandíbulas maiores, se apanham os dedos dói mesmo.”

O género Pheidole tem mais de 1000 espécies, mas só oito é que têm super-soldados. O seu desenvolvimento faz parte das opções normais que uma larva de formiga tem no início da sua vida. Mas estas opções são determinadas pelo ambiente.

Se até um primeiro momento a larva receber uma certa hormona, fornecida pelas formigas trabalhadoras, ela irá transformar-se numa rainha – maior do que o normal e com asas. Se não receber, a larva pode desenvolver-se numa trabalhadora, uma "dona de casa" que também vai buscar alimentos, ou numa formiga soldado, que luta pela protecção do formigueiro.

A hipótese fica em aberto até um segundo momento. Se receber uma nova quantidade de hormona, então transforma-se num soldado, se não receber, passa a trabalhadora. Nas oito espécies que têm super-soldados, a larva precisa de receber uma dose extra de hormona neste segundo momento para se desenvolver nas gigantes. Nas outras, isto normalmente não acontece.

Depois de Abouheif ter visto as super-soldados Pheidole morrisi na natureza resolveu experimentar dar a dose a mais de hormona no laboratório, nas larvas desta espécie, utilizando uma substância química similar. O biólogo obteve super-soldados. Experimentou o mesmo noutras espécies do mesmo género, que “naturalmente” não desenvolvem esta casta gigante, e produziu o mesmo resultado.

Evolução em marcha

“Por isso quando se trata qualquer espécie a uma dada altura do desenvolvimento, só com esta hormona, pode-se induzir o desenvolvimento de um super-soldado”, explicou o cientista, citado pela BBC News. A descoberta fez a equipa pensar sobre a evolução deste género de formigas, e comparou a história evolutiva entre onze espécies. “O facto de se induzir em todas estas diferentes espécies [que não têm esta casta naturalmente], significa que um antepassado comum de todas elas tinha [super-soldados].”

Ao longo da evolução, algumas espécies foram perdendo a capacidade natural de desenvolver a casta, e outras foram ganhando esta capacidade, mostrando que o potencial genético estava lá. As oito espécies com super-soldados vivem no Sul dos Estados Unidos e no Norte do México. Uma região onde há formigas guerreiras, muito violentas, que atacam os formigueiros. As cabeças dos super-soldados tapam os buracos do formigueiro e protegem-no destas formigas.

Mas existem espécies do género Pheidole que não desenvolvem esta casta especial apesar de também viverem com o mesmo perigo iminente das formigas guerreiras. Optaram por fugir dos formigueiros e não voltaram a desenvolver a casta super-soldado.

Em Nova Iorque, a espécie que Ehab Abouheif estuda não precisa de temer as formigas guerreiras, que não atingem aquelas latitudes. Por isso, a casta de super-soldados é aparentemente desnecessária. Ou não? Abouheif acredita que, de vez em quando, a natureza deixa algumas delas desenvolverem-se: “Estes potenciais antigos estão bloqueados, e as mutações libertam-nos em frequências baixas. Eles estão lá para a selecção natural tomar conta.”

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