Jacques Chirac, ex-Presidente de França, condenado a pena suspensa de prisão

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A condenação mancha uma carreira de mais de quatro décadas BENOIT TESSIER/Reuters

Tribunal concluiu que, no início dos anos 1990, quando liderava a Câmara de Paris, contratou funcionários para prepararem a sua eleição

O que nunca antes se vira aconteceu. Um antigo Presidente de França, Jacques Chirac, foi ontem condenado a dois anos de prisão com pena suspensa, por ter contratado colaboradores para prepararem a sua eleição para a chefia do Estado, quando dirigia o município de Paris.

Chirac, que em 2007 deixou o Palácio do Eliseu, foi condenado por "desvio de fundos públicos", "abuso de confiança" e benefício ilegal da criação de 19 empregos "totalmente ou parcialmente fictícios", pagos pela câmara entre 1990 e 1995.

Ausente da leitura da sentença, como de todo o julgamento, devido a problemas neurológicos "severos" e "irreversíveis", Chirac, 79 anos, recebeu a condenação "com serenidade", segundo Jean Veil, um dos seus advogados, citado pela AFP. "Está satisfeito por, pelo menos, o tribunal ter reconhecido que não houve enriquecimento pessoal", acrescentou. Num comunicado divulgado ao princípio da noite, o ex-Presidente anunciou que não recorre, apesar de "contestar categoricamente o julgamento".

Eleito em 1995, Jacques Chirac sempre se declarou inocente das acusações, que se reportam ao período que antecedeu a sua chegada à presidência, numa altura em que liderava o RPR, partido antecessor da UMP, do actual Presidente, Nicolas Sarkozy.

A condenação mancha uma carreira de mais de quatro décadas, como admitiu Georges Kiejman, um dos advogados de defesa, quando se dirigiu ao tribunal. "O vosso julgamento será a última imagem de Jacques Chirac", disse, segundo a AFP.

Jerome Karsenti, advogado de uma associação anticorrupção, considerou a sentença "histórica e exemplar". "Foi enviada uma mensagem muito forte: os políticos não podem fazer o que lhes apetece, quando estão a desempenhar funções públicas", afirmou, segundo a Reuters.

O ex-Presidente, protegido por imunidade durante o tempo em que liderou a França, incorria numa pena de dez anos de prisão e no pagamento de 150 mil euros de multa. Sete dos nove outros arguidos, um dos quais um ex-chefe de gabinete de Chirac, foram condenados a penas suspensas entre dois e quatro meses de prisão.

O caso dos empregos fantasmas inclui dois processos. Um, instruído em Paris, sobre 21 contratações "sem qualquer função atribuída", outro, em Nanterre, nos arredores, sobre sete. Um dos condenados num anterior julgamento, em 2004, quando Chirac ainda era Presidente, foi Alain Juppé, antigo primeiro-ministro e actual ministro dos Negócios Estrangeiros, à época dos factos secretário-geral do RPR e adjunto para as finanças na câmara de Paris. Foi condenado a 14 meses de prisão com pena suspensa e a um ano de inelegibilidade.

Os advogados de Chirac negaram que existisse um "sistema" organizado e defenderam que os contratados, que custaram 1,4 milhões de euros ao município, eram úteis aos cidadãos. Procuraram também demonstrar que o então presidente da câmara não estava ao corrente dos abusos.

Sarkozy divulgou um comunicado em que diz não lhe competir comentar uma decisão da Justiça e sublinha o "envolvimento constante de Jacques Chirac ao serviço da França, o que lhe valeu e vale ainda a estima dos franceses". Na opinião de François Hollande, candidato socialista às presidenciais do próximo ano, "fez-se justiça e ela deve ser feita para que não se instale um sentimento de impunidade" .

É o primeiro Presidente francês condenado desde o caso do marechal Henri Philippe Pétain, mas as situações são claramente diferentes. Pétain, que chefiou o regime de Vichy na II Guerra Mundial, foi condenado à morte por colaboração com o ocupante nazi, sentença comutada em prisão perpétua.

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