Caso das facturas do Instituto do Desporto leva Tribunal de Contas a avançar com auditoria

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As facturas não orçamentadas são, em parte, relativas a obras no Jamor Pedro Cunha

As revelações públicas acerca das graves irregularidades nas contas do Instituto do Desporto de Portugal (IDP) vão suscitar, nos próximos dias, uma auditoria do Tribunal de Contas (TC) ao organismo que executa a política desportiva do Governo, segundo o PÚBLICO apurou.

Em apreciação estarão as acusações públicas dos novos responsáveis da tutela, que, após um inquérito interno, confirmaram a existência de 635 facturas, no valor global de 6,061 milhões de euros não registados na contabilidade pública.

Estas queixas são ainda reforçadas pelos últimos dois relatórios do revisor oficial de contas (ROC) do IDP, que, face às irregularidades encontradas, não aprovou as contas deste organismo relativas a 2009 e 2010, numa decisão pouco usual, senão inédita, ao nível dos institutos públicos. Entre a confirmação de falta de cabimentação de despesa e o não cumprimento de obrigações fiscais, como a entrega de IVA ao Estado, os documentos do ROC são particularmente incisivos em relação à gestão de Luís Bettencourt Sardinha, presidente do IDP desde Julho de 2005, e poderão servir igualmente de referência à auditoria do TC (a terceira ao IDP nos últimos dez anos).

O caso ganhou dimensão pública a 23 de Agosto, quando o ministro adjunto dos Assuntos Parlamentares, Miguel Relvas, surpreendeu a Comissão Parlamentar da Educação, Ciência e Cultura da Assembleia da República (AR) exibindo dossiers onde garantiu estarem guardadas inúmeras facturas não contabilizadas pelo IDP no valor de 6,7 milhões de euros (valor revisto depois para 6,061 milhões), encontradas "numa sala" do organismo.

Um dos surpreendidos no Parlamento foi o deputado Laurentino Dias, ex-secretário de Estado da Juventude e Desporto (SEJD), que tutelava o instituto no período em questão. "Não admito nem aceito nem acredito que isso seja assim", afirmou no mesmo dia. Também Luís Sardinha negou a existência de quaisquer facturas sem o devido cabimento: "Quero referir de uma forma clara que não há facturas nem dívidas escondidas no IDP." Declarações desmentidas dias depois pelos serviços do próprio IDP, em comunicado, e pelo SEJD, Alexandre Mestre, em declarações na AR, após a conclusão de uma auditoria interna.

"Todos os dias são recebidos no IDP, pessoalmente, por telefone e por email, contactos de dezenas de fornecedores que reclamam o pagamento de facturas e bens fornecidos", anunciou o instituto a 5 de Setembro, quantificando um "universo total de 687 facturas [posteriormente reduzido para 635]" ausentes do "sistema contabilístico". Dados reforçados por Alexandre Mestre 15 dias depois, na AR, onde prometeu remeter para o Tribunal de Contas, inspector-geral de Finanças, Procuradoria-Geral da República e Direcção-Geral do Orçamento os resultados dos inquéritos internos entretanto abertos no IDP, agora presidido por Augusto Baganha.

Sardinha explica-se

Contactado pelo PÚBLICO, Luís Sardinha voltou a negar a existência de "facturas escondidas" ou "não cabimentadas", mas admitiu a existência de facturas por liquidar, que poderão perfazer parte dos valores revelados pelos novos responsáveis: "Das facturas referidas, presumo que algumas sejam anteriores a 2009 e 2010. Elas existem, mas estavam dentro do sistema de funcionamento do IDP. Estavam a ser tratadas, embora ainda não estivessem liquidadas."

E não foram pagas, segundo explicou, por não se ter concretizado um dos financiamentos previstos para o IDP, "no quadro de uma candidatura a fundos do QREN" (Quadro de Referência Estratégico Nacional). "O Governo anterior tomou uma iniciativa global para permitir uma candidatura a esses fundos à qual o IDP concorreu. Iria aproveitar essas verbas para pagar as obras executadas no [Complexo Desportivo] do Jamor, que representam a grande fatia da quantia em dívida, ainda que não a totalidade". Inicialmente, estas verbas destinadas às obras "estavam devidamente cabimentadas", mas, face à possibilidade de surgirem novos fundos, provenientes do QREN, "que rondariam os quatro a cinco milhões de euros", o presidente do IDP optou por fazer "outra gestão financeira" com o orçamento do instituto [79,5 milhões, em 2010].

Uma justificação rejeitada pelos actuais responsáveis do IDP, para quem "dificilmente" as facturas em causa poderiam ser integradas no QREN, "uma vez que a Região de Lisboa e Vale do Tejo está fora da regra de convergência", além de não ter sido apresentada "nenhuma candidatura" do IDP. Sardinha discorda e garante ter referido a importância de uma candidatura ao QREN aos novos responsáveis do IDP e da SEDJ, em Agosto.

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