Grécia volta a pôr a zona euro à beira do caos

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Maioria da população grega está contra o plano de resgate nelson garrido

Decisão de Papandreou de submeter a referendo o acordo dos países do euro sobre o plano contra a crise surpreendeu e irritou os parceiros

Menos de uma semana depois de os seus líderes terem conseguido a muito custo acordar uma nova estratégia para resolver a crise da dívida da Grécia, a zona euro voltou a mergulhar na tormenta em resultado da intenção anunciada de surpresa pelo primeiro-ministro grego de submeter o acordo a referendo.

O anúncio, feito na segunda-feira à noite por Georgios Papandreou, caiu que nem uma bomba nas restantes capitais europeias, semeando a confusão e a perplexidade sobre o sentido de uma opção que põe seriamente em risco o plano de salvamento do seu próprio país da bancarrota. "O anúncio surpreendeu toda a Europa", reconheceu Nicolas Sarkozy, Presidente francês.

Depois de terem falado ao telefone, ao princípio da tarde, Sarkozy e Angela Merkel, chanceler alemã, convocaram Papandreou para uma reunião de emergência hoje à noite em Cannes, onde decorrerá a partir de amanhã a cimeira do G20 (os países mais ricos e as principais economias emergentes) dedicada, em grande parte, precisamente, à resolução da crise do euro.

Paris quer nomeadamente assegurar junto de Papandreou que o referendo se realizará o mais depressa possível, de preferência ainda em Dezembro, e não no início de Janeiro, como Atenas deixou entender, para encurtar ao máximo o período de incerteza e instabilidade.

Os dois líderes insistiram em que o plano contra a crise que foi aprovado na cimeira de líderes da zona euro de 26 e 27 de Outubro - e que inclui um novo programa de ajuda a Atenas no valor de 100 mil milhões de euros, a par de uma redução de 50% da sua dívida detida por credores privados, um plano de recapitalização dos bancos europeus e o reforço do fundo europeu de estabilidade (FEEF) para prevenir o contágio da crise à Itália e Espanha - constitui "a única via possível para resolver o problema da dívida grega".

"A França e a Alemanha estão determinadas a assegurar com os parceiros europeus a plena aplicação, o mais depressa possível, das decisões adoptadas pela cimeira, que são hoje mais do que nunca necessárias", afirmaram os dois líderes em comunicado.

Definir um "roteiro"

A reunião de hoje com Papandreou será precedida de um encontro de Merkel e Sarkozy com Christine Lagarde, directora-geral do FMI, a par de Herman Van Rompuy, Durão Barroso e Jean-Claude Juncker, presidentes do Conselho Europeu, da Comissão Europeia e do eurogrupo, para, segundo Sarkozy, examinar as condições para a concretização do acordo de 27 de Outubro e definir um "roteiro" para o efeito.

De acordo com as sondagens citadas pelas agências noticiosas, a maioria da população grega está contra o plano de resgate devido à continuação da cura de austeridade que o acompanha e, sobretudo, ao que é visto como a colocação do país sob a tutela da zona euro.

O grande receio dos países do euro é que o compasso de espera até ao referendo se transforme num período de grande instabilidade entre os investidores que impeça a concretização do plano anticrise, deixando de novo a zona euro desarmada face aos ataques dos especuladores.

A grande dúvida que preocupa as diplomacias em Bruxelas é saber que motivação terão agora os bancos credores de Atenas para avançar com a redução de 50% do valor dos seus títulos da dívida grega com que se comprometeram há uma semana. Do mesmo modo, não é seguro que a zona euro tenha agora a credibilidade suficiente para convencer países como a China ou o Brasil a investir no FEEF de modo a permitir, através de um efeito de alavanca, aumentar os seus meios financeiros para proteger a Itália da especulação.

As dúvidas que voltaram a pairar sobre a zona euro provocaram aliás a queda a pique das bolsas europeias e o disparo dos juros da dívida dos países mais frágeis, a começar pela Itália. A agência de notação financeira Fitch avisou, por seu lado, que um eventual resultado negativo no referendo grego "aumenta a o risco de um incumprimento forçado" da dívida, e de uma saída forçada do país da moeda europeia, com "graves consequências para a estabilidade financeira e a viabilidade da zona euro".

A irritação dos governos europeus é tanto maior quanto, segundo Yves Leterme, primeiro-ministro belga, "Papandreou não falou [de referendo] nem antes, nem durante, nem depois da cimeira" da semana passada. Pelo contrário, o chefe do Governo grego saudou o acordo concluído já na madrugada de dia 27 depois de longas semanas de negociações, ao afirmar que permitiria ao país "virar a página" da crise da dívida e iniciar "uma nova era".

Paulo Portas, ministro português dos Negócios Estrangeiros, exprimiu em Caracas a sua "apreensão" pela situação criada, frisando, segundo a Lusa, que "no preciso momento em que a Europa mais precisa de sinais de confiança, obviamente este é um factor de insegurança e de imprevisibilidade".

"Não é uma boa decisão para a Europa (...) nem para a Espanha", afirmou, por seu lado, o porta-voz do Governo de Madrid.

Jean-Claude Juncker frisou, por seu lado, que uma eventual recusa do plano pelos gregos aumenta o risco de falência do país. Atenas receberá nos próximos dias uma nova parcela já aprovada pelos países do euro do seu primeiro programa de ajuda, no valor de 8 mil milhões de euros, que lhe permitirá assegurar os pagamentos até ao início de Janeiro. Se o resultado do referendo da consulta for negativo, o país ficará a partir daí sem dinheiro, entrando em bancarrota. O cenário mais provável, neste cenário, é que tenha de sair do euro.

Por essa mesma razão, Alexander Stubb, ministro finlandês dos Negócios Estrangeiros, afirmou que "o referendo não vai tornar as coisas mais fáceis, porque se transformará num referendo sobre a permanência da Grécia na zona euro".

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