Iulia Timochenko jura lutar contra sentença de prisão "politicamente motivada"

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A polícia antimotim controlou milhares de apoiantes e opositores de Iulia REUTERS

A condenação da antiga primeira-ministra, musa da "revolução laranja", foi criticada pela União Europeia e declarada um risco sério para as ambições de integração europeia de Kiev

"Vergonha!" gritou-se nas bancadas do tribunal que ontem, em Kiev, condenou a antiga primeira-ministra ucraniana Iulia Timochenko a sete anos de prisão pelo crime de abuso de poder num negócio de gás com a Rússia. A própria arguida mal deu hipótese ao juiz para pronunciar a pena, bradando que lutará "até ao último fôlego" para defender o seu "bom nome" contra um veredicto que diz ser "politicamente motivado".

"Temos que defender a Ucrânia deste autoritarismo", instou, incitando ainda mais os ruidosos protestos dos seus apoiantes, que se acotovelavam com uma centena de jornalistas na pequena sala do tribunal. No exterior, a polícia antimotim controlava uma multidão de milhares de pessoas, entre apoiantes e opositores de Timochenko, não tendo sido registadas mais do que pequenas escaramuças e algumas detenções.

A antiga chefe de Governo, em detenção desde 5 de Agosto por "desrespeito ao tribunal", começara por dar pouca atenção ao juiz, mantendo os olhos no seu iPad e conversando com a filha, Evgenia Carr, na primeira fase da leitura da sentença. Mas tudo mudou quando o juiz passou a descrever a pena: sete anos de prisão, indemnização no valor de 1,5 mil milhões de hrivnas (quase 137 milhões de euros) pelas perdas infligidas ao Estado e ainda a interdição de desempenhar cargos políticos nos próximos três anos - o que a deixa fora das eleições legislativas de 2012.

"Este caso criminal foi fabricado e mostra apenas a fraqueza do poder. [O Presidente, Victor] Ianukovitch regressou a 1937", sustentou Timochenko, de 50 anos, numa alusão às purgas de José Estaline - ainda no intervalo da audiência, depois de o juiz Rodion Kireiev, de 31 anos, a ter declarado "criminalmente responsável por ter excedido os poderes", mas antes de dar aval ao pedido de pena feito pelos procuradores no julgamento, iniciado a 24 de Junho passado.

Mais longe da UE

Timochenko, afastada do poder com a vitória do arqui-rival pró-russo Ianukovitch nas eleições presidenciais de Fevereiro de 2010, garantiu que vai contestar este veredicto no Tribunal Europeu dos Direitos Humanos.

A antiga primeira-ministra mantém que o julgamento não é mais do que uma "vingança" com o objectivo de a afastar da vida política no país. Iulia permanece muito popular mesmo se com um percurso sempre marcado pela polémica desde que - ao lado do ex-chefe de Estado Victor Iuschenko - tirou das mãos de Ianukovitch a sua primeira tentativa "fraudulenta" de ser eleito Presidente, com a "revolução laranja" de 2004. Curiosamente, o antigo aliado foi, neste julgamento, uma das principais testemunhas de acusação.

A sentença foi acolhida com fortes críticas pela União Europeia, tendo a chefe da diplomacia dos Vinte e Sete, Catherine Ashton, avisado que a mesma poderá "ter profundas consequências no diálogo político e de cooperação", pondo em risco a ratificação de acordos de associação política e comércio com a UE, previstos para serem assinados numa cimeira bilateral agendada para Dezembro.

Ianukovitch veio tentar já pôr alguma água na fervura e, mesmo admitindo que "este é um caso lamentável que impede a integração europeia da Ucrânia", sublinhou que a sentença ontem pronunciada "não é definitiva", uma vez que poderá ainda avançar para recurso - sugerindo mesmo uma passagem do processo para um tribunal administrativo e não criminal, como chegou a ser proposto por diplomatas europeus.

Fazendo soar um outro sino, o primeiro-ministro russo, Vladimir Putin, reagiu à penalização de Timochenko - com a qual, de resto, negociou o acordo de preços de gás visado no julgamento -, afirmando que tal "é perigoso e contraproducente". Os EUA declararam-se "profundamente decepcionados" com o veredicto.

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