CGD com buraco de 300 milhões de euros nos créditos concedidos a Joe Berardo

Foto
Colecção de arte foi usada como garantia por Joe Berardo pedro cunha

Dinheiro foi concedido ao investidor para reforçar posição na estrutura accionista do BCP, o que lhe garantiu um papel fundamental na luta pelo poder dentro da instituição financeira

A Caixa Geral de Depósitos (CGD) registou um "buraco" da ordem dos 300 milhões de euros resultante dos financiamentos dados à fundação de Joe Berardo e a empresas ligadas ao investidor. A informação consta dos dossiers enviados pelo grupo liderado por Faria de Oliveira ao Banco de Portugal - que articula os trabalhos de inspecção à banca portuguesa determinados pela troika -, à PricewaterhouseCoopers(PwC) - empresa a quem foi confiada a missão - e ao Governo.

O PÚBLICO apurou que o presidente da Comissão de Remunerações e Previdências do Banco Comercial Português (BCP) deve, actualmente, cerca de 360 milhões de euros à CGD. De acordo com os documentos, o valor em risco (imparidade) era, na semana passada, de aproximadamente 300 milhões de euros. Isto, porque as garantias reais entregues por Berardo à CGD estavam avaliadas, então, em apenas cerca de 60 milhões. Na sua maioria, estão em causa títulos do BCP, adquiridos a crédito, e que esta semana têm estado a ser negociados na bolsa de Lisboa perto dos vinte cêntimos cada.

Fonte ligada a Joe Berardo contestou os dados avançados pelo PÚBLICO, referindo que essa não era a informação que possuía. Acrescentou, ainda, que o comendador reforçou recentemente as garantias para os níveis exigidos.

Os empréstimos foram contraídos por Joe Berardo junto do grupo público quando este era liderado por Carlos Santos Ferreira (actual presidente do BCP). A 14 de Julho de 2006, Berardo contratou com a CGD um crédito de 50 milhões de euros, para compra de 58,2 milhões de acções do BCP, a vencer a cinco anos em regime de bullet (empréstimo-bala), ou seja, a pagar no final do prazo, que terminou a 14 de Julho de 2011.

No ano seguinte, em Maio de 2007, o investidor acordou, no mesmo regime, um novo financiamento, este de 350 milhões de euros, a vencer em Maio de 2012, repartido em duas tranches. O valor total do crédito negociado nos dois anos perfazia 400 milhões, novamente para compra de acções do BCP. Actualmente, o departamento de recuperação de crédito da CGD, à semelhança do que está a fazer com outros devedores, tem mantido contactos com o investidor para encontrar uma solução.

Os financiamentos dados pela CGD permitiram a Berardo reforçar a sua posição accionista no BCP, e ser uma voz activa na luta de poder pelo controlo da instituição fundada por Jardim Gonçalves. Este processo culminou no afastamento dos gestores fiéis ao ex-presidente e na nomeação, no início de 2008, de Carlos Santos Ferreira para liderar o BCP. Na troca de lugares, Santos Ferreira fez-se acompanhar do seu vice-presidente na CGD, Armando Vara, que se manteve como número dois. No âmbito da alteração de gestão, Berardo foi eleito pelos outros accionistas para assumir as funções de presidente da Comissão de Remunerações e Previdência. Hoje, Berardo possui 4,23% do capital do BCP, directa e indirectamente, através da Metalgest SGPS, da Bacalhoa, da Kendon Properties, da Contrancer e da Fundação José Berardo.

A situação de Berardo, que é considerada na CGD como preocupante, tendo em que conta que as garantias reais continuam a desvalorizar-se, está reflectida de modo detalhado nos dossiers entregues pelo grupo público aos técnicos e auditores que, no contexto do acordo com a troika, estão a avaliar os balanços das maiores instituições bancárias nacionais.

O BdP solicitou aos bancos que lhe entregassem dossiers individuais com informação detalhada sobre cada um dos 50 maiores clientes. No caso da CGD, é a PwC que está a auditar as contas, em conjunto com os técnicos do BdP. As conclusões serão entregues à troika até meados de Novembro.

O dossier respeitante a Berardo está também na tutela que, através da secretária de Estado das Finanças, Maria Albuquerque, e do ministro das Finanças, Vítor Gaspar, tem estado a seguir a par a passo a actuação do grupo liderado por Faria de Oliveira. Nesta fase, as competências estratégicas da gestão da CGD estão concentradas nas mãos de Gaspar. No total, Berardo deve à banca portuguesa, mais de mil milhões de euros: 400 milhões ao BCP e mais de 250 milhões ao BES.

Em 2009, para reforçar as garantias colaterais, alvo de desvalorização, Joe Berardo renegociou os contratos de financiamento com a CGD, o BCP e o BES. As três instituições aceitaram prolongar o prazo de pagamento do empréstimo e tomaram como garantia 75% da colecção de arte (que está no CCB), avaliada em 316 milhões de euros. Mas caso entendam executar a garantia, os bancos dificilmente o poderão fazer, pois o Estado tem a opção de compra da colecção que terá de exercer até 2016.

Para além de Berardo, também a relação financeira de Manuel Fino, dono da Soares da Costa, com a CGD está a preocupar a tutela. Os financiamentos da CGD a M.F. foram também garantidos por acções. A situação é, ainda assim, considerada pela CGD menos preocupante, pois Fino está protegido pelo acordo celebrado com o banco público e que envolveu uma operação com títulos da Cimpor. Fino tem a possibilidade de, até Fevereiro de 2012, exercer a opção de recompra de 9,6% da Cimpor à CGD. Caso não o faça, as acções da Cimpor passarão definitivamente para o grupo estatal.

Sugerir correcção