Portugal diverge da periferia e assume oposição à criação das eurobonds

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Passos Coelho e Angela Merkel: sintonia nas TOBIAS SCHWARZ/REUTERS

Declarações em vários sentidos de diversos membros do Governo nas últimas semanas

O Governo português é contra as eurobonds. Esta é a posição oficial, garantiu ontem ao PÚBLICO Rui Baptista, assessor do primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho: "A posição oficial do Governo é a que o primeiro-ministro disse ontem [quinta-feira]."

Com esta declaração ficou desmentida a eventual divergência dentro do Governo em relação à adopção de eurobonds, divergências essas que ficaram indiciadas na diversidade de opiniões sobre o assunto por parte de membros do Governo e mesmo em declarações do próprio Passos Coelho.

A primeira vez que esta posição oficial do Governo português sobre as eurobonds foi assumida foi nas declarações do primeiro-ministro em Berlim, na quinta-feira de manhã, ao lado da chanceler alemã, Angela Merkel, apoiando a rejeição pública das eurobonds que esta fez.

Depois do encontro a dois, em que o assunto começou por ser levantado pelo primeiro-ministro, Angela Merkel reafirmou, frente aos jornalistas, a sua oposição às eurobonds, considerando que é "uma via errada pensar-se que se pode acabar com as dívidas, colocando-as todas no mesmo tacho".

Na sequência desta afirmação, Passos Coelho declarou: "Acompanho em grande medida aquilo que disse a senhora Merkel. Não podemos olhar para um princípio de obrigações europeias como uma forma de resolvermos os problemas, que temos agora, de excesso de dívida."

Ontem, na comissão parlamentar de Orçamento, Finanças e Administração Pública, o ministro das Finanças, Vitor Gaspar, justificou esta posição oficial com a eventual perda de soberania que as eurobonds podem representar: "Discutir obrigações independentemente das implicações políticas não é fácil. São uma transferência de soberania, que é um assunto central para as competências desta Assembleia da República: decidir impostos, aprovar despesas."

Esta posição oficial diverge daquilo que o próprio Passos Coelho declarou em Lisboa, a 13 de Julho, sobre o assunto, quando considerou: "Já se falou de várias hipóteses no passado, nomeadamente das chamadas eurobonds e de outras soluções. Não quero estar a particularizar nesta altura, porque para que elas sejam credíveis e tenham força precisam de resultar de um concerto europeu, e esse concerto europeu só pode ser obtido ao nível do Conselho."

A imagem de divergência surge também em relação ao que o ministro dos Negócios Estrangeiros, Paulo Portas, disse na comissão parlamentar de Negócios Estrangeiros, na audição de dia 25 de Agosto: "[As eurobonds] são, a nosso ver, uma ideia interessante e importante, e a concretização das obrigações europeias, evidentemente, só pode ser feita no quadro de um aprofundamento da integração europeia e pode e deve ajudar a resolver a actual crise das dívidas soberanas." Portas, questionado ontem perante este aparente desencontro de ideias com o primeiro-ministro, reformulou as suas declarações sobre a matéria. "Eu, como português, obviamente estou interessado na ideia das eurobonds. Admito que, se fosse alemão, teria algumas dúvidas. Como somos todos europeus, temos de fazer todos um esforço", afirmou, explicando que esse esforço "não se faz sem maior integração política".

Excepção entre periféricos

As posições assumidas nos últimos dois dias pelos membros do Governo português são, assim, em tudo semelhantes às do executivo alemão. Angela Merkel tem defendido, precisamente, que a criação de um instrumento que permitisse emissões conjuntas de obrigações na zona euro apenas pode avançar no momento em que houver uma maior integração política, ou seja, no momento em que a política orçamental fosse definida de forma mais centralizada, com perda de soberania dos Estados-membros.

Do outro lado da barricada, ou seja, dos que defendem as eurobonds, têm estado todos os outros países que, tal como Portugal, têm sentido dificuldades crescentes no acesso ao financiamento nos mercados internacionais através das suas emissões de obrigações de tesouro.

Na Grécia, Irlanda, Espanha e Itália, os líderes políticos têm manifestado o seu apoio a uma medida que muitos defendem ser o último instrumento disponível para evitar um contágio da crise da dívida a grandes economias da periferia e, em última análise, uma desintegração do euro. O Governo espanhol tem estado, nesta questão, particularmente activo, assumindo desde o primeiro dia a defesa da criação das eurobonds.

Além disso, tanto a Comissão Europeia, liderada por Durão Barroso, como o presidente do eurogrupo, Jean-Claude Juncker, têm revelado simpatia pela ideia, embora sempre mantendo alguma prudência nas declarações. Bruxelas já anunciou que irá, em breve, apresentar uma proposta sobre a matéria. Para que tenha alguma hipótese de ser aceite pela Alemanha, ela será limitada ao financiamento de projectos específicos.

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