Caldeirão africano

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Cheikh Lô

Hoje é dia de mbalax: depois de Sines, Cheikh Lô mostra em Lisboa com quantas músicas se constrói uma canção

Não há muitos países com a riqueza musical do Senegal. Parece que suga tudo à volta e incorpora com igual facilidade tradições cubanas e congolesas, jazz, reggae e música griot. Ao facto não será alheia a habitual classificação de Dakar como "uma Marselha tropical", uma cidade portuária especialmente propensa ao cruzamento de culturas. Quando surgiu em 1970, a Orchestra Baobab representava essas viagens das notas para trás e para a frente por mar (via Atlântico) e por terra (com importação do highlife nigeriano ou da música guineense). O mbalax, centrado inicialmente na figura de Youssou N'Dour, destronaria depois a música de dança com pendor latino da Baobab e tornar-se-ia a música do povo, mais dada ao pop/rock, mas não deixando de convocar a mesma miríade de referências.

A partir de meados dos anos 90, Cheikh Lô tornou-se também uma figura de proa, em contra-corrente relativamente a uma nova geração que começava a adicionar cada vez mais elementos de hip-hop à fórmula do mbalax. Lô é homem mais apaixonado pelas guitarras acústicas do que pelas caixas de ritmos, é homem de se embrulhar na filosofia sufi e nas mornas cabo-verdianas, recusando as tentativas apressadas de tornar a música senegalesa mais parecida com a produção anglo-saxónica. Antes tinha tocado com músicos marfinenses, mas foi com o seu disco de estreia, "Ne La Thiass", de 1996, produzido por Youssou N'Dour, que ganhou notoriedade. "Ne La Thiass" não demoraria a alcançar o estatuto de clássico da música africana, ao mesmo tempo que se foi tornando um ingrato motivo de comparação para a parca discografia que Lô foi construindo desde então. "Jamm", editado no ano passado, conseguiu finalmente rivalizar com "Ne La Thiass" e devolveu Cheikh à primeira linha do circuito da world music. O músico toca pela segunda vez em Portugal no espaço de três semanas, depois de ter passeado os seus longos "dreadlocks" pelo Festival Músicas do Mundo, em Sines. Daqui por mais uns dias, a 19, actua no festival Maré de Agosto, na ilha de Santa Maria, Açores.

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