Por que está a bandeira amarela? O que é o levante?

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O levante pode parar a faina, mas também promete mais captura Foto: Melanie Map"s/Reuters

Desde terça-feira que faz sueste (vento de sudeste) na costa sul algarvia, situação que poderá manter-se até ao início do fim-de-semana. E isso nota-se na temperatura ambiente mais elevada, particularmente naquela região, mas que poderá correr o país todo. Trata-se do levante, fenómeno meteorológico vulgar no Algarve, que pode ocorrer uma ou duas vezes por mês, mas desconhecido dos banhistas de passagem.

Sobram lamentos pela súbita agitação marítima, o suficiente para serem chamados à atenção pelos nadadores-salvadores, quando se desrespeita a bandeira amarela. E não respeitar a indicação de "pode-se tomar banho, não se pode nadar" vale uma coima.

Diz o adágio popular que "de Espanha nem bom vento, nem bom casamento". Deixando de lado a segunda premissa, a primeira pode ser enganosa. Mas depende do ponto de vista. Aquele vento de levante corre de leste na região do estreito de Gibraltar e ganha velocidade quando apertado pelas placas continentais europeia e africana, afectando as águas mediterrânicas. Pode atingir valores entre os 60 e 70 km/h, mas quando dobra a região de Cádis perde intensidade, chegando a Portugal já na orientação sudeste, calmo, ou moderado, mas quente, trazendo consigo a agitação marítima, que em mar aberto pode provocar ondulação até três metros. Aqui, sim, um problema para a actividade piscatória profissional. E para os apreciadores de peixe, pois em casos extremos rareia o pescado, o que faz disparar o preço em banca.

Por outro lado, a temperatura da água sobe, podendo assim manter-se vários dias, mesmo depois de aquela voltar à sua habitual quietude. Ontem, segundo os dados do Instituto de Meteorologia, a estação da ilha de Faro registava 22,1 graus na água do mar. Não é difícil estes valores subirem até aos 25 graus. Também o Instituto Hidrográfico da Marinha portuguesa avalia estes e outros parâmetros das águas costeiras. De acordo com os dados que disponibiliza ao público, a bóia ondógrafo (que recolhe aquelas informações) colocada ao largo de Faro mediu ontem 1,51 metros de altura média da ondulação. A altura máxima chegou aos 2,53 metros, com a direcção de SE (sudeste) e temperatura da água (naquele local) de 20,6 graus.

As comunidades piscatórias pressentem-no e preparam-se. O alerta é a subida de temperatura e uma neblina salobra que dá outra coloração ao céu. E há um cheiro a mar na faixa costeira em zona urbana. João Paguado, mestre da embarcação Sãozinha Machado, de Santa Luzia, Tavira, que tal como as outras ali sedeadas se dedica à apanha do polvo - Santa Luzia é onde mais polvo se pesca no país, se bem que agora ele seja um bem escasso -, não foi ontem ao mar. "Está levante e aproveitamos para fazer uma limpeza à embarcação, pois sexta-feira [amanhã] vem aí a vistoria de higiene", diz.

Mais alimentos

Um dos tripulantes do Sãozinha Machado avalia que o actual levante "ainda não está forte, e uns foram [ao mar], outros não": "Amanhã [hoje] deverá estar pior. E isso pode ser um problema, pois ondulação forte é sinónimo de embarcação parada e por consequência menos uma oportunidade para sustentar a família." Mas o fenómeno - que para os pescadores algarvios faz parte da vida, como o sal da água - também é bom para a pesca: "Não é só a água que aquece que traz peixe, são os fundos que ficam revolvidos com a ondulação." Ou seja, fundos revolvidos libertam alimentos para a vida marinha, algas e plâncton.

Morre em S. Vicente

Também os pescadores lúdicos cheiram o levante e aguçam o apetite para a captura. Artur Cardoso vai para a barra de Tavira, onde na zona de abrigo do esporão de poente se costuma formar uma boa onda para surfar. A Polícia Marítima não gosta que se juntem ali os pescadores, pois os novelos de linha de pesca perdida podem constituir perigo para a navegação que atravessa a barra. "É robalos, ao corrico, e sargos, de bom tamanho. Sueste é bom para este peixe." O mesmo se passa ao longo de toda a costa. A ondulação do levante não poupa ninguém, embora os seus efeitos vão perdendo intensidade a partir das ilhas-barreira de Faro, chegando quase desvanecido a Lagos, para morrer à passagem do Cabo de S. Vicente.

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