Os mundos por cordas de Leonor Antunes no Rainha Sofia

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Exposição de Leonor Antunes inaugura na sexta-feira em Madrid DR

"Anda por aí. Olha por aqui" - avisa Leonor Antunes (n. Lisboa, 1972) no título da exposição que amanhã se inaugura no Museu Rainha Sofia, em Madrid.

A artista portuguesa radicada em Berlim desde 2005 foi convidada a participar no projecto Fissuras, lançado há já algum tempo pelo museu de arte contemporânea da capital espanhola. Deram-lhe duas salas de grandes dimensões, que ela preencheu com uma instalação formada por seis esculturas e um filme em 16mm intitulado O trajecto da corda.

A corda é, de resto - segundo o guião descrito ao P2 pela própria Leonor Antunes ao telefone -, o fio condutor entre as duas salas, criando uma teia sobre um chão de cortiça, latão e borracha, sobre o qual estão uma peça de cerâmica, uma escultura em cabedal, um biombo...

"Quis pegar na corda por causa da ideia que ela nos traz de linha construtora de espaços, de mundos, moldados conforme as situações", explica Leonor Antunes. A artista recorreu ao filme experimental inacabado Whitch"s Cradle (1943), de Maya Deren (1917-1961), realizadora norte-americana nascida em Kiev, que nele trabalhou com a "corda" de Marcel Duchamp e a actriz Pajorita Matta. O filme foi rodado em Nova Iorque num cenário efémero criado pelo arquitecto Frederick Kiesler para a colecção de arte de Peggy Guggenheim. Foi esta "estrutura efémera, e a ideia de espaço reconstruído" que interessou a Leonor Antunes, que se inspirou também noutra estrutura arquitectónica: o pavilhão dos arquitectos Corrales e Molezún para a representação de Espanha na Exposição Internacional de Bruxelas de 1958. No final, o pavilhão foi trasladado para a Casa de Campo de Madrid, onde agora é apenas uma ruína...

Regresso aos anos 50

"Interessaram-me esses trabalhos e essas experiências dos anos 1950, altura em que nasceu o projecto de um museu de arte contemporânea em Madrid", que viria a dar origem ao Rainha Sofia, diz Leonor Antunes, a justificar o recurso àqueles dois casos. Contou também a ideia de transitoriedade e de adaptação aos lugares, uma marca da obra da artista que em 2001 venceu o Prémio EDP-Novos Artistas.

"As intervenções escultóricas de Leonor Antunes constroem o seu significado a partir da sua densa materialidade, sem remeter para um conteúdo simbólico concreto, transformando os lugares em que são instaladas e tornando visíveis as tensões e energias que contêm", diz o Museu Rainha Sofia na apresentação da exposição.

Leonor Antunes chega agora, com a sua primeira exposição individual em Madrid, a um "templo" da arte contemporânea europeia, e que lhe proporcionou "condições que até agora não tinha conseguido em nenhum outro lugar".

Em Julho, com inauguração no dia 15 (até 2 de Outubro), a artista regressa à Casa de Serralves, onde em 2001 participou na colectiva Squatters. Desta vez, com Casa, modo de usar, comissariada por Núria Enguita, foi chamada a ocupar a antiga casa do Conde de Vizela e a capela. Vai fazê-lo com uma série de trabalhos realizados desde 2004 e outros concebidos especificamente para esse lugar. "O trabalho de Leonor Antunes sempre reflectiu a premissa de que o espectador deve experienciar o trabalho numa relação de interacção com o lugar onde a obra é apresentada", escreve Núria Enguita sobre a exposição em Serralves, lembrando "a herança da arte minimalista e conceptual das décadas de 1960-70", visíveis na sua obra.

Também o Museu Rainha Sofia põe a tónica no vínculo que a arte de Leonor Antunes mantém com figuras como Marcel Duchamp, John Cage ou Rodney Graham: "Ela auto-impõe-se uma série de regras metodológicas muito estritas, que, paradoxalmente, lhe permitem trabalhar com um alto grau de liberdade e incorporar nas suas esculturas o acaso e o arbitrário."

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