O senhor K em todo o lado

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O sucesso da exposição do espólio de Kubrick na Cinemateca Francesa, as novas edições do seu trabalho em livros e o relançamento dos filmes entregam, de novo, o universo de um realizador único a espectadores e seguidores

A tremenda pesquisa que Stanley Kubrick encetava para cada um dos seus projectos era acompanhada por uma organização paralela de todo o trabalho de produção. A partir da sua propriedade em Londres, base de criação dos filmes, este "perfeito general" dispunha de uma equipa de amigos espalhada pelo mundo que se dispunha a responder à sua ânsia de preparação, assim como em tarefas de pesquisa histórica e técnica que alimentavam o resultado visual das suas obras.

Com o passar dos anos, o arquivo de Kubrick organizou-se segundo regras especiais de categorização, fruto de um fascínio pessoal pelo mundo dos arquivos. Após a sua morte em 1999, o trabalho de manutenção foi tendo em conta a possibilidade de vir a apresentá-lo ao mundo - forma, também, de dar a conhecimento uma face mais visível de um artista extremamente protector do seu trabalho e vida pessoal. Assim, Christiane Kubrick, sua mulher, e Jan Harlan, irmão desta e produtor executivo, gerem o "Stanley Kubrick Estate", património que recolhe os objectos usados em todas as etapas dos seus filmes, desde a papéis de pesquisa como adereços, câmaras, lentes, vestuário e outros elementos.

É este o percurso que se apresenta, até 31 de Julho, na Cinemateca Francesa, exposição que já passou por Frankfurt, Berlim, Zurique, Gent, Roma e Melbourne. Em Paris, "a exposição juntou mais de 50 mil visitantes nas 6 primeiras semanas", diz-nos Jan Harlan. Resultado da curiosidade que Kubrick sempre motivou através dos seus filmes, obras que ultrapassavam a própria forma cinematográfica e sensibilizavam espectadores por um olhar sobre a natureza humana nos seus vários contextos.

Mas para além da presença de objectos técnicos e artefactos, o valor da exposição estará também na revelação de um dos processos criativos mais fascinantes do cinema. Assim, por documentos escritos e corrigidos por Kubrick e inúmeras fotografias, revela-se a presença de um criador em cada detalhe de um filme e em todos os trabalhos paralelos à sua realização. Como descrito pelo produtor e realizador Roger Avary, "o grande valor da exposição está em ver o quão obsessivo Kubrick era com a ideia de criação, mas também em mostrar toda a qualidade humana e humor do seu processo." São tantos os momentos de descontracção como os de planeamento cuidado, mostrando, afinal, que Kubrick não procurava mais que o prazer de se cultivar e criar através dos seus filmes com o talento de outras pessoas.

Do mesmo modo, é dada uma atenção especial aos projectos não-realizados de Kubrick: "Napoleão" (com a presença de um móvel com fichas correspondentes a cada dia da vida do imperador francês, o "general perfeito"), "Aryan Papers" e "A.I. Inteligência Artificial", mostrando que nem tudo na carreira do realizador correu como esperado [ver texto]. Uma atenção que tem sido acompanhada pela edição da Taschen de rigorosos livros sobre os seus filmes e projectos: "The Stanley Kubrick Archives" e "Stanley Kubrick's 'Napoleon': The Greatest Movie Never Made", este último um impressionante objecto com toda a documentação feita (fotografias, guiões e notas de produção) para a concretização da sua rodagem. Em Portugal, está ainda agendado, pela Lusomundo, o lançamento da sua filmografia em Blu-ray: este mês, teremos "Barry Lyndon" e "Lolita", com possibilidades de uma edição especial de "Laranja Mecânica", trinta anos depois da sua realização. F.V.

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