Mulheres após um ataque de nervos

O nome do colombiano Rodrigo García (filho de Gabriel García Márquez) pouco ou nada dirá aos cinéfilos portugueses - das suas quatro longas anteriores, só o atípico "Passageiros" (2008) chegou às salas - mas os amadores de séries televisiva recordarão o seu nome dos genéricos de "Sete Palmos de Terra" ou "Terapia", para as quais dirigiu e escreveu episódios. Essa herança televisiva, somada ao nome do polémico cineasta mexicano Alejandro González Iñarritú na produção, poderá fazer temer de "Mães e Filhas", se não o pior, pelo menos algo de desagradável. Mas é filme que se afadiga a subverter quaisquer expectativas de modo inteligente, que trabalha o mosaico narrativo à la "Magnolia" ou "Amor Cão" a um ritmo singularmente desacelerado e sem preocupação de resolver as pontas soltas, resultando daí um melodrama clássico contado de modo seco, com uma atenção especial aos silêncios.

García cruza três histórias de mulheres em Los Angeles à volta da adopção: uma mãe solteirona (Annette Bening) que vive atormentada pela filha que teve menor e deu para adopção; uma advogada de sucesso (Naomi Watts) que a sua condição de filha adoptiva endureceu até uma determinação maníaca; e uma jovem profissional (Kerry Washington) incapaz de ter filhos que decide adoptar um bebé. Em rigor, o filme aguentar-se-ia melhor sem esta última história, a mais esquemática das três; e apesar de García as fazer confluir no final, o modo como elas passam o filme a fazer tangentes umas às outras de modo quase intangível é bem mais interessante.

Evitando as armadilhas lacrimejantes, García deixa às actrizes o tempo e o espaço para construirem as personagens e, sobretudo, para nos fazer compreender as escolhas e as razões de mulheres que estão longe de serem imediatamente simpáticas. Nenhuma delas é mais espantosa do que Annette Bening, que volta a confirmar como é uma das maiores e mais injustamente ignoradas actrizes americanas contemporâneas.

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