A verdade de Mónica Calle, por inteiroA geração do meio

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Mónica Calle, 44 anos, estreou ontem a primeira parte de um tríptico de monólogos que a faz regressar a um autor de eleição, Heiner Müller. Mas o que esta encenadora nos mostra é um modo singular (e solitário) de experimentar o teatro sem o artifício da distância. Um absoluto caso de estudo, e também de espanto. ?Tiago Bartolomeu CostaA geração de Mónica Calle foi a primeira do pós-25 de Abril a afirmar-se como modelo alternativo às companhias que surgiram na década de 70 e entretanto se institucionalizaram, e nisso abriu caminho para quem veio a seguir. O que queriam e o sítio a que chegaram são dois países diferentes.

"O que de pior acontece de momento é que só há tempo ou velocidade ou passagem do tempo, mas não há espaço. É preciso criar espaços e ocupá-los, contra esta aceleração".

É sempre daqui que a nova criação de Mónica Calle parte, desta frase de Heiner Müller. É sempre a ela que regressa. Agora, outra e mais uma vez. Não será a última: "Anúncio de Morte" é um tríptico de solos, construídos a partir da reescrita de textos do dramaturgo alemão, para apresentar até Junho: desde ontem, e até 3 de Abril, há "Álbum de Família" (a partir de "A Máquina-Hamlet"), de 28 de Abril a 8 de Maio, "Sete espelhos no quarto de dormir" (a partir de "Descrição de um quadro"), e de 26 de Maio a 5 de Junho, "O passeio das raparigas mortas" (a partir de "Anúncio de Morte"), interpretados respectivamente por Tiago Vieira, Ana Ribeiro e Rute Cardoso. Com eles Mónica Calle, 44 anos, volta a escrever nas paredes da sua Casa Conveniente, ao Cais do Sodré, em Lisboa, as razões pelas quais faz o que faz e que dão corpo à singularidade (outra maneira de dizer solidão) do seu teatro.

"Tem tudo a ver com a memória", diz, para falar de um teatro feito de espaços afectivos, como este no Cais do Sodré onde trabalha, antigo bar transformado em teatro, que, de tão físicos, se converteram num discurso artístico singular, isolado, solitário, onde importa "compreender a palpitação, compreender cada golpe, não de um modo racional mas intuitivo". Sobreviver.

Mónica Calle fez disso um modo de defender o seu teatro. Saída do Conservatório, figurou no Teatro da Cornucópia, em "As Três Irmãs", mas não era bem isso que procurava. A geração a que pertencia queria criar o seu próprio espaço (ver caixa) fora do pequeno "establishment" do teatro português, e com o tempo Calle transformou-se num caso raro, de coerência e longevidade. Um caso de estudo. Ao longo dos anos, o que foi procurando, sem concessões, com uma exigência rara, foi um modo de fazer teatro que, naquele contexto de finais da década de 80 e princípios da de 90, lá fora ia sendo chamado de pós-dramático, pelo modo como se relacionava com o que ia encontrando pela frente. Em nome próprio, foi assinando trabalhos que, a partir de textos teatrais ou de romances, representavam uma pesquisa atenta à relação do actor com o espaço, do texto com a leitura, do encenador que dá com o espectador que pede. Com o tempo, o seu teatro foi deixando de ser marginal e tornou-se uma referência fundamental para definir o potencial da cena nacional (distinguido em 2010 pela Associação Portuguesa de Críticos de Teatro).

Dizer, agora, que Mónica Calle criou o seu próprio espaço é, mais do que constatar que de facto inventou um teatro que fosse seu no Cais do Sodré, chamar a atenção para o facto de ter tido que abrir caminho. Procurar um espaço - "tenho a necessidade de me sentir livre no modo como faço o meu trabalho" -, e construi-lo num sítio que não devia ser um teatro mas é, permitiu-lhe chegar a este lugar de exposição crua do corpo, do texto, do olhar, da voz, da presença.

"Há coisas que eu sei que não quero, nas quais não acredito. Há outras que são construídas. Pode não parecer, mas sou muito rigorosa no cuidado com a luz, na qualidade do que é dito, no desenho cenográfico", diz-nos no fim de um ensaio que é só mais um, porque depois da estreia de ontem o "trabalho vai continuar, não faz sentido fechar-se". "Às vezes os actores dizem que não percebem, ou levam mais tempo a perceber do que estou a falar. E eu reconheço alguma dificuldade em explicar o que pretendo", diz. "Nestes últimos três anos, tenho feito muitos "workshops" que são espectáculos, e onde trabalho tarde e noite. É um modelo que me deixa muito feliz e imensamente livre. Os actores que trabalham comigo, e que quando chegam, na sua maioria, não me conhecem, depressa compreendem que tem de haver uma disponibilidade grande. É um investimento imediato aquele no qual se mergulha. Para todos. E é uma troca constante. Eu dou-te, tu dás, o texto dá, o espaço dá. Todos os que vão passando por aqui, numa rede de cumplicidades, vão fazendo de tudo. É tudo muito concreto e, por isso, todos sentem que a coisa lhes pertence. Que é um bocadinho delas". Elas também não são quaisquer umas: "As pessoas que me vão interessando são as que me lançam e me levam a sítios diferentes."

Será também assim agora. Os espectáculos de Mónica Calle não são só de Mónica Calle. "Há uma verdade que não é necessariamente minha, é de quem lá está". E este estar lá tanto pode ser quem está a interpretar como quem está a ver. "O modo como constróis o texto, como o trabalhas, relaciona-se com o lugar onde o espectador se senta, o espaço que o envolve, o sítio para onde vai", explica. "Eu tenho de defender o que faço, e encontrar um sentido nisso quando, porque não posso fazer como quero, preciso de encontrar outras formas de fazer. Onde chego é muito mais importante [do que onde queria ir], porque me obriga a pensar mais nas coisas. Eu trabalho sobre textos para descobrir o que me dizem", continua.

O texto é real

É também por isso que este tríptico agora em cena é um regresso a "A Missão": o espectáculo que, em 2004, Calle estreou no antigo Bar Lusitano, que então reabria como nova Casa Conveniente, e que vai refazer, agora sozinha e por inteiro, no final do ano. Exactamente como há sete anos, mas agora com outras paredes por construir, outro entulho no chão, outros baldes de água, outras sacas de cimento e outros restos de cadeiras. Mas porque a memória é fundamental no trabalho da encenadora, ainda que este espectáculo seja outro é como se estivéssemos perante as mesmas paredes, o mesmo entulho, os mesmos baldes, as mesmas sacas de cimento e os mesmos restos de cadeiras. No mesmo chão.

O seu chão, a Casa Conveniente, fica numa artéria escura do Cais do Sodré, a Rua Nova do Carvalho, ao lado de outros tantos bares, de outros tantos espaços, tão ou mais teatrais do que este onde ela resiste a fazer teatro. Já é a segunda Casa Conveniente. Antes houve uma, à qual foi buscar o nome, duas ruas abaixo, na Rua dos Remolares: uma loja de utensílios de pesca transformada em albergue para uma actriz que, há 19 anos, abriu as portas e foi insultada por todos os que passavam e achavam que aquela mulher que dizia poemas de Rimbaud a noite toda era só mais uma puta, só mais uma "Virgem Doida". Foi a primeira peça, repetida noite fora, como estes solos agora serão, todos os dias até à meia-noite. Como se a história se pudesse repetir mas fosse uma história nova, porque se pode ouvir novamente.

O teatro dela, afinal, é sobretudo uma questão de presença. A do espectador, claro, a do actor, evidentemente, mas também a do texto. "Os textos têm que ser um prazer para quem faz e diz. Os do Heiner Müller são uma prenda para os actores. Ele está sempre a citar-se. A compreensão do que se diz tem de ser intuitiva, não pode ser intelectual. O actor não se pode instalar no que está a dizer. Tem de estar presente, tem de ser activo". Tem de reagir, em suma, porque "o texto existe fisicamente, está ali". E esteve, de facto, fisicamente, por diversas vezes. Em "Três Irmãs - Que importância é que isto têm?" (2002) ou "Manifesto" (2009), eram os textos, de Tchékhov num caso, e uma compilação de escritos políticos noutro, que apareciam. Nos exercícios que levaram a composições a partir de "O Ginjal" ou "Esta Noite Improvisa-se", o texto nunca saía da frente dos espectadores. E, invariavelmente, aos espectadores era pedido que acompanhassem na leitura. Como se isso nos permitisse voltar a acreditar no teatro enquanto ritual colectivo em permanente construção.

"O texto é, para mim, algo de muito real, muito concreto. É algo vivo. Os autores existem como se eu os conhecesse, não são figuras distantes de mim. Por trás daqueles textos há um autor, que é alguém que me importa que esteja presente", explica, indo ao encontro de frase de Heiner Müller frequentemente citada: "Há sempre mais mortos do que vivos".

O texto, diz Calle, dialoga com ela. E isso pode levá-la, e levou-a, a ter de encontrar modos de leitura que fossem conscientes das condições em que seriam encenados. Os autores vão de Stig Dagerman ("Jogos da Noite", 1993, "A loucura da normalidade", 2002), a Walter Benjamin ("Rua de Sentido Único", 2001), passando por António Lobo Antunes ("Crónicas", 1997) e Luís Fonseca ("Os dias que nos dão", 1999) ou Peter Handke ("Luz/Interior", 2004, menção honrosa da Associação Portuguesa de Críticos de Teatro em 2005).

Os clássicos, se os quisermos insultar dessa forma, são - em vez de foram - uma constante no percurso de Calle: Heiner Müller ("A Missão" (2004)), Thomas Bernhard ("Comédia ou a Força do Hábito", 2008 e "Minetti ou Um Retrato do Artista Quando Jovem", 2009), Anton Tchékhov ("Três Irmãs - Que importância é que isto tem?", 2002, "A Última Ceia ou sobre O Cerejal", 2007, "O Ginjal ou o sonho das cerejas", 2010), Luigi Pirandello ("Esta Noite Improvisa-se", 2010), Samuel Beckett ("Um dia virá", 2003, "Variação sobre "A Última Gravação de Krapp"", 2007) e August Strindberg ("Menina Júlia", 1993, "Inferno", 2010) foram feitos e refeitos porque "nunca houve condições", diz. "Levei 18 anos a fazer "O Ginjal" por inteiro, sem ter de inventar formas nem estratégias para o fazer", conta. Foi no ano passado, em co-produção com diversos teatros municipais. "Não correu bem", assume. Como não tinha corrido bem "Julietas - Cartas fragmentárias a um amor perdido", que apresentou na Culturgest em 2005, e, por isso, decidiu parar.

"Houve alturas em que não aguentei, em que não consegui". E nessas alturas, parou. Para perceber no que tinha falhado.

Voltar atrás

Quando voltou, em 2007, fez um surpreendente Krapp. E quando voltou outra vez, no Inverno de 2010, fez um extraordinário "Inferno". E agora que não tem uma terceira peça consecutiva numa grande instituição - mas sendo a Casa Conveniente não menos do que uma instituição que ela se dedica a reinventar -, faz este tríptico, de regresso à base. "Percebi que havia ali toda uma máquina que implicava com o que queria fazer. Uma máquina muito grande", diz. Não que alguma vez tenha ambicionado trabalhar o resto da vida com lâmpadas embrulhadas em papel couché, iodines que se fundem, roupas velhas, baldes cheios de água, inundações em cima das estreias, cabos eléctricos à vista, cadeiras puídas, sacos de cimento em vez de adereços iguais aos outros. Mas é isso que vamos encontrando. E agora, mais uma vez. Novamente a memória a fazer as vezes do discurso artístico, que faz as vezes das condições: "Os elementos usados vão surgindo ao longo do processo. Volto a alguns deles, tal como volto atrás nos textos. Pudesse eu e estava três anos a fazer "O Ginjal", a investigar, a aprender com o texto. Muitas destas coisas, como o gesto criativo, têm a ver com as limitações, com o que há à volta, e com o que vais elaborando à volta disso".

Uma vez mais, tal como Müller, que usa e reusa os mesmos textos, as mesmas palavras, reescrevendo os sentidos, ou escarafunchando. "São sempre espectáculos muito compensadores. São espectáculos de uma liberdade imensa. Mas não há nenhum mérito, nem nenhum heroísmo nessa resistência. Agora que vou envelhecendo, olho para trás e percebo melhor porque é que algumas coisas são como são, ou foram como foram. Consigo perceber o que me levou a determinado sítio, porque é que fiz aquilo daquela maneira, percebo o lugar de cada coisa. Mas nada é linear nem estruturado", sublinha.

A sua relação com as instituições é alias, paradigmática de um modelo de procura permanente que não se adequa às grandes máquinas. Quando fez "Os paraísos do caminho vazio", em 1998, a primeira das três peças que montou com a Culturgest, teve de sair para o anfiteatro ao ar livre para poder respirar. Em 2003 levou para o Centro Cultural de Belém "Um dia Virá", a partir de "À Espera de Godot", de Beckett, mas foi como carta de despedida à ex-Casa Conveniente que o espectáculo melhor resultou, ali, naquele cubículo na esquina da Rua dos Remolares, apropriadamente chamando-lhe "Esquina de uma rua". Tal como tinha acontecido um ano antes com "O Bar da Meia-noite", a partir de Fiama Hasse Pais Brandão, onde a mesa onde os espectadores se sentavam era tanto um espelho para o que se imaginava passar-se nos quartos das pensões que rodeavam a Casa Conveniente, como o reverso do que, nos quartos, se imaginava passar-se ali, naquele teatro de esquina.

Aquilo que Mónica Calle procura é o próprio lugar do discurso artístico: "Que lugar é o da palavra, que lugar é o da arte, que lugar têm na vida. Que lugar é este que se procura? É uma coisa gradual. Precisa de um tempo de maturação, esta relação entre o interior e o exterior. O tempo real e o tempo do teatro, e a consciência da simultaneidade destes dois tempos são das coisas mais importantes. Eles coexistem sempre, em paralelo, o tempo real e o tempo fora do tempos".

Ver agenda de espectáculos na pág. 37"Diz-se imensas vezes em relação à minha geração que éramos muito giros quando começámos, mas que agora, coitados, estamos péssimos e acabados. Que somos muito auto-complacentes". A frase não é de hoje, mas de 2006, e foi dita por Lúcia Sigalho, encenadora e actriz, à revista "Sinais de Cena". Descrita em 2003 num artigo do britânico "The Guardian" como "uma persuasiva contestatária cujo estilo anárquico de teatro físico parece brotar naturalmente da sua personalidade exuberante", Sigalho é (foi?), com Mónica Calle, "um dos pilares gémeos do ressurgimento do teatro português dos anos 90", dizia ainda o mesmo artigo.

Sigalho está, desde há uns anos, afastada do teatro, ela que foi, efectivamente, um dos rostos mais afirmativos da segunda geração do teatro independente português. Não é caso único. "Achei que íamos aguentar todos", diz Calle. "Sinto uma enorme tristeza porque fico com a sensação de que a minha geração desapareceu, por variadíssimas razões".

"De uma forma hipócrita, até, a geração anterior tinha muito a ideia de colectivo: o indivíduo não contava, nem havia estrelas", analisa Diogo Infante. Hoje à frente do Teatro Nacional D. Maria II como director artístico, Infante diz que "olhava para as instituições com alguma desconfiança porque todas elas pareciam muito inacessíveis". Ainda se lembra de ter dito numa entrevista, a propósito da atribuição de subsídios a novos criadores: "Novo sou eu e a mim ninguém me dá nada". Na altura, Lúcia Sigalho dizia o mesmo: "Quando comecei a fazer teatro, vi uma geração inteira a bater com a cabeça nas portas e ninguém entrava". "Nós reclamámos um espaço primordial. Queríamos ser vinculadores de um qualquer movimento que nos aproximasse do público, com o qual agora temos uma relação privilegiada. É um público que cresceu connosco", continua Infante.

Ao contrário da dança, que em 1991 é exposta à montra internacional da Europália e aí se vê organizada e transformada num movimento (a "Nova Dança Portuguesa"), o novo teatro português nunca foi bem um fenómeno colectivo.

Cristina Carvalhal, actriz e encenadora que esteve na formação da Escola de Mulheres, é bem disso o exemplo: "Nunca tive uma estratégia, nem nunca ambicionei fazer uma companhia. Queria sobretudo ser actriz". Com o aparecimento das televisões privadas, que necessitavam de actores para os seus projectos, foi "tendo oportunidade de poder escolher o que queria fazer no teatro, sobrevivendo através de trabalhos de actriz na televisão". Foi no meio disso que foi encenando: "Quando enceno é mais solitário, são impulsos aos quais respondo, meus ou de outros". Infante partilha a ideia: "Não consigo definir uma linha que seja claramente a minha. Sou volátil e imprevisível. Sou-o porque gosto de ser assim".

Mas há, ainda assim, uma geração. Uma geração que, para Miguel Seabra, actor, encenador e director do Teatro Meridional, este ano distinguido com o Prémio Novas Realidades Teatrais Europeias, reagiu e trilhou um caminho pulverizado, vários caminhos. O Meridional constituiu-se como companhia nómada, com ramos em Portugal, Espanha e Itália, e é, com o Teatro da Garagem, que Carlos J. Pessoa fundou, parte do mesmo contexto de que saíram companhias como as de Calle, Sigalho (Sensurround), João Garcia Miguel (Olho) e Luís Castro (Karnart), só para falar de Lisboa. As diferenças são a característica maior desta geração, defende Diogo Infante: "Há uma linha ténue que nos divide, mas estamos unidos na mesma paixão e no mesmo compromisso. Os nossos objectivos é que são distintos".

Por isso, falar de correntes, de discursos comuns ou de famílias é, para os entrevistados, algo estranho. Sigalho dizia mesmo: "Não me sinto em corrente nenhuma. Sei que, às vezes, o trabalho que faço lança pistas que depois são aproveitadas, anos depois, num outro sítio".

O que caracteriza o teatro português é aquilo que os artistas portugueses conseguem fazer individualmente", diz João Garcia Miguel. Mas Luís Castro acha que falta fazer justiça ao trabalho desenvolvido pela sua geração: "Há uma transição que não foi feita entre as companhias institucionalizadas com subsídios muito altos e outras que já provaram, ao fim de 10 e 15 anos de trabalho, o que valem". O encenador não hesita em apontar o dedo às condições estruturais, que estão na origem da fragilidade da evolução dos discursos artísticos. "A legislação que suporta a cultura é frágil. Os apoios deviam ser mais abrangentes".

Os problemas, contrapõe João Garcia Miguel, também estão na classe: "O tecido artístico é até bastante ingrato para com o país onde vive e ingrato para si próprio. Considero que a maior parte dos criadores portugueses tem pouca noção da sua importância em termos de exemplo. A classe dos agentes culturais é bastante piegas e constantemente autofágica", defende. O fim da companhia que dirigiu, o Olho, marco fundamental na renovação do discurso teatral português no fim do século XX, explica-o assim: "Não tivemos engenho suficiente para conciliar os nossos sonhos com a realidade e a solução foi adormecê-lo. Ainda bem que temos a facilidade de esquecer porque, se não tivermos, o peso do passado será incomensurável".

Ainda assim, a geração de Calle, Sigalho e Garcia Miguel conquistou um território: "A minha geração foi a primeira que se preocupou com aquilo que era importante para a criação de um corpo do teatro português, que nos foi negado pelo peso das companhias que nos precediam". E tem, como as anteriores e as que seguiram, um futuro pela frente: "Aquilo que fazemos nunca é o mais importante de tudo. O mais importante é o que ainda vamos fazer. Não posso dizer que não tenha tido momentos e sensação de perda agudos. Mas acho que o importante é perceber que faz parte de uma existência, em que há coisas que se perdem para se ganhar outras", resume o encenador. T.B.C.

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