Demissão de Sócrates pode fechar semana de risco político

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Parlamento MIGUEL MANSO

Votação do PEC, Cimeira Europeia, tensão, tentativas de negociação. Uma catadupa de factos e emoções marcam uma semana louca. Que pode acabar com o fim do Governo

Portugal gerido por um Governo demissionário, sem plano de contenção do défice e de controlo da dívida soberana e à espera que o Presidente da República convoque eleições. Este pode ser o retrato do país no fim da semana louca que hoje começa, na qual se sucederá em ritmo diário uma série de acontecimentos que potenciam o agravamento da crise política que se tem vivido.

É impossível prever o que vai ser o resultado da catadupa de acontecimentos dos próximos dias, assim como é difícil adivinhar-se, de facto, se a evolução da situação política interna terminará com a demissão prometida pelo primeiro-ministro.

Ainda ontem à noite, o ministro da Presidência, Pedro Silva Pereira, no final do Conselho de Ministros Extraodinário, advertiu para a "crise perigosissíma" e insistiu que o Governo está "inteiramente disponível para negociar" (ver texto ao lado).

Das posições públicas, porém, tudo indica que o ponto de ruptura é de não retorno e que a demissão de primeiro-ministro será mesmo a única saída para Sócrates, a manter-se o actual estado de tensão e de irredutibilidade do PSD em aceitar dar o aval às alterações ao Plano de Estabilidade e Crescimento (PEC) comunicadas a Bruxelas.

PSD não cede

As informações recolhidas pelo PÚBLICO junto da Direcção máxima do PSD são as de que não há qualquer hipótese de o PSD mudar de opinião. Ou seja, não há pressões externas ou internas que levem o PSD a aceitar negociar com o Governo a viabilização destas ou de outras alterações ao PEC. De acordo com o que o PÚBLICO sabe, para o PSD há princípios mínimos de respeito democrático pelos adversários políticos que a Direcção do PSD considera que foram quebrados pelo primeiro-ministro, pelo que não aceitam negociar.

Os níveis de dureza usados pelo PSD em relação à acção do Governo neste domínio das negociações com Bruxelas têm mesmo vindo a crescer. E atingiram um nível inédito na política portuguesa quando a vice-presidente do PSD, Paula Teixeira da Cruz, afirmou que "depois da deslealdade veio a mentira", acusando o Governo de ter assumido em Bruxelas o compromisso de concretizar as alterações ao PEC antes de as comunicar ao país - acusação que o primeiro-ministro e a Comissão Europeia desmentiram. E de querer negociar com o PSD sobre um documento que está fechado.

Além do PSD, também o CDS e o PCP já assumiram, pela boca dos respectivos líderes, Paulo Portas e Jerónimo de Sousa, que vão estar contra o documento que o ministro das Finanças, Teixeira dos Santos, prometeu enviar hoje à Assembleia da República. Um documento em que o Executivo dá conhecimento do conteúdo das alterações ao PEC ao órgão de soberania de que depende.

Resta conhecer a posição do BE, mas esta deverá ser tornada pública nas jornadas parlamentares. Não é contudo previsível que o BE venha a estar ao lado do Governo, quando já já apresentou uma moção de censura ao Governo a 10 de Março.

Sócrates insiste

O PÚBLICO sabe que Sócrates não vai atirar a toalha ao chão nem desistir de conseguir uma saída para a crise política. De acordo com um assessor do primeiro-ministro, o Governo e o PS tudo farão para que, até ao dia do início da Cimeira Europeia, esta quinta-feira, o primeiro-ministro consiga obter apoios internos para as alterações ao PEC.

O momento decisivo desta encruzilhada política vive-se na quarta-feira, dia em que será debatido pelos deputados à Assembleia da República o documento em que o primeiro-ministro sistematiza e explica as alterações ao PEC. É então que o documento poderá vir a ser votado e chumbado pela Oposição.

O CDS reservou um debate potestativo - ou seja, de agendamento obrigatório e de tema à escolha do partido que o marca - para o mesmo dia, e o seu líder, Paulo Portas, já assumiu que apresentará um projecto de resolução para que o assunto seja votado. Ontem, Paula Teixeira da Cruz admitiu que o PSD também venha a apresentar uma resolução. Ora, com o quadro parlamentar existente, o documento do Governo só sobreviverá se um partido votar ao lado do PS e outro se abstiver. O que hoje parece ser impossível.

Demissão sem data

Se o documento for chumbado, o caminho de Sócrates é a demissão. Mas não há ainda previsão do momento em que esse passo será dado. A demissão pode ocorrer logo na quarta-feira. Sócrates pode dirigir-se ao Palácio de Belém e apresentar ao Presidente a sua decisão de abandonar o cargo.

Mas o primeiro-ministro poderá querer, antes de se demitir formalmente, apresentar-se na Cimeira Europeia de 24 e 25 de Março em pleno cumprimento do seu mandato, ainda que sem condições de entrar em acordo com a Comissão e o BCE sobre o PEC português.

Nesse caso, só no regresso a Lisboa apresentará a Cavaco Silva a demissão. Um encontro que poderá até ser já com Sócrates na condição de líder reeleito do PS. Ou seja, este sábado.

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