Ajuda europeia pode ficar em causa com a crise política

Diplomatas receiam que o agravamento da crise política ponha em causa plano de ajuda quase pronta

As modalidades da assistência a Portugal do fundo de estabilidade do euro (EFSF) já estão praticamente acordadas, faltando pouco mais do que o acordo final dos Governos europeus sobre uma resposta global para a crise da dívida soberana e a formalização do pedido de ajuda por parte do Governo.

A activação da ajuda poderá, no entanto, ficar comprometida se o desacordo entre o executivo e a oposição sobre as medidas de austeridade - com que o país pretende cumprir a "estrita condicionalidade" obrigatória para todas as intervenções do EFSF - desembocar numa crise política.

O risco é particularmente agudo num cenário de eventual queda do Governo antes da conclusão das negociações, avisa um alto responsável europeu. Nesse cenário, explica, a assistência do fundo poderá ficar em dúvida, deixando Portugal cada vez mais vulnerável nos mercados com taxas de juro galopantes e sem a rede de segurança europeia. O resultado poderá ser a bancarrota e, em qualquer cenário, um programa de austeridade ainda mais rigoroso, alerta.

Os riscos de uma crise política começam, aliás, a provocar alguma "preocupação" entre os países do euro, sobretudo pelo facto de a Alemanha só estar disposta a aceitar uma "resposta global" para a crise da dívida soberana - durante a cimeira europeia de 24 e 25 de Março - se o acordo final incluir um pacote de ajuda a Portugal, a activar se e quando necessário.

Do lado europeu, aliás, os Dezassete já fizeram o essencial do que era pedido por Portugal para dar o passo, quando aceitaram, na sexta-feira, alargar o campo de acção do EFSF para lhe permitir comprar dívida soberana no mercado primário (na emissão pelos Governos). Desta forma, Portugal poderá continuar a financiar-se no mercado, embora contando com o EFSF enquanto rede de segurança para comprar dívida se as taxas de juro ultrapassarem o valor adequado à situação do país. Ao mesmo tempo, os Dezassete decidiram reduzir as taxas de juro que serão cobradas pelas intervenções do EFSF e aceitaram manter o FMI fora das operações.

Do lado português, o Governo também já fez a sua parte para responder à "estrita condicionalidade" em termos de aceleração da consolidação orçamental que é exigida pelas intervenções do EFSF: o novo programa de austeridade já foi negociado pelo governo com a Comissão Europeia e o BCE expressamente para funcionar como a contrapartida para a activação da ajuda. O facto de as medidas terem sido elogiadas pelos líderes do euro na sexta-feira significa, por seu lado, que já estão aceites enquanto contrapartidas para a ajuda do EFSF.

As modalidades da assistência a Portugal estão em negociação há várias semanas, e foram minuciosamente discutidas no encontro realizado entre o primeiro-ministro, José Sócrates, e a chanceler alemã, Angela Merkel, realizado a 2 de Março em Berlim.

Nessa altura, a grande tarefa de Sócrates foi sobretudo sossegar a chanceler sobre a seriedade das reformas em curso no país: Merkel precisa de poder garantir ao seu Parlamento que o dinheiro dos contribuintes alemães será usado para ajudar um país com um sólido e sério programa de consolidação orçamental. A Holanda, Finlândia e Áustria precisam de obter as mesmas garantias.

O acordo de sexta-feira vai hoje continuar a ser aprofundado pelos ministros das Finanças dos países do euro, que terão de clarificar alguns aspectos e concretizar as decisões tomadas no plano jurídico e técnico. Uma das questões mais difíceis será determinar a forma de aumentar a capacidade efectiva de empréstimo do EFSF dos 250 mil milhões de euros de que dispõe actualmente para os 440 mil milhões de euros que constituem o seu valor nominal.

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