Torne-se perito

Portugal discute redução de deputados, mas podia aumentar de 230 para 248

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Assembleia da República parece não ter deputados em excesso Rui Gaudencio

Estudos divergem quanto ao número óptimo de parlamentares, mas indicam número ideal entre os 214 e os 248. Redução deve implicar mudança na estrutura dos círculos eleitorais

Mais do que a França e Espanha, menos que os países nórdicos. Portugal tem um rácio de deputados por cem mil habitantes muito mais próximo dos países do Norte da Europa do que dos Estados-membros mais chegados geograficamente. Estes últimos acabam por ter menos representantes por cem mil habitantes no seu Parlamento do que o português.

De acordo com dados compilados no ano passado pela britânica House of Commons, a Irlanda e a Suécia são os países, entre os 17 europeus escolhidos para o estudo, onde há mais deputados tendo em conta a população. São 3,89 parlamentares por cada 100 mil habitantes, tendo em conta a população de 2006. Em Portugal, esse rácio é de 2,17 deputados, segundo cálculos do PÚBLICO, já que o estudo original não incluía o nosso país. Valor que nos coloca entre a Áustria (2,21) e a Bélgica (1,42). A comparação considerou apenas a constituição das câmaras baixas mesmo no caso em que existem duas câmaras.

O politólogo André Freire considera que "o rácio português está dentro da média; não temos um excesso de deputados, ao contrário do que muitos querem fazer crer". O que se passa é que "existe uma deriva antipolítica e anti-Parlamento" que leva a que se defenda a redução de deputados por questões financeiras. "Essa não é a melhor via para cortar custos", diz, citando contas do também politólogo Manuel Meirinho, segundo o qual o corte de 50 deputados significa, em salários e ajudas, uma poupança de 20 milhões de euros em quatro anos. "Mais rápido e fácil será cortar no financiamento das campanhas e subvenções partidárias".

Ambos estudaram o assunto há alguns anos e lembram que uma redução de parlamentares tem que ser acompanhada de uma revisão da estrutura dos círculos eleitorais. Meirinho e Freire falam no risco de se perder a representação e representatividade territorial (distorcendo a proporcionalidade), ao passo que se penalizam os partidos e se reduzem as opções viáveis para os eleitores. Como todos os distritos perderiam cadeiras na AR, em alguns os pequenos partidos deixariam de ter vagas e os eleitores viam-se obrigados a exercer o voto útil apenas nos dois grandes.

E a raiz quadrada diz 248

Segundo um estudo realizado em 2008 por dois catedráticos de Economia do Instituto de Economia Industrial da Universidade de Toulouse, França, o número de deputados considerado ideal para Portugal é de 248. Este working paper (estudo ainda não publicado em revista científica, mas já disponível), propõe uma teoria baseada na democracia representativa, usando uma fórmula em que "o número de deputados deve corresponder à raiz quadrada da população total", explicam os autores, Emmanuelle Auriol e Robert J. Gary-Bobo.

São contabilizados todos os parlamentares de um país, mesmo quando existem duas câmaras. como acontece em Itália e Reino Unido. As duas câmaras tomam designações diferentes consoante os países, mas em muitos casos uma é dos deputados e outra dos senadores. O estudo chega à conclusão, por exemplo, que os Estados Unidos têm poucos parlamentares (são 535 nas duas câmaras e deveriam ser 807 para assegurar uma correcta representatividade), enquanto França e Itália têm parlamentos 65 por cento maiores do que deveriam.

Olhando para a lista de 100 países analisados consoante um conjunto de fórmulas matemáticas, percebe-se que o panorama não está muito desequilibrado: 60 por cento têm mais deputados que deviam, 40 por cento têm-nos a menos. Portugal (230 deputados) e os países nórdicos são os Estados europeus ocidentais em que a sua população está sub-representada no Parlamento. Áustria e Bélgica, que no conjunto das duas câmaras contam, respectivamente, com 247 e 221 deputados, poderiam chegar aos 293 e 262. Já a Dinamarca, Finlândia e Noruega que tal como Portugal só dispõem de uma câmara, segundo a sua população poderiam ter, respectivamente, 243, 218 e 219 deputados. Segundo este estudo, os 740 deputados da Alemanha são excessivos (o ideal seriam 662); o mesmo acontece com a Grécia (300/231), Irlanda (226/165), Hungria (386/277). Mas também no Canadá (399/336), Egipto (664/460), México (628/390), e Rússia (628/582).

Manuel Meirinho, convidado pelo PSD para elaborar durante este ano um estudo para implementar o voto preferencial e em paralelo avaliar a possibilidade de redução do número de deputados - idealmente para 180, adiantou na altura Miguel Relvas -, desvaloriza as contas feitas com base apenas na população e prefere as comparações com o tamanho dos outros parlamentos e da população que representam.

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