Sortu, o sucessor de Batasuna, distancia-se da ETA e da violência

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Manifestação contra a ETA em Madrid (arquivo) Andrea Comas/Reuters/arquivo

“Surpreendeu-me, não esperava tanto”, diz, ao PÚBLICO, Florêncio Dominguez, escritor e jornalista basco. Na base desta surpresa, o perito na ETA destaca que os estatutos, ontem sumamente apresentados pelo advogado Iñigo Iruin e que quarta-feira serão entregues no Ministério do Interior, contemplam um passo em frente. Sem retorno aparente. “Admitem a possibilidade de expulsar quem apoie ou justifique o terrorismo”, observa Dominguez.

Na apresentação do novo partido, que se chamará Sortu (nascer ou surgir em euskera), Rufi Etxeberria, antigo dirigente da direcção de Batasuna, já afirmara que “a esquerda abertzale recusa e se opõe ao uso da violência, à ameaça da sua utilização para conseguir objectivos políticos o que inclui a violência da ETA, se a houver em qualquer das suas manifestações”.

Uma declaração importante porque, pela primeira vez no discurso da esquerda abertzale, a palavra violência aparece relacionada com os etarras. Do mesmo modo, os estatutos, segundo Iruin, referem “o reconhecimento e reparação de todas as vítimas das múltiplas violências que existiram no País Basco”.

Braço de ferro continua

É bem verdade que não houve uma condenação da longa trajectória terrorista da organização armada, o que é solicitado por boa parte da sociedade basca e espanhola. Este passo não foi dado. Mas o ontem enunciado por Iñigo Iruin e Etxeberria representa um claro desafio à organização que, em Novembro passado, reiterara o uso da violência. “Partimos do princípio de que a estratégia político-militar é inquestionável”, assegurava o documento que, na prática, se rebelava contra as posiçõesassumidas pela esquerda abertzale. Ou seja, para a direcção etarra, a trégua decretada em Setembro era um mero compasso de espera, apenas um parêntesis e não um ponto de inflexão na sua estratégia.

“Continua o braço de ferro de Batasuna com a ETA”, anota Florêncio Dominguez. “O facto de Batasuna subir a parada é um sintoma de debilidade da ETA o que augura futuras tensões”, sublinha. Na base desta disputa estão visões diferentes da realidade. “A legalização do novo partido é fundamental para Batasuna, enquanto para a ETA uma participação nas instituições democráticas que ponha em causa a luta armada não é assumível”, destaca. Assim sendo, no horizonte existe um cenário de provável fractura.

“A esquerda abertzale está a fazer um esforço para seguir as normas da legalidade democrática”, conclui Dominguez. Um esforço que não vai demover o Governo de enviar para a Fiscalia Geral do Estado os estatutos do novo partido para verificar se têm alguma ilicitude penal. Desta forma, o Executivo pretende evitar qualquer tensão com o Partido Popular (PP), a principal força da oposição liderada por Mariano Rajoy. A decisão caberá à Justiça, embora sejam esperados relatórios dos serviços policiais sobre a actividade dos promotores do novo partido, nomeadamente da sua vinculação com a ETA.

“Nem ETA ou Batasuna, nem nenhuma das suas sucursais podem apresentar-se às eleições municipais e autonómicas de Maio próximo”, reiterou ontem Rajoy no Facebook. Já Patxi López, presidente do Executivo basco com o apoio exclusivo do PP de Euskadi, assinalou que “a esquerda abertzale diz agora coisas que nunca tinha dito”. Numa declaração, López destacou que a mudança de posição dos radicais é “a constatação da vitória dos democratas”.

notícia actualizada às 09h33
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