Torne-se perito

Cavaco lança "magistratura actuante" e avisa jornalistas

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Presidente disse que usará a força que vem do povo NUNO FERREIRA sANTOS

Presidente reeleito fala em "vitória histórica" da "verdade sobre a calúnia". E pede que sejam revelados os nomes dos responsáveis da "campanha suja"

O aviso veio do director de campanha, Luís Palha, ainda só se sabiam as projecções das presidenciais. O próximo Presidente não será "beliscado" pela abstenção. Com isto, a candidatura de Cavaco Silva quis "arrumar" um incómodo chamado abstenção - recorde em eleições presidenciais. No Centro Cultural de Belém, em Lisboa, a festa foi contida. As emoções fortes estavam guardadas para o fim. E foi o próprio Presidente reeleito a reclamar para si esta "vitória histórica" de cinco candidatos contra um, como a vitória da "verdade sobre a calúnia". Ao Governo e a Sócrates, para memória futura, fica a promessa de cooperação "leal", mas também de uma "magistratura actuante".

Primeiro na declaração da vitória, depois a algumas dezenas de apoiantes, Cavaco falou sem falar da "campanha suja" - o caso BPN e a compra da casa de férias. E aí, foi mais longe. Garantiu que "todos sabem" quem está por trás "desta campanha de calúnias, mentiras e insinuações". Empolgado, desafiou os jornalistas a revelar quem eram "os autores" da campanha. Cavaco falava da varanda do primeiro andar do centro de reuniões do CCB, ladeado pela mulher, filhos e netos. Os apoiantes, lá em baixo, no rés-do-chão, aplaudiram com entusiasmo esta parte do discurso.

Para o futuro, fica uma nova magistratura - a "magistratura actuante", que sucede à pretérita "cooperação estratégica" com o Governo de José Sócrates, à "magistratura de influência", habitual nos discursos de qualquer Presidente, e à "magistratura activa", de que falou desde o anúncio da recandidatura, a 26 de Outubro.

"A minha força vem do povo. No quadro das competências constitucionais do Presidente da República irei utilizá-la em benefício de Portugal inteiro. É grande e muito exigente a tarefa que temos pela frente. Irei exercer uma magistratura actuante para que, num momento tão difícil, Portugal encontre um rumo de futuro."

De resto, pouco antes, na declaração de vitória, sem direito a perguntas dos jornalistas, prometeu ser "um referencial de confiança, de estabilidade e de solidariedade, sem abdicar de nenhum dos poderes" que a Constituição lhe confere. E prometeu uma "magistratura activa" e cooperação "leal" com todos os órgãos de soberania, na defesa dos "grandes objectivos estratégicos" do país. Independentemente de um Presidente não ter programa, a "linha de acção" de Cavaco passa pelo combate ao desemprego, à contenção do endividamento externo e o reforço da competitividade das empresas.

Cavaco já o tinha dito na campanha. Agora, reeleito, ficam as "prioridades" para Sócrates anotar. Ontem, "dia de festa", Cavaco não "quis falar nisso". Nas relações com o Governo, entenda-se.

Depois dos agradecimentos da praxe, o discurso de vitória de Cavaco centrou-se na campanha de "calúnias, insinuações e mentira" dos outros cinco candidatos. Elogios, nem um. Pelo contrário, passou ao ataque. "Foi o povo que, democraticamente, os derrotou. Uma vez mais, o povo português não se deixou enganar. A honra venceu a infâmia e a qualidade da democracia ganhou com esta vitória da dignidade", disse. Aos adversários, acusou de terem procurado "denegrir" o seu "carácter e a sua integridade pessoal", sem nenhum respeito pela "dignidade e respeito que devem envolver uma eleição presidencial". E referiu-se aos "vencidos" em tom azedo: "São os políticos e os seus agentes que preferem o caminho da mentira, das calúnias, dos ataques sem sentido ao debate de ideias sobre o futuro de Portugal".

Feito o discurso de vitória, falou aos apoiantes. E aí dramatizou ainda mais, desafiando a comunicação social a revelar os "nomes daqueles que estão por detrás" da tal "campanha de calúnias, mentiras e insinuações". "Era bom para a nossa democracia, para o funcionamento do sistema político, que os seus nomes fossem conhecidos", pediu.

Mandato "mais livre"

À volta das sandes que acabaram rapidamente nas salas do CCB, o caso BPN era comentado entredentes por apoiantes de Cavaco - passada a fronteira das 19 30 horas, quando começaram a chegar, por sms, os resultados das projecções à boca das urnas, com a vitória à primeira. Telmo Correia, do CDS, falava em "novo ciclo político", com a derrota do PS nas urnas. "Uma grande vitória" para Cavaco, afirmou o deputado Paulo Mota Pinto. A alegria dos cavaquistas media-se pelo número de sorrisos.

Membros de um e de outro partido da "coligação" - PSD e CDS - que ajudou a reeleger Cavaco concentram agora a sua expectativa no discurso de posse, em Março. Esse, mais estruturante. O que parecia claro para dirigentes dos dois partidos é que Cavaco Silva ficará "mais livre" para actuar. Sem que isso signifique, a curto prazo, a queda do Governo.

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