O mundo dos nomes dos futebolistas desafia a imaginação

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Sim, Givanildo Vieira de Sousa e Hulk são o mesmo jogador DR

Givanildo Vieira de Sousa. Isso mesmo: Givanildo Vieira de Sousa é, até ver, a grande figura das competições nacionais de futebol na época 2010/2011. Quem?! Givanildo Vieira de Sousa. Pronto, Hulk. Esqueçamos Givanildo, longa vida a Hulk, porque é esse o nome "de guerra" do avançado brasileiro do FC Porto, melhor marcador da Liga Zon/Sagres e referência incontornável da excelente carreira dos "dragões".

As semelhanças físicas entre Givanildo e o actor Eric Bana (que faz de dr. Bruce Banner, o homem que se transforma em Hulk quando o irritam, no filme de 2003) abriram a porta para a alcunha, mas ela assenta que nem uma luva num futebolista que parece de outro mundo em termos de força física e potência de remate. É de tal forma coerente a imagem de um Hulk a correr pelo relvado com a bola nos pés que até temos tendência para esquecer que se trata de uma alcunha.

Mas há muitos outros casos no futebol português que são bem mais ostensivos. E o melhor é quando não se trata de cognomes impostos por outrem, mas antes de primeiros nomes e apelidos que geram trocadilhos, atrapalham a língua ou despertam a tendência natural para a malandrice. Uma pesquisa repartida entre os registos da Federação Portuguesa de Futebol (que nos dão os nomes de baptismo) e o site zerozero.pt (com os nomes "profissionais") é uma viagem a um mundo de gente com assinatura.

Nas duas divisões profissionais (Zon/Sagres e Orangina) e dois principais campeonatos amadores (II e III divisões), já não temos no activo o notável Mrdakovic, o fantástico Mamadou Bobó, o extraordinário Konadu (que, certo dia, um comentador de rádio sugeriu ser melhor tratar por Vaginadu) ou o maior de todos, o imortal Marlon Brandão. Nem alguma vez se colocou a hipótese de o alemão Frank Foda entrar nos lusitanos relatos radiofónicos e televisivos. Mas, caramba, um futebol que tem Bafodé Carvalho (Louletano) ou Fernando Varalonga (Pombal) nunca fará figura de fraco!

Vejam-se outros maravilhosos casos, como os de Cláudio Pitbull (V. Setúbal), Futre Viríssimo (Machico), Lukas Calhau (Riachense) ou Igor Soviético (Vila Meã). Este último não fica sem resposta, a cargo de Ricardo Suíço (Alba), Zé d"Angola (Alpendorada) ou mesmo Tuga (Mafra). Mais difícil é encontrar um piloto que rivalize com Nelson Piquet (Rebordosa), mas, em contrapartida, não há nada como ter um Moisés para abrir caminho rumo à vitória (há, pelo menos cinco no futebol português).

Políticos e generais são "prata da casa": desde o brasileiro Getúlio Vargas (V. Setúbal) ao timorense Xanana (Câmara Lobos), passando por Aníbal, Júlio César (há dois), Nelson, Pizarro, Napoleão, Rómulo, Ulisses. Outras figuras históricas ou míticas incluem Abraão, Sócrates, Artur, Abel ou Salomão. Artistas? Temos Fábio Júnior, Elvis, Ramazotti e Mika.

O reino das alcunhas

Porém, e num fenómeno facilmente aceitável, é ao universo de grandes futebolistas que muitos jogadores actuais vão buscar a sua inspiração. A impressionante quantidade de Fábios que se detecta nesta geração com 20 anos torna incontornável que apareça um Fábio Coentrão, mas também se encontram Ricardo Carvalho, Bosingwa, Nani. Para já, parece ainda ser cedo para ronaldos.

Lá de fora vêm Materazzi, Kanu, Diarra, Xavi. E de outros tempos revivem em campo Caniggia, Chalana, Pelé, Baresi, Eusébio, Gamarra, Platini, Zamorano, Kovacevic, Rincon, Klynsman, Yazalde. Mais uns quantos Jardel. E casos como os de Maniche (em homenagem ao alto e louro avançado dinamarquês do Benfica dos anos 1980) e Nuno Gomes (que se chama Ribeiro, mas adoptou o apelido do goleador Fernando Gomes, ex-estrela do FC Porto e da selecção nacional).

O mais incrível é que, apesar da impressionante diversidade e riqueza dos "nomes de guerra" dos futebolistas, "as verdadeiras alcunhas não vêm nas camisolas", como lembra Pedro Henriques, ex-futebolista (Benfica, Belenenses, Vitória de Setúbal) e actual comentador televisivo na SportTV. "As que já vinham antes do futebol, principalmente se são interessantes para o próprio, são as que aparecem." As outras são para "consumo interno", impostas pelos colegas e tantas vezes referentes a pormenores físicos ou desempenhos em campo - "Pencas", "Pezudo", "Mãos de Manteiga"...

Tal como Pedro Henriques, também o treinador Augusto Inácio, antigo futebolista que passou pelo Sporting, FC Porto e pela selecção, destaca o facto de as alcunhas serem um reflexo do bom ambiente que se vive num grupo de trabalho. "Algumas pegam de estaca. Tudo bem desde que o jogador aceite. Mas também há quem não goste, por timidez ou necessidade de marcar posição. E aí há que respeitar. Mas a maioria aceita e isso é o sinal do espírito de família existente entre pessoas que passam grande parte do seu tempo juntas."

Para Givanildo, "Hulk" soava bem. E ele é mesmo o único super-herói em campo. Vagamente parecido, talvez mesmo só Tarzan - actua no Penalva, na companhia de um tal de Joe Júnior, que tem todo o ar de ser a sua identidade secreta quando se desloca à civilização. Aliás, um olhar cuidadoso à extensa lista de centenas de futebolistas em actividade nas competições nacionais permite detectar alguns factos misteriosos.

Por exemplo: como é que alguém se pode chamar Hauw (Naval)? Bom, aqui a resposta será simples: quando o pai do pequeno Alex estava, em França, a dar o nome da criança para registo terá batido acidentalmente com a rótula num parafuso saído no balcão e soltou um grito abafado. Quando a dor passou já era tarde e o nome ficou mesmo assim. Consta que Ukra (FC Porto), Yontcha (Olhanense), Gege (Trofense), Litcha (Bragança) e Zula (Lusitânia) devem as suas graças a incidentes similares, mas não foi possível confirmar mais estas ficções até à hora de fecho desta edição.

Outros mistérios revelam-se muito mais insondáveis. Que na lista de profissões apareça um Carrasco, isso só confirma um velho lugar-comum do "futebolês", que dá esse nome a quem assume protagonismo na derrota do adversário. O mesmo vale para Polícia, que é um grito habitual em campo para avisar alguém que vai receber a bola com um adversário muito próximo. Mas Tecelão, Vedor, Padeiro, Sapateiro ou Marinheiro?

Nalguns casos, porém o nome mostra-se bastante promissor e parece já indicar um caminho empresarial pós-futebol, uma fase em que convém gerir bem os investimentos feitos com o dinheiro acumulado durante a (curta) carreira desportiva. Moreilândia (Trofense) vai abrir um parque de diversões. Previtali (Naval) fundará uma companhia de seguros de saúde, actividade em que terá de enfrentar a concorrência parcial da mais generalista Fidelis (Marítimo). E, também no Marítimo, há alguém que parece talhado para um risonho futuro na indústria da alimentação para bebés. Papas e frutas Sapina. Soa bem, não?

Para todas as classes

Mas tudo isto acaba por ser o lado brilhante da moeda. Porque, sim, há um lado escuro da Força também no futebol. Está bem que a imaginação delirante de pais, padrinhos, funcionários de registo, colegas de escola e amigos de infância não tenha limites, mas uma das regras da democracia é que a nossa liberdade acaba onde começa a liberdade dos outros. E, neste jogo desigual, quem sai a perder são os locutores de rádio e televisão.


Imagine-se um dérbi entre a equipa do SC Nomes Esquisitos e a sua eterna rival, a Quebra-Línguas FC. De um lado, Siaka Bamba, Kazim Kerim, Igor Sani, Wivisson André, Loukima Tamuniki, Kifuta Makangu, Tchocomar, Renato Merrelho, Sene Sanha, Hénio Sanca e Orriça. Do outro, Panandetiguiri, Stretenovic, Jucélio Jorgino, Ediclei Pantoja, Friday Nqbe, Enosh Osaroejor, Nenenwa Onyekwelu, Muhamadu Trauale, Tsimafei Hrynevich, Moiseis Indegui e Marco Taqbajum. No meio, um repórter a considerar o suicídio...

"Com nomes desses, seria complicado", reage, diplomaticamente João Ricardo Pateiro, que faz relatos na TSF e ainda não se habituou ao facto de, volta e meia, ter de dizer o seu próprio nome em directo. Bom, não o seu, mas o do homónimo Ricardo Pateiro, jogador da União de Leiria. "É estranho, porque o apelido é pouco comum. Não o conheço pessoalmente e, até prova em contrário, nem sequer somos aparentados."

Para mais, este desconforto coincide com a necessidade de relatar "Panandétiguiri" (também jogador da União) sem vacilar. "Tento dizer várias vezes antes do jogo, dividindo por sílabas. E vou treinando até que entra", revela João Ricardo Pateiro. A solução, aliás, parece ser comum entre os radialistas. Pedro Ribeiro, da Rádio Comercial e que relatou jogos internacionais para a SportTV, também usa o mesmo truque. "Se começamos a olhar para o nome inteiro ficamos assustados. Assim é mais fácil."

O agora animador da Comercial lembra-se de alguns futebolistas que sempre lhe fizeram impressão: "Kupressani, porque era nome de supositório"; e outro que não tem camisola para tantas letras, o holandês Jan Vennegoor of Hesselink (actualmente no Rapid de Viena). No caso de João Ricardo Pateiro, complicado mesmo era relatar jogos em que entrava o alemão Franco Foda ("Ainda hoje não sei qual é a pronúncia correcta"), enquanto Pedro Henriques recorda com risos o dia em que encontrou Bafodé Carvalho na ficha de um jogo que ia comentar.

Mas às vezes não há maneira de encontrar uma saída airosa, pelo que resta recorrer ao velho e tradicional "desenrascanço" lusitano. Recorda Pedro Ribeiro: "No Mundial de sub-20, num Portugal-Coreia do Sul, a ficha de jogo chegou muito tarde e os nomes dos sul-coreanos eram, claro, uma confusão. Por isso, escolhi três ou quatro e só esses tocaram na bola durante o jogo..."

Se simplificar vale para os relatadores, também se mostra uma boa solução para os futebolistas. E com tal voluntarismo o fazem que, bastas vezes, ficamos sem perceber nada do que o diminutivo queria dizer. Do mal o menos: neste esforço linguístico reside uma bela ponte entre dois mundos aparentemente inconciliáveis, o do pontapé na bola e o da alta sociedade.

Impossível?! Então façamos o exercício de formar duas equipas, imaginando uma final da Taça das Tias entre a Quinta da Marinha, representando a zona Sul, e o Bairro da Foz, defendendo as cores do Norte. As equipas alinhariam da seguinte maneira: NORTE - Stigas, Kuka, Nana K, Cara, Chipa, Mara, Bé, Juni, Nera, Cuta e Pikua; SUL - Micas, Rica, Lila, Tigas, Kikas, Cuca, Tera, Soca, Perica, Jóni e Venú. Nos dois bancos sentar-se-iam valores confirmados como Maka, Jaka, Digas, Mika, Piri ou Titá. Imperdível.

Virtude e tentações

Justificada ou não, a verdade é que os futebolistas não se livram da fama de serem danados para a brincadeira sempre que têm oportunidade de sair à noite. Talvez seja apenas uma minoria a prejudicar a imagem da classe e é bem verdade que quem vê caras não vê corações, mas é impossível não estremecer quando estamos perante nomes como Rambóia (Vieira), José Moca (Fão), Mokas (Merelinense), Pintas (Amares), David Ginja (Sacavenense), Rodrigo Murcela (Riachense), Diogo Cacho (Vigor e Mocidade), Fábio Adegas (Lusitânia), Manuel Pipa (Ac. Viseu), Tonel (Sporting/Dínamo Zagreb), Emanuel Caneco (Peniche), Mini (Sourense), Mexer (Olhanense) ou Hippy (Avanca).


Se acha que a lista já vai longa, então saiba que há "índios" no Marinhense, no Chaves e no Crato; "maganos" na Oliveirense e no Leça; dois Fadista no Estrela FC; um Pirata no Fiães, um Traquina no Pampilhosa, um Reguila no Trofense, um Gandaio no Cova da Piedade. Visto daqui, parece uma vida de Festas (Leça), muito Gel (Amares), danças e Contradança (Cova da Piedade), sempre na perspectiva de apanhar algum Pendura (Amares) pelo caminho.

Toda esta actividade extracurricular tem o condão de dar a volta à cabeça de alguns promissores talentos, que assim se perdem para o futebol. E, diga-se, não é fácil pensar em trabalhar quando somos Narciso (Vilanovense), Janota (Trofense) ou Belo (Penalva). Muito menos se chegamos aos píncaros da auto-estima de um Elindo (Alcochetense), de um Bele Formoso (G.D. Fabril), de um Pitéu (Pombal) ou de um Adónis (Esp. Lagos).

Depois, claro, admiram-se quando se leva a conversa para o sexo. Mas como evitá-lo se João Coito (Casa Pia), Rodrigo Coito (Caldas) ou Bobó (Sacavenense) estiverem presentes? É que, neste contexto, até nomes como Tanela (Merelinense), Maricato (Gândara), Pirota (Alpendorada) ou Rabiola (Aves) ganham conotações tramadas. Já agora, um aviso à navegação: o Sporting anda por aí a cobiçar um Pila.

Guia para treinadores

Neste espinhoso caminho entre a virtude e a depravação, muitos jovens têm dificuldade em encontrar-se e manter o equilíbrio psicológico. Gonçalo Lelé (Sintrense) é um caso paradigmático, só comparável ao de Lelé (Santiago), mas há fortes suspeitas de que Francisco Esguedelhado (Pescadores Caparica) vai pelo mesmo caminho. Às vezes, é na reflexão, na abordagem filosófica, que se encontra a solução e é isso mesmo que têm tentado João Fins (Sacavenense) e Gonçalo Haja (Ol. Bairro).


Para outros, assumir as suas limitações publicamente é uma forma de se afirmarem perante os outros. Somos todos imperfeitos, caramba. Grosso, Longo, Baixinho, Grande, Curto ou Forte, o ser humano é um manancial de diversidade. O Gordo, o Seco, o Novo, o Batoca, o Baixote, o Farto, o Pote, o Rombão. Mas também o Cabeleira, o Caveira, o Testas. Todos diferentes, todos iguais. O futebol não tem barreiras, disse o presidente da Federação Internacional. Falta traduzir isso para o árabe, a tempo de os homossexuais poderem ir ao Mundial do Qatar, mas ainda temos até 2022.

Não é fácil, como vimos, a vida dos treinadores. Mas é sempre possível evitar alguns problemas no momento de formar o plantel. E não há nada mais reconfortante para quem se senta no banco aos gritos lá para dentro e a fazer sinais frenéticos com as mãos do que ter a certeza de que, mesmo sem ouvir ou perceber o que quer que seja, há quem dê garantias de levar a nau a bom porto.

Primeira certeza: todas as equipas precisam de um Patrão, seja ele João (Leixões) ou Luís (Tocha). E de alguém que seja um Mestre na arte futebolística - o Fátima (Bruno), o Casa Pia (Bráulio) e o Cova da Piedade (Márcio) têm-no. A experiência de um (Carlos) Veterano dá sempre jeito, como é sabido no Cesarense. Ter um Francisco Seguro (Vigor e Mocidade) na defesa vem mesmo a calhar, mas se a coisa falhar, no Crato podem sempre contar com Fábio Socorro. Já o FC Porto é uma equipa à prova de sustos graças a Sereno.

Para evitar a desorganização, o Fafe tem um Coronel e o Alpendorada um Major, enquanto o Anadia aposta no voluntarismo de Chico Trabuka. Mas, mesmo num desporto de equipa, às vezes é o talento individual a fazer a diferença. Que o digam Zé Estrela (Pontassolense) ou Miguel Super (Odemirense). Nenhum treinador os trocaria por quem quer que seja. A não ser que Primo (Fafe), Mário Manteiga (Crato) ou Nuno Graxinha (Angrense) conseguissem convencê-los do contrário.

O melhor mesmo, para evitar tristezas, é colocar em campo jogadores com espírito positivo, alto astral e boa onda. Grandes homens como Vitória, José Vitória, Paulo Alegria, Paixão, Ruben Paixão, Fixe, João Felecíssimo ou Feliz. Juntemos-lhe a consciência global de Armindo Sociedade, a erudição de Paulo Letras e a dedicação de André Amador e obtém-se uma equipa à prova de infelicidade.

Por fim, e não é coisa que conte muito em alta (ou nem tão alta assim) competição, mas no futebol amador ainda há um muito cobiçado troféu à mercê de quem fizer por merecê-lo. Podemos não ter a melhor equipa do campeonato, a nossa defesa mostrar-se tão permeável como a correspondência diplomática dos EUA, o meio-campo ser organizado como a contabilidade do Serviço Nacional de Saúde e o ataque assumir a atitude agressiva de um cão labrador de barriga cheia. Tudo isso pode ser verdade. Mas, com um pouco de juízo e muita paciência, podemos ganhar a Taça Disciplina.

Não é tarefa fácil, mas aqui fica uma bela lista de jogadores que, neste campo do bom comportamento, dão garantias a qualquer dirigente: Marco Airosa, Leal, Davide Justo, Tiago Honrado, Mário Verdades, João Querido, Nuno Veludo, José Justo, Luís Franco, Ricardo Rigor e Amar. Não há-de ser fácil ao árbitro puxar do cartão amarelo para qualquer um destes exemplares jogadores e cidadãos...

O único problema poderá ser o de encontrar na mesma prova um "onze" formado por Salvador, Nelson Santo, André Anjo, Gonçalo Angélico, Marvin Freira, Luís Bispo, Bispo, Nuno Apóstolo, Rui Fradinho, Fábio Aparecido e Marco Jesus. Seria pecado não lhes entregar o troféu.

Entre a I Liga e a III Divisão vai toda a diferença do mundo, a começar pelo enorme fosso entre profissionais bem preparados e amadores apenas voluntariosos. Mas algumas regras são - ou deviam ser - iguais para todas as equipas. Por exemplo: ter um jogador chamado Nabo, como acontece com o Grupo União Sport, parece claramente contraproducente...

E está, espantosamente, longe de ser um caso isolado! Então concebe-se que haja quem entre em campo todos os fins-de-semana com nomes como Bolinhas, Patego, Ró-ró ou Rodinhas? Será possível a atletas como Fifas, Fábio Flor, Chica, Valtinha, Pipóia ou Fabeta arrepiarem-se com o som dos pitons no chão da cabina? Como é que o Lagoa ousa colocar na ficha de jogo um Januca e um Pituca ao lado de um Boiças? Não pode dar bom resultado...

Cada um com o seu Menina

Há bebés por todo o lado, mas o pior nem é isso. O pior é percebermos que quem disse um dia que o futebol não era para meninas não olhou para os plantéis do Capelense e do Micaelense. Cada um tem o seu Menina.


Saúde-se, por isso, o facto de ainda haver quem erga firmemente o estandarte da masculinidade no desporto-rei. Num jogo entre os supracitados futebolistas de nome duvidoso e uma equipa constituída por machos como João Rijo, Fernando Rijo, Emanuel Malho ou Vítor Martelo, quem levaria a melhor? Uma coisa é certa: esta última seria certamente uma equipa de futebol viril, duro, contando com a ajuda de Pedras, Ferro, Gancho, Carolo, Rocha, Cascalho, Bronze e Pedra.

Mas se há nomes que não se usam, outros parecem ter sido feitos à medida. Espera-se de um extremo chamado Ventosa que se cole à linha; um defesa de nome Lapa não falhará na marcação individual; quando um avançado é conhecido por Balizas, já sabemos no que está a pensar. Pelo contrário, será de evitar que Maneta jogue a guarda-redes... Mas, e não há regra sem excepção, também encontramos um avançado chamado Marreco que se farta de marcar golos.

E se o Marco Lança, também é um facto que o Alexandre Senta, o Nuno Guia, o Danilo Poupa, o Daniel Madruga, o Nuno Mata (a jogada, naturalmente) e o Ricardo Viola (as redes, bem entendido). No Torreense há um Camarão que Coça. E ainda ficou o Filipe Guardado para a segunda parte. Temos mesmo um jogador que, quando questionado sobre o que faz em campo, só tem uma resposta: "Marco Canto."

Tudo isto faz sentido. Mais difícil é perceber onde se foram buscar apelidos ou alcunhas como Caicó, Espincho, Parracho, Boteta, Bonheira, Caipiro, Catchana, Romicha, Merendinha, Machuqueira, Cabeças, Conchinhas, Bagorro, Bombico, Gandum, Manzoupo, Bicalho, Begucho ou Bacanhim. Ou, já agora, Vasconselos? Pidocha?

Provavelmente - e neste submundo da fronteira entre o real e o inimaginável só nos resta imaginar que assim seja... - nos mesmos rebuscados arquivos onde se registaram nomes próprios como Edivândio, Ronyellyson, Adaqilton, Leocísio, Didácio, Dárcio, Lovoalo, Rubenilson, Hélvio, Edmero, Dinarte, Eduíno, Adozinho, Élvio e Décio.

Com tais cruzes do baptismo para carregar, não espanta que muitos optem por ser conhecidos no métier por qualquer outro nome, mesmo que para isso tenham de aceitar algum diminutivo. Vem daí a praga de "inhos" e "inhas", "itos", "icos" e "ocas". Em sentido contrário, futebolistas como Luisão, Carlão ou Paulão (só para usar exemplos da I Liga) entram em campo já a intimidar.

Os três reinos

Como já se viu antes, o reino mineral aparece bem representado, mas o futebol é uma coisa viva e não espanta, por isso, que a fauna e a flora surjam ainda com maior exuberância. Do lado das plantas, temos Café, Melão, Cebola, Pêssego, Laranja, Repolho, Chíxaro, Oliveirinha e Marmelo. Destaques especiais ainda para a forma superlativa como o União da Madeira aborda o assunto, com Alexandre Matão e Fábio Ervões, e para o carácter espinhoso do Lusitânia, que faz alinhar quatro Silva e dois Silveira. Mas o Óscar "verde" vai mesmo para o Fafe, em cuja lista de inscrições se encontram três Pereira, dois Nogueira, um Pinheiro, um Carvalho e um Oliveira!


Saindo da floresta, convém descansar um pouco antes de enfrentar o assalto do reino animal. Porque, ó senhores, bicharada é o que não falta por esses campos (de futebol, claro)!

As duas grandes reservas nacionais de biodiversidade ficam em Moreira de Cónegos (seis espécies representadas no Moreirense) e em Ponte de Sor, onde cinco "animais" diferentes convivem no plantel do Eléctrico. Mas há mais para saber, muito mais. A nível doméstico, temos coelhos, pintos e leitões em barda, mas também Galo, Carneiro (2), Cordeiro, Gato, Bezerra e Vacas (2).

Muitos insectos também se movem perto do chão (Grilo, Carochinho, Barata, Carrapato). Outros voam (Abelha, Abelhinha, dois Mosca). Ou saltam (Piojo - algum piolho espanhol que passou a fronteira...). Tudo bicharada pequena, pouco visível, ao contrário de belas aves como Pintassilgo, Falcao, Carriço, Pisco (dois), Rola (dois), Gaio, Picanço, Fragata ou Grou. E, sendo Portugal um país à beira-mar plantado, não podiam faltar as espécies aquáticas, sejam elas mais ou menos dependentes do sal (Lulinha, Besugo, Cachucho, Robalo), habitantes de rios e barragens (Bogas, Pimpão) ou simplesmente genéricos (Peixe, Peixinho).

Esta riqueza biológica só encontra paralelo nas referências geográficas. Olhando apenas para o mapa nacional, encontramos Braga (2), Barcellos, Felgueiras, Laranjeiro, Espinho, Madeira, Coimbra (3), Gouveia, Resende, Viana, Guimarães, Évora, Serpa, Borba, Sabugueiro, Moura, Pontinha, Aveiro. Cidades estrangeiras? Bom, nem sempre a grafia é a mais correcta, mas o que conta é a intenção. Só na I Liga há três Sidnei (Benfica, Rio Ave e Marítimo), um Madrid (Braga) e um Valência (Portimonense). Mas daí para baixo a lista estende-se: há países, como China (3), Israel, Bolívia, e França; bem como regiões e cidades - vejam-se Corunha, Califórnia (2), Bolonha, Bari, Maranhão (3), Paraíba, Ceará.

Clubes de topo

Não há, praticamente, em Portugal equipa de futebol que se mostre imune à praga de nomes esquisitos. Mas em algumas, mais do que sintomas isolados, conseguimos detectar verdadeiras epidemias. No Marítimo, por exemplo, a secretaria poupa imenso em tinta na impressora, porque abundam nomes como Baba, Balu, Kanu, Sami ou Tchô. O Arouca (Babo, Kiko, Néné, Edu) e o Trofense (Gege, Rafa, Dani, Licá) também são poupadinhos nos caracteres, mas, sob esse ponto de vista, o Belenenses (Nené, Riça, Calé, Balú, Pelé) e o Varzim (Pica, Neto, Tito, Luca, Agra, Dedé) não dão hipóteses.


O Vizela consegue juntar, no mesmo plantel, Madjer, Eusébio e Jardel. Mas nenhum deles é avançado... E do mesmo problema padece o Belenenses, com Baggio, Pelé e Romário a jogarem fora da linha da frente. Mas será que os treinadores andam a dormir?!

O Capelense, com Nunoca, Menina, Ruizinho, Vitinha e Julinho, deverá ter problemas em impor a sua autoridade em campo. O Xavelhas dá um exemplo de civismo anti-racista, fazendo alinhar Eduardo Negrinho e Renato Branco no mesmo "onze". Por outro lado, a vida não há-de ser fácil para o treinador do Amares, obrigado a conciliar figuras como Cebola, Gel, Pendura, Bispo e Pintas. Já o Crato é um espectáculo à parte: ele há Vinagre, Manteiga, Conchinhas, Cascavel, Índio, Kolata (Fábio Socorro), Bagorro, Alemão, Farto. A tradição alentejana para os nomes estranhos, aliás, sai reforçada com a colaboração do Atlético de Reguengos de Monsaraz (Rato, Tamuniki, Melgão, Poupa, Freira, Amador, Pintinho, Canelas), do Juventude de Évora (Toy, Viula, Pisco, Maneta, Gaio, Letras, Martelo e Cao) e do Moura (Begucho, Barão, Franco, Sapo, Barata, Verdades, Rodinhas)

Tudo isto dava um filme e até se poderia pedir a João Botelho (Camacha) que o fizesse. Talvez Cícero (Rio Ave) pudesse contar a história em belas sessões públicas, enquanto Cervantes (Aves) trataria de a passar para romance, Dante (Louletano) trataria da poesia e Miguel Ângelo (Avanca) haveria de nela se inspirar para pinturas sublimes.

Mas isto são artistas. A nós, comuns mortais, resta-nos gritar Banjai! (Oliveirense) antes de nos atirarmos à tarefa de compilar todos os nomes do nosso futebol e soltar um sentido desabafo no final da missão: Dasse! (É jogador do Penafiel.)

Notícia corrigida às 13h12
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