O preço da felicidade

Foto

A Espanha também. Depois de Bruxelas, Londres e Paris, também Madrid destacou esta semana três grupos de trabalho para estabelecerem variáveis que sirvam para medir a qualidade de vida e a satisfação dos cidadãos, num misto de critérios objectivos e subjectivos. Ou seja, trata-se de arranjar um indicador económico alternativo ao PIB (produto interno bruto).

A ideia é que o PIB apenas avalia a quantidade. É um sistema de medição de produção económica puro e duro. Associamo-lo aos países desenvolvidos onde se produz e consome muito, mas não é aferidor da qualidade de vida, da saúde, da realização pessoal ou profissional. Não reconhece o desgaste dos recursos naturais. Não contempla as desigualdades. É cego com a cultura. A sustentabilidade. A inclusão social. No limite, com a felicidade.

Avalia apenas o valor de mercado de todos os bens e serviços produzidos por um país. O argumento é que já não é um indicador satisfatório para medir o progresso das economias desenvolvidas, porque o seu crescimento nem sempre se traduz em bem-estar.

O debate não é novo. Surge sempre que se interrogam as noções de desenvolvimento e felicidade e como se conjugam. Mas ganha contornos novos no contexto actual de perturbação económica, de desgaste dos recursos naturais e do aumento das desigualdades.

O pequeno reino do Butão substitui o PIB pelo FIB (felicidade interna bruta), um índice que combina factores como a educação, a saúde, a boa governança, a vitalidade comunitária, o acesso à cultura ou a gestão equilibrada do tempo. E na Europa parece agora concluir-se que os modelos de medição do rendimento económico são insuficientes para descrever a situação real de um país.

Há um ano, a propósito do mesmo assunto, escrevi que não basta mudar os indicadores da realidade, para que a realidade mude. Mas é um começo. A procura de uma nova grelha de leitura parece ser, no mínimo, o assumir de que a presente crise não é apenas económica e financeira. É mais profunda e diversa.

Claro que algumas destas iniciativas podem resultar em meros aproveitamentos políticos, forma de camuflar a incapacidade em gerir um momento difícil adoptando uma nova narrativa, como têm acusado os críticos de David Cameron em Inglaterra. Mas o mais provável é ser apenas mais um sinal de impotência perante a crise - quando não se sabe para onde ir, vai-se para qualquer lado.

Independentemente do que for, há o mérito de nos pôr a pensar sobre as nossas prioridades e sobre o que é isso de ser feliz. Será difícil existir um consenso internacional na elaboração de um indicador que substitua o PIB, mas será positivo se algumas das conclusões tiradas tiverem peso nas políticas públicas.

A verdade é que alcançamos progresso tecnológico, científico e material, aumentámos produtividade e consumo, mas isso não nos levou a ganhos claros de bem-estar subjectivo. Talvez seja hora de voltar a pensar até que ponto as nossas opções nos têm conduzido à criação de condições para uma existência mais digna e plena. Regressar à pergunta de sempre: o que significa ser feliz?

Jornalista

Sugerir correcção