O novo modelo de financiamento passa por regressar ao "seguro-doença" de Bismarck

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Portugal utiliza o mesmo modelo dos países nórdicos Fernando Veludo / nFACTOS

Estudo sugere que Portugal adopte um modelo mais parecido com o alemão, onde o Estado não é necessariamente o prestador

A Europa continua dividida em dois grandes blocos no que diz respeito ao financiamento dos sistemas de saúde. Pensar num modelo mais centrado na procura de cuidados de saúde do que na oferta implica que Portugal passe da actual influência da matriz do Serviço Nacional de Saúde inglês de Beveridge, que nasceu em meados do século XX, para os seguros da Alemanha de Bismarck, do final do século XIX.

O novo modelo de financiamento sugerido no estudo elaborado pelo Instituto Superior de Economia e Gestão para a Health Cluster Portugal assemelha-se a uma espécie de "seguro-doença", que teve a sua origem em 1883 na Alemanha, com as mútuas. Foi Otto Bismarck, príncipe da Prússia, quem inaugurou o chamado Estado providência, tendo promulgado os primeiros seguros sociais obrigatórios que cobriam a doença, os acidentes de trabalho, a invalidez e a velhice. Este sistema é o que ainda influencia os sistemas de saúde do centro da Europa, dos quais se destaca Alemanha, Áustria, Holanda e Bélgica.

Para Augusto Mateus, coordenador do estudo do ISEG, uma inspiração neste modelo permitiria introduzir "mais equidade e eficiência", "pois desenha-se o sistema para uma pessoa concreta" e não para a "universalidade indiscriminada".

Da mesma forma, o ónus da prestação de cuidados deixava de ser exclusivamente público e o cidadão passaria a poder mover-se entre serviços públicos e privados de acordo com as necessidades de cada momento.

O modelo de financiamento com origem em Bismarck pauta-se por uma separação entre os financiadores e os prestadores de cuidados de saúde e há uma relação directa entre o mundo do trabalho e as verbas disponíveis para a área da saúde.

Na Alemanha, por exemplo, os trabalhadores descontam directamente para um seguro que é diferente entre cada profissão e há liberalização do mercado para as entidades prestadoras, a quem os cidadãos também podem ter que fazer um co-pagamento no momento da utilização dos serviços. Como os riscos também variam de acordo com o tipo de trabalho desenvolvido, é o Estado que faz depois uma redistribuição através das verbas dos impostos, para que profissões que necessitam de mais cuidados não tenham obrigatoriamente que descontar mais dos seus vencimentos. O Estado é também responsável pelas populações mais carenciadas, como as pessoas que não têm emprego.

Por outro lado, os cidadãos podem optar por ficar no sistema público ou por descontarem apenas para seguros privados, deixando nesse caso de pagar o sistema público e de ter acesso a ele. Como os prémios de seguro são mais baixos para os jovens no privado, esta camada da população é a mais procurada.

Portugal segue Beveridge

Já o modelo que nasceu com o economista e reformista inglês William Beveridge, em plena Segunda Guerra Mundial, passa maioritariamente pelo financiamento através dos impostos, sendo pela via do Orçamento do Estado que se estabelecem as verbas que serão alocadas ao sector da saúde. Este tipo de financiamento é de gestão e prestação pública, tendo tendencialmente um uso universal e equitativo e é actualmente utilizado nos países nórdicos e do Sul da Europa, destacando-se o Reino Unido, Irlanda, Finlândia, Espanha e Portugal. É apontado como o primeiro passo para a assistência sanitária moderna que conhecemos hoje.

Mateus defende que este modelo tem o "inconveniente" de não permitir definir directamente que determinada contribuição vai mesmo para o sistema de saúde, o que deixa este sector mais ao sabor das políticas definidas por cada governo e em cada momento.

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