O nosso problema é o software

A saída de Filipe La Féria do Teatro Municipal Rivoli e a entrada de José Luís Ferreira no São Luiz - Teatro Municipal são exemplos de duas diferentes formas de entender o que é uma política cultural ou a assumida repulsa por ela. Todas as cidades devem ter direito a um Politeama. Uma câmara como a do Porto não deve é abdicar, como boçalmente abdicou, de ter uma política cultural e ficar de consciência tranquila por ter transformado o Rivoli nesse temporário Politeama. Valha-nos Mário Dorminsky. Ironicamente, a Câmara do Porto vai precisar do vereador da Cultura da Câmara de Gaia para lhe programar o esvaziado Rivoli com Herman José e sabe-se lá mais o quê, o que não deixa de ser eloquente a vários níveis! A seguir, teremos o Fantasporto, graças ao vereador da outra margem.

Que mais poderá acontecer ao Rivoli? O que interessa - é assim que pensa a presidência do município, como pensa qualquer comandante dos bombeiros satisfeito com o aluguer do salão de baile - é que a sala esteja ocupada. De preferência com espectáculos de "gosto médio", como em tempos disse um vereador da Cultura, quando esta tinha um lampejo de dignidade política para lhe chamarem pelouro. E, depois, "logo se vê"!

Há, de facto, um oceano de diferenças entre o Porto e Lisboa. José Luís Ferreira vai deixar a direcção de relações internacionais do Teatro de S. João, no Porto, para assumir a direcção artística do São Luiz, em Lisboa. Foi escolhido por concurso público! Mas também há uma ligeira diferença entre uma empresa Porto Lazer - o nome diz tudo - e a Empresa de Gestão de Equipamentos e Animação Cultural (EGEAC) da Câmara de Lisboa. O que as separa não é mera semântica. A diferença está em compreender, ou não o conseguir de todo, que as políticas culturais têm a mesma importância que qualquer outra política pública. É justamente isso que a capital tem feito com o São Luiz, o Maria Matos ou o Teatro Taborda.

Há uma década, o problema do Grande Porto era uma questão de hardware cultural. Hoje, é precisamente o contrário: não há software para os espaços de que a cidade dispõe. E o pouco que existe vai embora, claro está, ou a sua gestão fica seriamente comprometida com a perda de autonomia, como acontecerá com o S. João. Todas as cidades devem ter direito a algo mais do que um Politeama. Sobretudo o Porto.

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