EUA tinham planos para invadir os Açores em 1975

Era a resposta americana a um "golpe" comunista durante o Verão Quente. Washington não queria perder a Base das Lajes, na ilha Terceira

Já se sabia que os Estados Unidos tinham planos de emergência, ou contingência, para o caso de Portugal "cair" nas mãos dos comunistas durante a Revolução de 1974 e 1975. O que não se sabia é que esses planos passavam pela ocupação dos Açores. Não sabia, mas ficou a saber-se. No início de 1975, o Pentágono tinha um plano para invadir as ilhas onde, desde a década de 40, usava a Base das Lajes, na Terceira.

A existência dos planos é revelada num memorando de conversação entre o secretário de Estado, Henry Kissinger, e o secretário da Defesa, James Schlesinger, em Janeiro de 1975. Esse documento deixou de ter o carimbo de "secreto", foi publicado pelo National Security Archive e resulta de uma investigação do historiador William Burr, autor de livros sobre a história nuclear dos Estados Unidos e a Guerra Fria.

A 22 de Janeiro, num pequeno-almoço na Casa Branca entre Kissinger e Schlesinger, Portugal era o primeiro tema de conversa, escassos dez meses passados sobre a Revolução dos Cravos e numa altura em que Kissinger receava a vitória dos comunistas em Portugal. O secretário de Estado comentou que era necessário ter "um programa" para Portugal porque "há 50 por cento de hipóteses de se perder". Para os comunistas, entenda-se.

É então que James Schlesinger afirma que os Estados Unidos "têm um plano de contingência para ocupar os Açores". Apesar de isso "estimular a independência dos Açores", concede. E nessa altura a posição formal de Washington era de "neutralidade" quanto aos independentistas dos Açores.

A transcrição, breve, da conversa é feita por William Burr na página do National Security Archive, instituto associado à George Washington University, em Washington, e que se dedica à desclassificação e divulgação de documentos de história recente dos Estados Unidos. Segundo Burr, os planos de contingência não são conhecidos e estarão arquivados no Pentágono. Parte foi divulgada pela primeira vez em 2008 no livro de Bernardino Gomes e Tiago Moreira de Sá, Carlucci vs Kissinger. Uma versão anterior do documento agora divulgado tinha "apagada" precisamente a parte da conversa sobre Portugal.

No final do seu artigo, o historiador William Burr concluiu que os receios de Kissinger - que comparou Mário Soares, fundador e líder histórico do PS, a Kerensky - provaram, assim, ser exagerados. O próprio Kissinger admitiu a Soares, em 1976, que ficou surpreendido com ele e que se enganara. "Geralmente não faço esses erros de julgamento."

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